14

501 88 3
                                    

CAPÍTULO XIV

A tensão de Wuxian foi aumentando à medida em que avançavam pela rua mal-iluminada. A cada passo retesava-se.involuntariamente, o coração disparado, a garganta seca, a respiração em suspenso.

Não, não podia ir adiante com aquela trama absurda! A plena realização do horror que estava prestes a suceder atingiu-o como um raio. Não, não podia levar aquilo adiante... Quem lhe garantia que o matador seguiria suas instruções à risca? Como fora ingênuo! Mas o que lhe dera para confiar na palavra de um homem que fazia do assassinato sua profissão? Pois nada, nada lhe garantia que ele não mudaria de idéia.
Ou que, no último instante, sua mão não vacilaria e acabaria cometendo um erro irremediável. Ademais, e se SuShe lhe tivesse oferecido mais dinheiro, para que desferisse um golpe mortal?

Wuxian estava nas fronteiras do imponderável. As dúvidas se cruzavam e entrecruzavam em seu cérebro. Seus piores temores e pesadelos acordaram em seu íntimo. Tinha que alertar Lan Zhan, contar-lhe tudo... Mas então, talvez não acreditasse nele. Ou, na melhor das hipóteses, nunca mais confiaria nele.

O pânico tomou conta de Wuxian, materializando-se na forma de um suor gelado que lhe banhava a fronte, de violentas contrações em seu estômago que iam subindo até fechar sua garganta.
Vagamente, notou que a liteira havia acabado de dobrar uma esquina mais à frente. Concentrando-se nas palavras que deveria dizer a Lan Zhan, ele nem ouviu o rangido abafado de uma porta que se entreabriu atrás dos dois.

Lan Zhan porem, escutou o ruído. Virou-se abruptamente, protegendo Wei Ying com o próprio corpo, e sacou a adaga.

Aquele movimento brusco tirou-o de seu estupor e, aterrado, Wuxian olhou para o assaltante. No lapso de segundo em que os dois adversários empunharam suas adagas, Wuxian percebeu que o malfeitor não era o homem com quem havia feito o trato.

Sem refletir, ele soltou um grito inarticulado e lançou-se sobre o assassino que investia com a adaga. Não sentiu nada quando a lámina afundou em seu flanco; nada, a não ser cólera e um imperioso instinto de proteção.

— Wei Ying! — Lan Zhan gritou fora de si, empurrando o desconhecido e empregando tamanha força que a cabeça do outro chocou-se contra uma parede com um baque surdo.
Os gritos atraíram a atenção dos guardas e dos servos que carregavam a liteira. Empunhando lanças, eles vieram em seu socorro.

— Entrementes,Lan Zhan foi acudir Wei Ying. Amparou-o bem a tempo de evitar que desabasse no chão.

— Wei Ying, está... — As palavras morreram em seus lábios quando percebeu a mancha escarlate que se alastrava sob a axila de dele.
— Não! — gritou, tomado de desespero.

Tomou-o nos braços. Mal ouvia os sons da briga que se desenrolava às suas costas. Por um momento, olhou para o esposo transido de horror. Depois virou-se para seus homens e bradou:
— Vivo! Quero esse homem vivo! .

Porém, era tarde demais: a ponta de uma lança já se enterrava no peito do malfeitor.

— Quem o contratou? Fale, maldito! Quem o mandou aqui? — Lan Zhan tomou a gritar, trêmulo de raiva.

O homem fez uma careta de sofrimento. De olhos vidrados fitou o vazio, enquanto a vida ia pouco a pouco se esvaindo de seu corpo. Quando sua cabeça tombou para a frente, Lan Zhan soube que não havia mais nada a fazer. Ele apertou o corpo inerte de Wei Ying contra si e começou a correr.

(...)

Wuxian despertou sentindo o corpo inteiro latejar com uma dor difusa. Instintivamente tentou se fechar para a realidade, todavia sem sucesso. Ouviu sons. As batidas remotas de um pilão. O crepitar do fogo. O monótono murmúrio de uma mulher rezando.

As duas vidas de Wei WuxianOnde histórias criam vida. Descubra agora