Feridas externas

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N.A: 

Acho que é previsível que esse capítulo seja uma bomba cheia de gatilho, mas não custa avisar.

— Esse é o terceiro mistério, o Nascimento de Jesus. Pai Nosso que estais no Céu...

Por que, Senhor?

Não consigo compreender o que aconteceu. Olho para ela, mas... Minha cabeça parece que não conseguiu digerir tudo. Acho que ninguém, na verdade. Foi tudo muito rápido.

Estava em casa, dormindo. Sua mãe me ligou falando que precisava de ajuda. Tinha ligado para a ambulância antes de telefonar para casa. Falou que tinha que encontrá-la aqui. Ela não tinha mais forças quando me encontrou. Acabou desabando nos meus braços.

"Ela tentou se matar."

Não tive reação alguma. Acho que foi a maneira que minha cabeça encontrou de não aceitar o que realmente aconteceu. Seu choro era desenfreado olhando para mim.

"Minha filha não pode morrer."

— Perdoai as nossas ofensas...

Segurei seus ombros e disse que tudo ia ficar bem, mesmo eu não tendo certeza que isso vá acontecer de fato.

Ela tinha chego em casa mais cedo. Como de costume, entrou, guardou as coisas e procurou por Hǎi yún no seu quarto. A porta estava trancada. Sua intuição já apontava para o pior.

Conseguiu arrombar a tranca mesmo sendo tão franzina quanto a filha. Usou um dos objetos pesados de decoração da casa pra quebrar o trinco. O desespero nos leva a fazer coisas que não sabemos que podemos. Quando entrou no quarto, o cheiro a fez querer vomitar.

Era o cheiro carregado de sangue. Encontrou-a no chão do banheiro, já desacordada. Foi o tempo de tentar conter as feridas e ligar.

Agora, ela foi para a casa. Precisava tomar banho e comer alguma coisa. Já são nove da manhã, e eu tinha que estar no trabalho.

Mas, quem se importa quando alguém que ama precisa de você agora?

Seus braços estão completamente enfaixados. O médico disse que ela vai precisar de mais um tempo para se recuperar. Acabou tendo que tomar sangue. Perdeu muito. Seu rosto está sem cor, seus lábios arroxeados, rachados, as pálpebras na mesma cor.

Só sei que ela está viva porque está aqui, respirando, mesmo que brevemente.

— Ave Maria cheia de Graça...

E minha mãe está do lado, rezando um terço. Até faria o mesmo, mas não consigo me concentrar nem em rezar um Pai Nosso.

Eu só me questiono como chegou a isso. Pensei que estava tudo bem, que ela tivesse melhorado. Ela parecia tão bem quando nos despedimos.

Hǎi yún, você estava se despedindo de mim para sempre? Por isso foi em casa me dizer aquelas coisas?

Meu amor não foi o suficiente para te salvar desses pensamentos horríveis?

Não tem futuro pra você, então? Para nós duas?

O que te faz ter tanto ódio de si mesmo?

Meus lábios tremem.

Isso tudo ia ter um fim? Você nunca pensou em como me sentiria em te ver partir? Sabia que era a última vez e ainda assim...

— Você tá bem, filha?

Minha mãe segura meu ombro, tentando me chamar para ela. Pisco algumas vezes tentando afastar esse sentimento perverso que se apodera de mim.

— Não quer ir pra casa?

Retas paralelas se encontram no infinito?Onde histórias criam vida. Descubra agora