CAPITULO VII
Daria, boquiaberta, ficou olhando o amo enquanto este era sacudido por soluços. Já viu Wei Ying chorar, mas nunca sem motivo aparente, nunca sem espalhafato e nunca sem uma platéia conveniente que se movesse diante de suas lágrimas.
Ajoelhada ao pé da cama, a escrava continuou a observá-lo cada vez mais intrigada. Já servia Wei Ying há cinco anos e conhecia-o até melhor do que teria desejado. Porém, era primeira vez que o via tão desconsolado.Levantando-se, pegou um lenço bordado de um dos cassoni, os cofres pintados onde fora guardada parte do dote de Wei Ying . Depois foi ajoelhar-se diante do amo.
Ela viu Wei Ying soluçar convulsivamente. Quieta, esperou Ouviu-o respirar fundo e de imediato se retesou, temendo que o amo descontasse a frustração nela com palavras rudes ou com uma bofetada. Num gesto automático, tocou a cicatriz que marcava seu rosto, resultado de um dos rompantes de cólera de Wei Ying. .
. Na ocasião, o amo a estapeara e, com um dos anéis, fizera-lhe um corte profundo em sua face esquerda. Daria buscou dentro de si todo o ódio que nutria por aquele homem.
O ódio que lhe dava forças para sobreviver em sua miserável existência. Porém, já não conseguia ter rancor ao amo E, por mais que tentasse, tudo o que conseguia sentir era pena.
Seria porque naquele dia, pela primeira vez, Wei Ying a chamara por seu verdadeiro nome? Durante os cinco anos em que estivera a seu serviço, o amo insistira em apelidá-la de Bárbara, interpelando-a invariavelmente num tom provocativo.Naquele dia, porém, olhara-a nos olhos e a chamara de Daria, tratando-a como um ser humano e não como mero objeto.
A escrava fez um movimento quase imperceptível para atrair a atenção do amo. .Wuxian parou de chorar e viu Daria ajoelhada, cabisbaixa, estendendo-lhe humildemente um lenço. Quando o pegou, percebeu que a outra não ousava sequer erguer o rosto. Por quê? Constrangimento talvez? Súbito, Wuxian ficou apreensivo. Será que a escrava desconfiava de sua farsa?
— Por que não me olha, Daria?A jovem russa teve um sobressalto. Encostou a cabeça nos joelhos e se retraiu, esperando uma punição.
* Perdoe-me, senhor — murmurou.
* Olhe para mim, Daria.
Wuxian pousou a mão em seu ombro. Ela encolheu-se ainda mais.
* Peço-lhe perdão — repetiu. — Senhor Wei Ying me ordenou que mantivesse meus olhos indignos sempre baixos,sob pena de levar dez chibatadas.
* Ninguém irá chicoteá-la, Daria. Agora eu lhe ordeno que me olhe.
Vacilante, a escrava endireitou-se e levantou os olhos. Lia-se em seu rosto medo e confusão. Wuxian decidiu correr o risco. Precisava desesperadamente de uma amiga e pouco se importava de se aliar a uma escrava.
— Julga-me mudado, não é? — perguntou sem rodeios.Daria assentiu com um gesto rápido e tornou a baixar o rosto. Wuxian segurou-lhe o queixo e fez com que o encarasse novamente. Depois disse com suavidade:
— Conte-me o que pensa. Eu lhe ordeno.
— O senhor dispensou as outras camareiras... Permitiu que eu, sozinha, o ajudasse a se preparar para o banquete. E...enfeitou-se apenas com dois anéis — a escrava gaguejou. .
Se Wuxian não estivesse lhe segurando o queixo, ela teria baixado o rosto.
* Há algo mais, não é? — Wuxian inquiriu, perscrutando-a de modo implacável.
– Senhor Wei Ying não me puniu quando eu lhe escovei os cabelos. E, pela primeira vez, não me chamou de Bárbara.
Daria ficou com a respiração em suspenso, pronta para receber a bofetada que dessa vez, tinha certeza, não tardaria atingi-la.
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As duas vidas de Wei Wuxian
FanfictionO Duque Hanguang-jun precisava consumar aquele casamento arranjado. Mas não confiava em seu ômega: Yiling Laozu era conhecido em Yiling tanto por sua beleza quanto por sua maldade! Contudo, na noite de núpcias, quando ele o fitou com um misto de ver...