chapter twenty three

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Meus olhos abriram com dificuldade. Eu estava deitado em algo macio, mas não tão confortável como a minha cama foi durante tantos anos. Minha cabeça ainda dói um pouco e o meu ombro já não arde tanto.

A primeira coisa que visualizo é o teto cinza como continuidade das paredes com as mesmas cores. Eu não reconheço onde estou e por isso, giro meu corpo devagar para o lado, para tentar ver ao meu redor.

Meu corpo está dolorido e me movimento com calma, soltando um gemido, assim que minha cabeça desenconsta de uma almofada, pois sinto uma dor onde há um calombo, o famoso galo na cabeça, que apareceu onde eu bati.

Quando consigo olhar para o lado, vejo Mike sentado em uma cadeira de madeira rustica bem ao lado do colchão onde estou deitado. Ele ainda está com a roupa de palhaço, mas já está sem a máscara e sem as luvas. Ele está com a cabeça baixa, cotovelos apoiados nos joelhos e as mãos tampando o rosto. Suas costas estão curvadas para frente e ele parece não ter percebido que eu acordei.

Ao invés de logo falar algo, eu me pego olhando para ele e pensando como ele costumava ser o meu mundo. Ele costumava ser tudo o que me mantinha vivo, o meu primeiro e último pensamento do dia, uma energia vital que me alimentava para que eu fosse capaz de viver. O olhando assim, ele ainda continua parecendo ser o mesmo Mike de sempre, mas dentro de mim, ele não é mais. O meu Mike agora divide o espaço da minha mente com a de um assassino que já matou 28 pessoas, de uma forma brutal, e inclusive uma delas bem a minha frente, sem titubear, sem se colocar em dúvida a qualquer momento.

- Onde eu estou? - Eu pergunto e a minha voz sai mais grave do que eu queria, parecendo quase um gemido rouco

- Willie! - Mike tira a mão do rosto rapidamente e me olha, se levantando e vindo rápido até mim - Como está se sentindo?

- Morto - Eu respondo gemendo - Amélia? Está morta?

- Ela está salva - Mike me olha sorrindo como se não compreendesse o que acabou de fazer, insistindo na ideia de que ele a salvou.

Olhando para ele, eu me lembro que quando pesquisei sobre a águia de sangue, eu li que este era um ritual para punir quem afrontasse aos deuses, mas era também uma forma da pessoa entrar em Valhalla, ou seja, o paraíso.

Ao que percebo, Mike acredita que depois de matar a pessoa, no fundo ele está salvando a pessoa, dando alguma forma de indulgência por ter pecado contra os deuses, e meu estômago embrulha de pensar que o Deus dele, sou eu.

O quão doentio o nosso amor se tornou e o quanto doentio ele ainda pode se tornar mais?

Mike senta no colchão ao meu lado e tenta me tocar.

- Não me toca! - Eu falo alto e firme e encolho o meu corpo no colchão para repelir o seu toque

- Will... - Mike fala baixo e com a voz sofrida, mas recolhendo a mão como se a tivesse queimado pela minha rejeição - Por favor, se lembra que você me deu a sua palavra que ia me entender qualquer que fosse a situação?

-Eu esperava um chifre, Mike, não algumas dezenas de assassinatos - eu respondo sarcástico.

Ele me olha, e seu semblante é triste.

Ficamos um tempo calados, apenas olhando um para o outro. Eu me sento na cama, e trago as minhas pernas para o meu peito e as abraço. Eu reparo que no meu ombro há um curativo onde a faca me cortou, e aparentemente, deve ter sido apenas um corte de raspão, uma vez que apesar do sangue que já mancha a gaze, eu consigo movimentar os meus braços e ombros normalmente.

Enquanto eu estava apagado, Mike deve ter feito o curativo em mim.

Ironicamente, minha cabeça dói mais do que meu ombro, e eu devo ter desmaiado em função da batida contra a minha cabeça, que ainda lateja um pouco, e não do golpe mais mortal do T.

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