17 - Tobias.

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NÃO FOI NECESSÁRIO VIRAR PARA VER QUEM ERA. Assim que o intruso contornou o ônibus antigo do colégio, sua voz soou e logo foi reconhecida.

— Então você está aqui! — Tobias se aproximou com um sorriso desinibido. Estava ofegante e levemente suado. — Procurei você pelo colégio inteiro, amor. O que houve?

Mara se aquietou. Não respondeu. O ressentimento em seu olhar se formou, como nuvens negras acabando com um dia de sol. Dominick percebeu. Já Tobias, alheio ao que acontecia, ou talvez só desencanando; chegou perto, lançou um olhar afiado para Dominick e se sentou bem no meio dos dois. Como se os tentasse dividir. Ele passou a mão sobre os ombros da garota, um gesto comum que para muitos denotava proteção, mas para Dominick, que observava com o olhar estreito, aquele gesto era como se o garoto tentasse fazer da namorada uma extensão dele mesmo, e assim, controlar tudo o que ela fazia.

— Você está bem, linda? — Tobias perguntou em meio ao silêncio de Mara.

Mara soltou um "aham" e se manteve calada. Tobias, não satisfeito, deu uma movimentada no quadril e chegou mais perto da garota.

— Sobre o que vocês estavam conversando? — Questionou.

— Nada demais. — Mara respondeu, apressada. — Estávamos falando sobre a redação. Eu disse ao professor que estou tendo dificuldades em escrever, e o dia da apresentação já está a chegar.

— Ahm, sei... — Tobias encarou a namorada com desconfiança. A menina se encolheu mais ainda. Dominick interferiu.

— E você já começou a trabalhar na redação, Tobias?

O jovem se virou de supetão. Estava tão ocupado desconfiando de Mara que nem prestou atenção no que o professor dissera.

— Desculpa, não entendi, professor.

— Eu perguntei se já estás a fazer a redação...

— Ah, sim. Já está quase terminada. Falta só uns detalhezinhos e já, já fica pronta. Eu estou empenhado, apesar de achar o assunto meio desnecessário.

— Desnecessário?

— Sim... Acho que essa coisa de motivos pra viver não existe. Nem existe essa coisa de porquês, gente. É tudo conversa.

O professor se espantou. Se virou para o garoto com a expressão clara de surpresa.

— Então, pelo quê você acha que as pessoas vivem? — Perguntou curioso.

— Bem, não posso falar pelos outros, professor. Mas eu só sigo vivendo porque a outra opção é morrer. Simples assim. A vida é cheia de coisas que te impulsionam a querer desistir. É só olhar ao redor. Por isso eu acho que uma redação sobre motivos para desistir faria bem mais sentido.

As palavras do menino carregavam um tom de provocação. Mas, ainda assim, Dominick quis ir mais a fundo.

— A que tipo de coisas você se refere?

Tobias ponderou por um tempo.

— Falo de dor, sofrimento, opressões e por aí vai... Para mim a vida é uma prisão onde existem os presos e os carcereiros. Os carcereiros oprimem os presos e ditam o jeito que eles devem agir, e os presos não têm opções. Ou obedecem ou sofrem. Um preso não tem motivações nem porquês. Ele só continua vivendo porque a outra opção parece bem pior.

— E você se sente um preso, ou um carcereiro?  — Dominick o encarou fixamente.

O garoto parou, engoliu em seco e virou o olhar para o vazio. Era quase impossível para ele evitar o filme que passou em sua mente quando a pergunta soou. Foi como um impulso. O clima ameno que agora banhava a tarde e o cantarolar rústico dos pombos em volta eram um convite a reflexão. O garoto pensou por mais uns instantes até suspirar profundamente e encarar o professor com a expressão de quem sabe que estará certo no que dirá.

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