Correntes Pesadas

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Depois do jantar ele pensou que descansaria, mas Salazar se adiantou para conduzi-lo por um floresta densa e escura. Os galhos tornavam o caminho quase intranspassável e conforme eles eram cortados cresciam novamente com uma ferocidade inigualável.

Se alguém fosse atingido por eles naquela velocidade, seria impossível sobreviver.

A lua brilhava no alto do céu, mas o seu clarão não adentrava aquela floresta. A sensação que ele tinha era de estar sendo trancado em esfera repleta de espinhos enormes. 

Por fim eles pararam diante de uma pequena clareira, não havia grama, a terra parecia estar morta naquela pequena parte e às árvores não se aproximavam dali.

- É aqui. - Salazar falou. - Está vendo o círculo de terra? - O selo está enfraquecendo e seu poder está mais forte. Em breve está floresta será reduzida a cinzas e os seus seguidores teriam acesso a este lugar facilmente.

-E o que eu devo fazer? - Salazar o encarou demoradamente.

-Deve fortificá-lo. Esta noite você deverá ficar aqui. Vamos ver que tipo de sentimento vai acordar a força dentro de você. - O homem deu um sorriso enviesado e saiu.

-Ridículo.

Gojo observou a floresta ao redor de si, uma leve brisa soprava em seu rosto, agitando seus cabelos. Não pela primeira vez desde que chegara, ele sentiu que o tal príncipe estava omitindo certas coisas e que havia algo de errado no castelo.

Por fim ele decidiu se concentrar. Ele estendeu as mãos esperando que qualquer coisa saísse delas. Talvez uma explosão de energia... Mas o que veio foi absolutamente... nada.

Ele tentou... De novo e de novo e de novo. Sinceramente aquilo parecia um tanto ridículo.

Uma risada suave ecoou de trás dele. E ele se virou rapidamente apenas para encontrar o homem mais lindo que já encontrara na vida.

Ele buscou manter sua postura e conter o embaraço.

-Eu não estava fazendo nada. - Disse, escondendo as mãos atrás de si.

-Certamente. Você não estava fazendo nada. - Ele sorriu.

O outro cruzou os braços sentindo-se irritado.

-Deixe eu mostrar a você. - O homem misterioso pediu.

Satoru não pareceu convencido. Mas o homem se aproximou silencioso. Usava uma calça simples que ia até o tornozelo e uma túnica clara, um pouco puída. Seus cabelos escuros caíam suavemente sobre os ombros. A simplicidade não diminuía em nada a sua beleza.

-Me diga o seu nome antes. - Pediu o mais gentil que conseguia ser naquele momento.

-Ah... O meu nome é ...Suguru.  - O outro respondeu, algo em sua expressão era triste, ele percebeu.

-Certo, Suguru, pode me chamar de Satoru. - Respondeu rapidamente.

-Muito bem, Satoru. Está tentando invocar seu poder sem nem ao menos ter ideia do que ele faz... Primeiro, não é uma coisa a parte de você. Algo que possa ser extraído. Imagine que é como qualquer outro membro do seu corpo, o seu cérebro manda e ele obedesse. Claro que não é tão simples no começo. Mas, assim que você se acostumar será como mover os dedos das mãos. - O homem sorriu ao concluir. - Por que não tenta? - Com essa pergunta no ar o homem o deixou.

Depois de algumas tentativas fracassadas durante a semana, ele começou a sentir a energia fluir, primeiro foi como um pequeno córrego, depois um rio que se alargava em direção ao mar.

Ainda que não compreendesse certas coisas ele se sentia grato aquele estranho, que já não era mais tão estranho por ajudá-lo.

Geralmente a garota que encontrara no primeiro dia em Dagda e responsável por atender suas necessidades era quem vinha abastecê-lo de mantimentos e outras coisas necessárias. Ainda que ele se questionasse como ela fazia a travessia daquela floresta de galhos assassinos que mais pareciam espinhos gigantes, ele nunca perguntou realmente como ela chegara até ali. Mais uma vez ele sentiu aquele pequeno incômodo dentro dele.

Suguru não retornou mais e ele não pôde agradacê-lo pessoalmente. Mais tarde naquele mesmo dia quem veio não foi a garota, mas sim o príncipe Salazar.

- Você progrediu bastante. Isso me alegra. - Não graças a você, ele pensou. E novamente a imagem do homem de cabelos escuros voltou a sua mente. E ele teve o anseio de perguntar se o príncipe o conhecera, mas algo o impediu. Gojo apenas sorriu. E deixou que o outro continuasse a conversa.

- Acho que está na hora de encontrá-lo. - O príncipe falou distraidamente.

Naquele instante o chão de terra onde ele costumava treinar começou a reluzir fracamente. Cinco pilares de pedra se ergueram e degraus de terra batida surgiram um após o outro. Desciam para algum lugar onde não era possível ver o fim, além dos dez primeiros todo o resto estava mergulhado na mais profunda escuridão.

Salazar deu o primeiro passo e Gojo o seguiu.

Seus passos nos degraus de terra era a única coisa que ele conseguia ouvir. O príncipe estendeu a mão e uma série de tochas se acenderam iluminando o caminho. As paredes se agigantavam sobre eles por um longo caminho. Gojo percebeu que não haviam celas ali. Por fim, os dois pararam diante de um quarto vazio, havia um odor desagradável que se espalhava pelo ambiente e um leve gotejar, algo parecido com água, mas ele não conseguira identificar de onde vinha.

Mais uma vez Salazar ergueu as mãos agitando - as.  Uma neblina densa espalhou-se pelos quatro cantos do recinto e ele finalmente viu o homem.

Usava apenas uma calça puída. Seus pés e mãos juntamente com o pescoço, estavam presos por pesadas correntes de ferro. O maxilar estava imobilizado por uma máscara escura, deixando apenas os olhos amostra.

Sua respiração era tão lenta, que ele quase parecia morto, os pés sangravam e pequenos insetos acumulavam-se ao redor das feridas, devorando a carne lentamente.

Apesar dos cortes e do sangramento imparável, ele não esboçava nenhuma reação. Nem mesmo franzia o cenho.

Há quanto tempo ele estava assim? Ele engoliu em seco.

-Por que não matá-lo simplesmente? - Gojo perguntou.

-Seria muito fácil pra ele. -Satoru encarou o homem.

Em outras palavras Salazar não podia matá-lo. Ninguém naquele mundo podia.


A Estrela Perdida da CoroaOnde histórias criam vida. Descubra agora