Arrasto a minha mala pelo saguão da pousada indo para o balcão da recepção. Ao solicitar uma acomodação, espero desolada o recepcionista registrar o meu check in. O lugar simples me atraiu com sua faixa anunciando uma diária razoável, incluindo café da manhã e ar condicionado. Sem dúvidas, nos hotéis luxuosos ao redor, uma acomodação custará um valor exorbitante. Não estou interessada em ostentar em uma estadia de apenas uma noite.
— A senhora ganhou uma massagem no nosso spa, que fica no último andar. Deseja agendar o seu horário agora? — informa o recepcionista com a voz anasalada.
Spa me lembra Íris, massagem me lembra Dom.
— Nem me lembre de spa e massagem, por favor — peço franzindo todo o meu rosto e o recepcionista me olha confuso. — Eu vou dispensar, mas obrigada — digo com uma expressão simpática, embora seja difícil sorrir no momento. Íris até já é uma história superada, só me falta apagar da memória tudo o que passei com Dom. Mesmo sendo lindos momentos, as lembranças estão corrompidas.
— Claro, sem problemas! — O rapaz bate em uma tecla do computador. — Também oferecemos uma imensa cartela para passeios com nossos parceiros. Pode conhecer diversas praias do litoral por buggy ou veículo quatro por quatro. A senhora já tem em mente se gostaria das rotas do lado sul ou norte da cidade? — A voz dele e o jeito pedante é algo que irrita, mas parece inconsciente.
— Não, meu anjo — recuso. Tento sorrir e acabo fazendo uma careta. — Moro aqui mesmo, só vou passar a noite — esclareço na esperança que se encerre as ofertas turísticas.
— Talvez esta seja a oportunidade perfeita para passear pela sua cidade, não acha? Os nossos preços são os melhores, e a infraestrutura que nossos parceiros oferecem é elogiada por todos os clientes — diz, numa fala visivelmente decorada. — Que tal um incrível passeio de lancha em volta da Ponta do Golfinho? Se não ver pelo menos um golfinho, não paga. — Fico estática olhando para o recepcionista, me perguntando de onde ele tirou esse passeio.
Ponta dos Golfinhos? Sério?
— Não? — pergunta. Diante do meu silêncio, bate na tecla do computador novamente. — E que tal um mergulho no encontro do rio com o mar na praia de Princesa de Aiocá, com profissionais? — sua pergunta me teletransporta para o passeio de moto que fiz com o dono do morro.
— Moço! — falo um pouco alto, impedindo que continuasse as ofertas que parecem ter sido feitas por Dom. — São mais de três horas da madrugada, eu só quero a chave.
— Entendo... — Ele faz cara de paisagem e bate nas teclas uma dezenas de vezes, aproximadamente. — Café da manhã no quarto?
— Sim, por favor.
Ele bate uma última vez e me entrega finalmente um cartão chave.
— Seja muito bem-vinda ao Sunset Orange in Blue! — diz, com um largo sorriso.
— Sério? — dessa vez não resisto em perguntar. Parece inacreditável.
— Oi? — pergunta confuso o recepcionista.
— O nome do hotel — balbucio, tentando ter certeza que não estou delirando.
— Ah! É porque o pôr do sol é laranja no nosso céu sempre azul. Particularmente, acho um nome enorme para uma pousada, mas é coisa da proprietária. Parece que dona Suzanna é um pouco... Como é o nome daquele negócio chinês? — Estala os dedos em minha direção, esperando que eu o complete.
— Feng shui — digo, pensando que não é possível ser a mesma Suzanna.
— Isso! — Ele bate as palmas no ar. — Só que o feng shui dela não é muito chinês não, é o que ela quer e pronto. — O rapaz sorri. — Aqui ainda é novo, dizem que o antigo proprietário devia uma grana para uma galera barra pesada. Dona Suzanna acabou comprando e está reformulando o conceito, por isso a frente não tem placa, só a faixa da nossa promoção.
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A VIDA NO MORRO COMEÇA CEDO
RomancePrêmio: 🥈Concurso Cerejeiras em Flor Traumas podem virar sonhos? Dalena e Dominic se conhecem na adolescência, depois que ela foge de casa para dar um fim aos abusos crescentes do seu padrasto, enquanto ele já trabalha para o tráfico. No entanto, a...