18 - Freen

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De um dia de chuva - em algum lugar no passado:

Freen não conseguia esconder o sorriso no rosto enquanto pulava nas poças que se formavam pela calçada irregular. Ao contrário do clima cinzento, ela se sentia quente e feliz. Estava radiante, não precisava do sol para iluminá-la quando ela própria emanava luz. 

Nas mãos, carregava um guarda-chuva colorido que combinava com suas galochas. Ela gostava de dias chuvosos, se divertia com a correria dos pedestres para se abrigar em árvores ou tapar suas cabeças com jornais  fugir da chuva lembrava a infância. 

Mas o motivo que a deixava tão feliz era outro: Becky Armstrong. Elas haviam marcado de se encontrar para pintar em um ateliê de uma galeria que Freen amava. A mais velha tinha acordado com receio de que o encontro fosse cancelado por causa da chuva, mas não seria esse detalhe climático que impediria as duas de passarem um tempo juntas.

Elas precisavam disso. 

Freen atravessou a última avenida antes de entrar no endereço combinado. Já sabia exatamente o que pintaria para Becky.

Primeiro, iria desenhar um lírio. Uma vez a garota lhe contou que esse deveria ter sido seu nome no lugar de Rebecca, então queria mostrar a ela que se lembrava desse detalhe. Aliás, se lembrava de todos os detalhes que a outra já havia mencionado, porque gostava de sentir que a conhecia cada vez mais.

Depois, pintaria um céu estrelado. Esse segundo quadro fazia parte de um plano que Freen vinha elaborando desde que recebeu o convite da mais nova. Queria entregar a ela o livro "Uma casa no céu", um presente que passava de geração em geração entre as mulheres de sua família.

Sua mãe havia lhe dito para entregá-lo a alguém que ela considerasse especial, e Becky era a pessoa que melhor preenchia esse posto em sua vida. Não conseguia nomear a relação entre as duas, mas isso não importava. Ela se sentia completa ao lado da outra, e isso era o suficiente para saber com quem gostaria que o livro ficasse.

Fechou o guarda-chuva e o depositou no recipiente na entrada do lugar. Esfregou as galochas no tapete e adentrou a galeria, sentindo seu estômago se revirar em um nervosismo bom. 

O ambiente estava repleto de quadros pendurados nas paredes ou encaixados em cavaletes no chão. Alguns completos, outros escondidos por panos brancos que aguçavam a curiosidade da amante de arte. Cores se emaranhavam pelo chão em poças secas de tinta, adicionando um detalhe aconchegante ao ambiente.

Lindo, né? uma voz disse atrás de si. 

Freen sorriu instantaneamente. Não precisava virar para saber que Becky havia chegado, mesmo assim o fez. Aproveitava todas as oportunidades que tinha para olhar seu rosto.

Becky! ela exclamou. Você está ensopada!

A mais nova ria e pingava pela galeria. Seus cabelos encharcados faziam uma trilha de água por onde ela passava; a roupa não estava diferente. Freen retirou seu casaco para cobri-la, não queria que o encontro feliz se transformasse em doença depois, e sabia que não podia contar com o sistema imunológico de nenhuma das duas. 

Arrancou o pano que cobria uma das obras e o transformou em toalha para secar os cabelos da garota.

Eu tô bem! a mais nova exclamava entre risos. Não me importo de estar molhada.

Mas eu me importo Freen ressaltou. Tentava procurar a graça, mas sua cara estava fechada em preocupação. Você vai ficar doente por minha culpa. 

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