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Quando Miguel abriu a porta encontrou uma Mia de cabelos ainda molhados, vestida com uma calça jeans escura, uma camiseta branca e o mesmo blazer creme de antes. Sua maquiagem era leve e dessa vez ela havia dispensado o batom.

"Você foi mais esperta que eu, esqueci de trazer uma muda de roupa." Ele disse, enfiando o celular na bolsa da calça.


"Eu faço muita viagem bate e volta na Europa. A gente nunca sabe quando vai encontrar um amigo."

"Tá bem mais relaxada agora, né, Colucci. Até atiçando o meu ciúmes você tá."

Ela balançou a cabeça, um pequeno sorriso em seus lábios. "Anda, Caipira, eu to pra desmaiar de fome."

O restaurante do hotel ficava no terraço, no vigésimo andar. A vista com as luzes da cidade em torno e a orla da praia era de fato encantadora. Os dois foram levados pelo maitre para uma mesa externa, num canto mais reservado do terraço. Os fios de luzes douradas penduradas davam um ar romântico ao ambiente e na mesa havia um pequeno arranjo com mini-cravos cor de rosas e uma única vela.

"Bem vindos ao La Sirène, meu nome é Ramón e serei seu garçom essa noite." Ramón serviu vinho branco em suas taças, era uma cortesia do hotel, e os entregou os elegantes cardápios.

"A gente tá chique essa noite." Miguel disse, com um pequeno riso. "Quando estávamos em turnê era sempre sanduíche ou pizza... No máximo um sushi."

Mia riu dessa lembrança. Eles haviam sido pouco mais do que adolescentes.

"Parece que foi outra vida e não essa daqui. Acredita que encontrei uma fã, outro dia?"

"Ah é?" Ela assentiu, apoiando o queixo em sua mão, o fitando.

"Ela é do fã clube da Mia Colucci."

"E como que eu não sei desse fã clube? Eu devia ser o presidente—ou pelo menos o tesoureiro!"

Mia conhecia muito bem esse Miguel galanteador. Ela gostava dele—aliás ela sempre gostou de ser mimada e coberta de carinhos. Miguel ou não, ela sentia falta de ser vista como uma mulher atraente e interessante, algo além da empresária workaholic que não tinha tempo nem para a própria família.

"Devia mesmo, ainda mais sendo um fã clube sediado em Monterrey!" Ela revelou, com um brilho cheio de humor no olhar.

"É... Contra fatos não há argumentos." Ele tomou um gole de seu vinho, sentindo-se nervoso de repente.

Os dois estavam sozinhos—longe do trabalho, longe da capital, longe do olhar de águia da secretária Rita. Ele a queria tanto, aliás com cada fibra de seu corpo. Desde que soubera de seu retorno Miguel não conseguia tirar Mia da cabeça. Dormia e acordava pensando nela, desejando tocá-la, beijá-la, fazê-la sua novamente... Mas tinha medo de atravessar aquela barreira e morrer na praia, rejeitado por seu grande amor.

Era o que ele merecia, sinceramente. Miguel tomou a decisão de se separarem, de cada um ir para seu lado após o fim da banda. Ele foi para os Estados Unidos e Mia embarcou para a Itália... E só voltou de fato agora. Mas por quanto tempo?

Ela havia deixado claro naquela mensagem essa manhã. Sua prioridade era voltar para casa. Se Miguel fosse esperto e sábio de verdade, se afastaria, deixando de lado o flerte e as brincadeirinhas que eles faziam um com o outro. Isso era o sensato a se fazer.

"Você sente saudade?" Ela perguntou, não deixando claro propositalmente.

"Da banda?"

Ela deu de ombros, girando sua taça de vinho sobre a mesa.

"Às vezes sinto saudade sim, saudade das emoções que vivíamos, da nossa juventude..." Ele riu, balançando a cabeça. "Olha o velho falando."

"Eu também. Eu amava música... Amava compor. Era a forma que eu tinha de externar aquela confusão de sentimentos e ideias adolescentes. Eu era romântica até demais... Mas você sabe disso."

"Até demais por quê?"

Mia respirou fundo, seus olhos azuis o encarando com seriedade. "Porque acaba. O amor acaba, a gente cresce e vê que a vida não é nenhum conto de fadas. Eu sonhava com um príncipe azul que não existia—cheguei a pensar que podia ser você."

"Eu me arrependo tanto..." Ele disse. Era a vez dele respirar fundo. "Eu não me sentia pronto pra casar—nós éramos muito jovens, muito sonhadores. Ainda tinha uma grande parte de mim que acreditava não te merecer e não estar à sua altura."

"E eu sempre te disse que não me importava, que você era o amor da minha vida." Mia sentia uma raiva brotando em seu peito, uma raiva por Miguel ter desistido deles.

"E você era o meu amor, Mia—e eu caguei tudo."

Mia mordeu a bochecha, tentando conter as lágrimas que marejavam seus olhos. Ela respirou fundo, a respiração um pouco trêmula, e finalmente se sentiu segura para dizer aquilo que ela vinha carregando dentro de si há tantos anos:

"Sabe Miguel, nós claramente somos pessoas muito diferentes. Temos maneiras diferentes de encararmos os sentimentos e o amor. Quando eu te amava, eu era sua de corpo e alma—eu seria capaz de dar minha vida por você. Eu seria capaz de subir a um altar e fazer as juras com toda a sinceridade: na alegria e na tristeza, na riqueza e na pobreza, na saúde e na doença... Antes mesmo de nos casarmos eu já cumpria com aqueles votos. Você não. Sempre havia um problema, sempre essa insegurança maluca, irracional dentro de você..."

Miguel recebeu cada palavra dela como uma facada no peito. Mia não havia falado nada além da verdade.

"Eu sei, eu sei." Ele disse baixinho, não conseguindo encará-la.

Ele não era mais aquele Miguel de vinte e poucos anos. Ele era um homem de negócios, referência em sua área. Miguel ganhava muito bem obrigada e desde os tempos da banda soube investir muito bem seu dinheiro... Miguel era rico. Mas aquela riqueza não o trouxe a felicidade e a estabilidade que ele pensou que ela pudesse. Sua filha não era sua, seu grande amor não o queria mais.

"Você me machucou muito e muitas vezes. Com você eu aprendi que o amor de verdade dói. Hoje, eu tô vacinada, Miguel, não tô mais disposta a sofrer. Eu não sou mais aquela garota com estrelinha na testa."

"E eu não sou mais aquele Miguel." Ele disse, finalmente erguendo a cabeça e a olhando com os olhos vermelhos, cheios de lágrimas.

Ela terminou o vinho branco que estava em sua taça, sentindo todas as notas de sabor em sua boca, desejando que o vinho tirasse o amargor daquelas lembranças, das palavras que acabaram de ser ditas. Palavras guardadas a sete chaves há quinze longos anos.

"Acho que eu perdi a fome... Se importa se eu for pro meu quarto?"

"Claro que não, Mia. Nossa história afinal terminou."

Havia mágoa no tom e no olhar dele, ela conseguia ler direitinho. Mas assim como ela foi capaz de superar, ele também seria.

Miguel ficou ali sentado um bom tempo, assistindo ela ir embora, desaparecer hotel adentro. Ele também perdera toda a fome.

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Que conversa foi essa, senhores?! Achei que Mia foi super sensata! Miguel fica todo de flerte e gracinha com ela, sendo que lá atrás ele que terminou a relação dos dois. Tinha mais é que colocá-lo em seu lugar mesmo. Mia Colucci já não é mais a garota com estrelinha na testa! Fica a dica.

O que vocês acham que vai acontecer a seguir? Quero muito saber!

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