A chuva despenca sobre o meu carro estacionado perto do set de gravações, formando cascatas volumosas pelas janelas. O som das gotas caindo me traz certo conforto, porém o sentimento é momentâneo. Não há como me sentir confortável com o bilhete que se encontra em minhas mãos.
"Eu estou sempre observando. Sempre observando."
Amasso o papel, mas as palavras continuam presas em mim. Lanço a bolinha mal feita dentro do porta-luvas, observo enquanto ela se molda às outras bolas de papel amassado, quase formando um castelo de ameaças.
Me concentro em inspirar o ar pelo nariz e expirar pela boca, até sentir que meu coração está voltando ao ritmo normal. O relógio denuncia que estou atrasada, mas não sinto pressa para entrar em cena. Atuar já foi uma das minhas atividades favoritas, hoje é apenas mais um fardo que eu preciso carregar.
Estico meu braço para pegar o guarda-chuva no banco de trás. Embora não queira, tenho que comparecer.
Preciso de poucos instantes fora do carro para perceber que o guarda-chuva não será suficiente. Xingo baixinho, pensando na bronca que irei levar ao aparecer atrasada e ensopada. Gostaria que a chuva tivesse começado mais cedo, assim poderia ter derretido o bilhete enquanto ele ainda estava preso em meu para-brisa, esperando que eu saísse de casa e o encontrasse para tirar meu sossego.
Corro pela rua, o que revela o tamanho do meu atraso: poucas coisas na vida me fazem ter o impulso de exercitar meu corpo. Por sorte, o local não está tão longe de mim, e logo vejo uma parte da equipe encarar uma Freen descabelada, vermelha e encharcada.
— Olá, Cinderela — Saint me cumprimenta. Ele não parece bravo, está sorrindo dentro de sua capa de chuva amarela.
— Desculpe o atraso — eu murmuro, unindo minhas mãos à frente do rosto para cumprimentá-lo. — Não vai mais se repetir.
Ele abana as mãos.
— Não se preocupe com isso. Quase todos se atrasaram hoje.
— As chuvas estão mesmo fortes — eu digo, ofegando. Meu coração ainda está acelerado com minha corrida de 10 metros.
— Estão. Por isso hoje vamos priorizar as cenas internas do episódio 2.
— Certo — eu concordo. — Preciso me secar. Não estou nada parecida com Khun Sam.
Saint dá uma risadinha. Ele me guia pelo local, me levando a um ambiente coberto.
— Não se preocupe com isso. Os figurinistas e maquiadores farão um bom trabalho.
— Tenho certeza que sim — eu concordo. Aproveito para fechar o guarda-chuva, que se encontra menos molhado do que eu.
Apenas por estar no ambiente da gravação, já começo a sentir a energia de Sam querendo aparecer. É incrível a maneira como consigo me conectar facilmente com minha personagem.
— Ah, Freen? — Saint me chama, antes que eu adentre o apêndice onde se encontram os camarins. — Queria te pedir uma coisa.
Levanto meus olhos para ele. Está sério.
— Claro.
O produtor acena com a cabeça.
— Seja mais gentil com Becky. Não sei o que aconteceu entre vocês, mas isso fez com que quase a perdêssemos ontem. Não foi fácil convencer para que ficasse.
Becky. Eu estremeço. Rebecca Armstrong era um assunto do qual eu não queria tratar.
— Ela não desistiu, então.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Paralelo
FanfictionFreen Sarocha e Rebecca Armstrong tiveram suas vidas ligadas ao atuarem juntas em uma série tailandesa. Agora, um ano depois, estão prontas para encarar o desafio de contracenar em GAP the Series, onde serão protagonistas. Becky sabe bem da responsa...