13 - O desacordo.

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OS DIAS SE PASSARAM E O ASSUNTO "RAFAEL" CAIU NA BOCA DE TODOS. O "ouvi dizer" foi se disseminando pelo colégio, de ouvido à ouvido, gerando diferentes reações. Apesar de não se saber que doença acometia o garoto, circulava pelos corredores a informação de que era grave e, com isso, todo mundo ficou preocupado. Ou, pelo menos, pareciam estar.

Quando uma professora anunciou para a turma de forma oficial, Liza soube que a notícia traria a tona todos aqueles questionamentos que a causaram insónia nesses últimos dias. E, fora isso, teria ainda que lidar com a falsidade dos colegas que se aproximavam para prestar solidariedade e desejar rápidas melhoras ao seu amigo, sendo que nem se importavam. Cada gesto que recebia era como um ácido sobre o metal, seu coração se corroía com a lembrança de que, boa parte dos rostos que agora a encaravam com empatia forçada, outrora olharam para Rafael com o deboche escancarado; sorrindo de alguma maldade que a Monarquia fizera.

Hipocrisia e nada mais.

A manhã toda foi assim, olhares comovidos para a menina que perdeu a melhor amiga há cerca de um ano, e agora tem o outro amigo adoecido. Liza não soube lidar com tudo isso. Ela se isolou em algum lugar no pátio, afastada de todos, até receber uma mensagem de Tobias, convocando uma nova reunião do grupinho.

A garota respondeu ao chamado.

***

Era a mesma sala da última vez, com carteiras desarrumadas, recém-abandonadas por alunos ávidos por deixar o colégio e chegar à casa. Dentre as dezenas de salas distribuídas sobre o edifício do colégio, essa era a mais isolada de todas; situada ao fim do corredor mais afastado do segundo andar. Uma localização conveniente para o grupinho e suas reuniões.

As janelas da sala eram voltadas para a parte de trás do colégio, onde ficava o estacionamento e a quadra de basquete a céu aberto. Naquele lugar, eles podiam falar sobre tudo sem o risco de serem ouvidos ou interrompidos por alguém. E era isso que faziam.

Após a chegada de Liza, o grupinho ficou quase completo. Agora, os quatro estavam ali, reunidos, dispersos pela sala como se o espaço entre eles fosse suficiente para esconder o que cada um sentia. Em instantes, o clima do lugar se moldou à energia que eles exalavam. A tensão, o olhar acuado e o receio, sentimentos emanados pelos quatro que preenchiam o recinto e deixavam o ambiente pesado. Quem espreitasse de fora, perceberia tudo isso. Quase um mês se passou e eles ainda pareciam estranhos uns com os outros. Todos cercados de barreiras.

— Vocês já devem ter ouvido sobre o Rafael, né, gente? — Tobias puxou o assunto.

Um silêncio tomou conta da sala por instantes.

— Acho que não se fala de outra coisa, cara. — Eduardo comentou. — Parece que ele estava doente o tempo todo e não disse nada a ninguém.

— Pois é... Que coisa. Se bem que eu sempre achei ele meio estranho, sabe?

— Estranho como?

— Ah, sei lá... — Tobias ponderou. — Parecia esconder algum segredo. Ficava sempre com aquelas roupas enormes, parecendo aqueles cantores de hip hop. Era esquisito...

Mara, que estava perto de Tobias, cutucou o namorado e apontou para Liza com o olhar. Tobias logo percebeu a inconveniência de seus comentários e encerrou a conversa, embaraçado. Por instantes, o silêncio passeou pelas carteiras e sentou sobre a mesa perto do quadro. Suspiros de lamentos soaram, simultâneos, antes dos três lançarem um olhar comovido para Liza, que se mantinha em silêncio, perto da janela; jogando seu olhar vazio para o céu lá fora, como quem pensa em coisas alheias ao lugar em que está.

Eles a deixaram quieta.

— E o que nós vamos fazer agora? — Eduardo adiantou a pergunta que intrigava todo mundo. — Vamos mudar o plano?

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