3 - A Redação.

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MESMO FORA DO COLÉGIO, AINDA HAVIA UMA NUVEM DE PREOCUPAÇÃO PAIRANDO SOBRE DOMINICK. Pra quem sempre achou que precisava estar atento ao que os meninos planejavam, a confirmação de suas suspeitas não foi algo regozijante. Pelo contrário. Passou o resto da tarde lidando com o amargo da apreensão e se debatendo em pensamentos, tentando adivinhar o que os meninos fariam. Tão atordoado que nem a calmaria da noite o sossegou.

"Ah, meu Deus! Eles planejam um atentado!" Tal pensamento surgiu assim que seu rosto beijou o travesseiro. O professor se perturbou de imediato, levantou apressado e foi até o computador. A luz da tela iluminou seu rosto expondo as preocupações, o medo de estar certo o atribulava. Ele estendeu os dedos sobre as teclas, prestes a escrever alguma coisa, mas parou, acometido por uma reflexão. Sentiu o leve cutucar da tristeza em seu peito e, lesado, suspirou. Era duro pensar em como o Bullying havia afetado a vida daqueles cinco meninos.

Refletiu...

Dominick trabalhava naquele colégio há mais de seis anos. Viu muitos Verões, outonos e primaveras se passarem. Conseguia se lembrar da chegada de cada um dos cinco alunos com certa clareza. A empolgação e o entusiasmo que eles traziam consigo, que eram característicos de adolescentes prestes a embarcar nessa jornada transformadora que deveria ser o ensino médio.

Ele lembrou do jeito respeitoso de Tobias, que trazia sua educação religiosa no falar e agir; da caridade da Mara, que no primeiro dia ofereceu seu melhor casaco para a aluna que teve sua camiseta manchada pela "poderosa Tina" e seu suco de cenoura. Lembrou também do Rafael e seu jeito leve de levar as coisas, sem esquecer suas piadas sem graça. Lembrou da vontade de aprender que Liza trazia por detrás do olhar inofensivo, e do Eduardo, o calouro, ele lembrou do silêncio, que por sinal não havia mudado, mas agora vinha acompanhado de revolta, raiva e muita indignação.

Dominick se entristeceu ao constatar que todas essas características genuínas foram arrancadas desses meninos, e o que sobrara agora eram olhares acuados, sorrisos mais tristes do que felizes; revolta, e aquela vontade de sumir que gritava alto mesmo eles tentando abafa-la.

Estavam todos transformados.

Diante desses pensamentos, o professor tomou fôlego e encarou o computador. Seus dedos pressionaram as teclas certas, buscando por respostas, e os primeiros resultados já demostravam algo assustador: O índice de alunos vítimas de bullying que acabaram por revidar era preocupante. As notícias estavam lotadas de histórias dessa natureza, e os danos iam de acidentes pequenos a mortes em massa. Dominick se assustou com o que leu.

Seu coração acelerou e o desespero foi maior do que conseguia controlar. Sabia que, se por algum acaso, seus alunos cometessem tal atrocidade, destruiriam suas vidas para sempre. Além das vidas dos afetados.

Ele não quis acreditar...

"O bullying causa tanto mal assim ao ponto de fazer com que adolescentes na flor da idade se revoltem e desistam de tudo?!" Dominick, mais do que ninguém, sabia como responder a essa pergunta.

Fechou o computador e deixou que a escuridão inundasse seu quarto. Pousou a cabeça sobre o travesseiro novamente e, num suspiro, decidiu que faria de tudo para consciencializar os alunos e impedir que uma tragédia acontecesse.

Mas só no dia seguinte.

***

O sinal tocou anunciando o fim de mais um dia de aula. Diante dos alunos, o professor varreu a sala com o olhar e viu de tudo: Uns cochichando e soltando risinhos, outros afundados nos celulares e os mais apressados, já recolhendo suas coisas, mirando a saída.

Dominick lançou seu olhar para o fundo da sala, viu Liza sentada bem ao lado do lugar de Rafael, que estava vazio. No início da aula, o professor já havia notado a ausência do menino, questionou, mas não obteve respostas concretas. Alguns alunos afirmaram que o viram no pátio da escola, só não tinham a plena certeza, então, decidiu deixar pra lá.

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