9 - Lembranças.

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"ELES VÃO COLOCAR O PLANO EM AÇÃO NO DIA DO BAILE?!" A inquietação latejava na cabeça de Dominick. O professor dispensou sua última turma. Subiu e se isolou em sua sala, afundado nos pensamentos e preocupações. As informações espalhadas em sua mente o atordoavam. Precisava montar o quebra-cabeça e resolver o mistério, mas não encontrava caminhos. Pela primeira vez, começou a considerar falar com a Diretora sobre o assunto.

Parou pra refletir.

Talvez a possibilidade dos alunos arruinarem o baile faça a diretora considerar. Pensou. Mas as consequências ainda o preocupavam. Contar o que sabia poderia causar ainda mais revolta ao grupinho e isso o assustava. Fora o facto dele não poder sustentar suas suspeitas com provas concretas. Seria só a sua palavra contra a dos meninos, que certamente negariam as acusações.

Enquanto se debatia em pensamentos, lembrou que ainda não havia falado com o grupinho inteiro. Faltavam Mara e Tobias. Talvez esses dois acabem contando alguma coisa. Pensou novamente. Parou para analisar essa possibilidade e sorriu levemente debochando do próprio pensamento.

"Até parece que Tobias toparia falar comigo." Abanou a cabeça.

Dominick sabia com quem estava lidando. Não eram criminosos e sim adolescentes revoltados, perdidos em caminhos difusos, mas tentando achar um porquê. Talvez o professor só precisasse lhes ajudar nisso, e estava disposto a fazê-lo. Dominick lembrava que já foi como eles há um tempo. Já sentou no lugar mais afastado da cantina e sentiu o amargo da rejeição. Conhecia bem o que a revolta podia fazer numa mente oprimida. Não fez com ele, mas fez com seu melhor amigo, de quem evitava se lembrar.

O professor via agora outros jovens sendo cegados pelo mesmo sentimento, e se alarmava. Tinha, entre os cinco, alunos com os quais teve momentos incríveis. Momentos que deram luz e cor ao exercício de sua profissão; momentos em que se despiu da capa de professor e foi amigo ou até mais. Momentos dos quais lembrava com saudade e emoção.

Afetado, ele se recostou na cadeira e respirou. Deixou o frescor do ar-condicionado ditar seu estado e viajou, sossegado; imergiu em lembranças. Pensou na Liza e no seu amor pela literatura, que um dia já se fez sentir. Meses antes da morte de Nathalia, como bem recordava, o professor era o seu principal fornecedor de livros, e nessa altura, a caloura o procurava no final de todas as leituras, e muitas vezes trazia os amigos consigo:

— Está aqui o livro, professor. O senhor já vai poder me dar outro? — A menina questionou.

— Mais um?! — Nathalia admirou. A sala de aula acabara de ser esvaziada, carteiras desajustadas davam um ar juvenil ao lugar e o burburinho dos alunos pelo corredor ainda se ouvia. — Nem faz três dias que você pegou o último livro, Liza. Como você arranja tempo pra ler tanto?

Rafael tapeou os ombros da menina levemente, para que se calasse. Liza olhou para Nathalia, indignada.

— Eu não costumo te criticar quando passas horas escrevendo segredos naquele teu diário misterioso. Então me deixa em paz, tá!

— Ta bem... Eu calei. — Nathalia fez o gesto de um zíper passando sobre a boca. Dominick soltou um sorriso.

— Pra ser sincero, eu também estou surpreso. Fazem só dois dias que você levou esse livro.

— Eu sei, professor. Mas eu já terminei.

— Nossa, foi rápido. E você gostou?

Ela respirou e acenou com um leve sorriso.

— Eu gostei muito, professor. Se parar pra pensar, o livro foi escrito em 1993 e trinta anos depois ainda soa futurista. Lois Lowry já é, com certeza, uma das minhas escritoras favoritas.

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