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CAPÍTULO XX

Wen Chao mal piscou enquanto Wei SuShe gesticulava acaloradamente. Ouvia seu discurso ambíguo sobre a difícil situação de Gusu e de pronto percebia que o irmão de Yiling Laozu desejava saber qual era a posição dele. Porém, Chao primava pela objetividade e, não raro, costumava arrancar de seus interlocutores informações comprometedoras, ao passo que ele mesmo pouco expunha as suas opiniões.
— O que, exatamente, quer de mim? — perguntou num tom neutro que, na melhor das hipóteses, revelava um vago interesse.

SuShe sentiu as costas empapadas de suor e conteve-se para não demonstrar seu nervosismo.
— Lan Qiren está morrendo — replicou.

— Foi o que acabou de me dizer.
Aquela observação deixou SuShe ainda mais tenso. Sentia-se um tolo por estar se repetindo. Pigarreou e declarou:

— A morte do Conselheiro possibilitará uma contrapartida ao péssimo governo que os Lan têm feito em minha amada cidade.

Wen Chao assentiu de modo dúbio e fez um gesto para que ele prosseguisse. SuShe engoliu com dificuldade. Sua garganta parecia queimar, e teve que umedecer os lábios ressequidos.
— Muita gente acha que há outras pessoas mais capazes que o herdeiro de Lan Qiren para governar Gusu.

— Deveras interessante, dom SuShe. Estou honrado com sua consideração. Afinal, viajou até Pequim para expor-me seus receios. Mas... existe alguma razão particular para que tenha vindo me procurar?

Disfarçadamente, SuShe enxugou as mãos nas calças. Queria poder se desviar dos olhos opacos e inexpressivos de Wen Chao, que paralisavam sua capacidade de raciocínio. Com os diabos, por que Chao não expunha seu ponto de vista?

Exasperado, SuShe viu que não tinha remédio senão colocar todas as suas cartas na mesa. Entretanto, ainda tentou se valer de rodeios.

— Como deve saber, dom Wen, houve época em que os Wei detinham o poder em Gusu e em Yiling. Os Lan não passam de usurpadores. — Ele fez uma careta de desgosto para enfatizar suas palavras.

— Plebeus pretenciosos que mataram ou subornaram para adquirir um título de nobreza…

Aqui SuShe calou-se de repente, com a respiração em suspenso, e suas últimas palavras soaram como que estranguladas. Aquela declaração, ele deu-se conta, não era muito apropriada para um interlocutor cuja família saíra do nada e conquistara em apenas uma geração, à custa de sangue e dinheiro, o mais elevado poder..

— Muita gente em Gusu acolheria com alegria o retorno dos Wei ao poder. Meu irmão e eu estamos preparados para administrar o ducado com honestidade e justiça — SuShe apressou-se em mentir, na esperança de desfazer algum malestar que seu comentário desastrado porventura pudesse ter causado.

— Suas intenções são realmente louváveis. Mas repito minha pergunta: o que quer de mim?

SuShe teve impressão de detectar uma nota de impaciência na voz de Chao. Empalidecendo, viu que não lhe restava alternativa. Teria que abrir o jogo, abandonando os eufemismos e as meias palavras.

— Se minha família se opuser abertamente aos Lan, haverá uma guerra civil. Não desejo governar uma cidade-estado falida e... — Ele fez uma pausa antes de continuar e baixou a voz: — Veja bem, não é do interesse de dom Wen Chao e do Grão Mestre que Gusu fique arruinada. E, talvez, tampouco seja do seu interesse que Hanguang-jun suba ao poder.

— Por que não? Lan Zhan é um excelente conselheiro. Prestou-me serviços com grande competência e, seja na condição de herdeiro do Conselho, seja na condição de conselheiro, continuará a me servir.

SuShe foi ficando cada vez mais enervado. Talvez, afinal, não tivesse sido tão boa idéia abordar aquele assunto com Wen Chao. Talvez fosse mais sensato contratar um assassino profissional que não fizesse tantas perguntas: Ou um bom alquimista capaz de fabricar um veneno letal. Ele suspirou.
Não, precisava se livrar de Lan Zhan de um modo que não despertasse suspeitas. Não podia sujar as mãos de sangue. Quando se tornasse governante de Gusu, não queria ouvir rumores de que a morte do cunhado fora obra sua.
Ele relaxou um pouco, sabendo que estava para lançar seu argumento decisivo.

As duas vidas de Wei WuxianOnde histórias criam vida. Descubra agora