2 - A Monarquia.

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NO COLÉGIO EINSTEIN, SER COMUM ERA LEI. Por aqueles corredores só sobreviviam os que escolhiam a mesmice e deixavam a autenticidade do lado de fora dos portões. A instituição era uma das mais tradicionais, sofisticadas e aclamadas da cidade. Erguida em um terreno vasto, possuía uma estrutura de invejar, com um pátio extenso, jardins, uma quadra de esportes a céu aberto e um enorme estacionamento na parte traseira. Fora o ginásio e o pavilhão de natação.

No centro de tudo, o prédio principal de quatro andares abrigava as salas de aula, todas climatizadas; laboratórios, a biblioteca e outros espaços académicos. Havia também uma cantina espaçosa no térreo, onde os alunos se reunião para comer, falar alto e fazer as brincadeirinhas da idade; brincadeirinhas essas que muitas vezes envolviam zoar outros alunos, no caso, os mais vulneráveis.

Apesar da política contra uniformes, o Colégio Einstein era uma selva onde a diversidade não tinha vez e, entre aqueles muros, ser diferente era ser estranho e ser estranho te tornava merecedor de todas as atrocidades cometidas pelos valentões que ocupavam o topo da cadeia de popularidade do lugar.

Liza, assim como os outros, sabia bem o que isso era. Pertencia ao grupo dos desqualificados sociais, daqueles sem voz nem vez. Se escondia na invisibilidade para não ser notada e fazia de seus pensamentos sua melhor companhia, apesar de parte deles serem sobre saudades, culpas e afins.

Já houve tempos em que estar no meio da multidão não era algo aterrorizante para Liza. Ela lembrava dessa época com certo carinho. Na altura, conseguia aturar os ruídos das risadas e as alfinetadas que recebia porque Nathalia era sua companhia, mas depois que a amiga se foi, tudo mudou. Agora andava pelas sombras, quase nunca era vista em outro lugar, senão na sala de aula. De tempos em tempos, aparecia e ficava com Rafael, no pátio, conversando; afastados da cantina, dos corredores lotados ou de qualquer outro lugar em que pudessem ser importunados.

Eles se preservavam.

Talvez, por está razão, Dominick tenha ficado espantado quando cruzou a cantina e viu Liza por lá, no horário de pico, pela terceira vez na semana; sentada com Rafael naquela mesa do fundo, ilhas perdidas naquele oceano de alunos. Os dois pareciam assombrados, olhavam para os lados a todo momento, temerosos. Não era difícil para Dominick prever o que aconteceria. Eles estavam expostos e a situação era clara: Dois veados arrastados pela correnteza até a margem de um rio, onde por azar um grupo de crocodilos apanha sol.

O ataque era só questão de tempo.

O professor continuou observando de longe, querendo ver no que aquilo daria. Alguns minutos depois, os outros comparsas chegaram. Tobias, Mara e Eduardo, entraram na cantina com o andar contido, se aproximaram da mesa e sentaram. Completando assim o clubinho de rejeitados e, por tabela, atraindo o olhar dos alunos em volta.

— O que é isso? Uma convenção de esquisitos?! — O grito soou de uma das mesas. Uma algazarra de risadas inundou a cantina.

Dominick não entendia o porquê daqueles garotos terem abandonado seus esconderijos sociais e se jogado aos lobos. Soava estranho. Não que fosse a favor da exclusão, longe disso, mas entendia que existiam guerras que não deveriam ser travadas. Principalmente quando o adversário não tem o mesmo senso de humanidade ou a mesma noção de limites.

Naquela manhã, o professor olhava para cada um dos cinco meninos e visualizava as marcas deixadas pelas experiências ruins que já tiveram. Via seus olhares assustados, a tensão nas expressões e a inquietação. Tudo sinal de que nenhum dos tais queria estar ali. Mas então, por quê estavam?

Não sabia responder.

Não demorou para que Tina, a filha do ex-prefeito da cidade e uma das "monarcas" do colégio, notasse a presença do grupinho. A garota se levantou da sua mesa com um sorriso tendencioso no rosto. Jogou o cabelo e ajeitou a mini-saia. O show iria começar.

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