Dom se despede, dando alguns passos em direção ao seu carro. Observo com o coração apertado enquanto ele se afasta, pronto para encarar as suas lutas. A imagem da Range Rover diminuindo ao longe deixa um peso no meu peito, uma sensação de vazio e incerteza. Fico ali, parada, sem saber ao certo como me acostumar com essa partida constante.
Caminho em direção ao bar, o portão está destrancado, como sempre. Depois que entro, sigo para a cozinha, onde encontro Lourdes sentada à mesa. Ela segura um cigarro entre os dedos, diante de uma xícara de café vazia e o seu caderno de movimentações financeiras. Ao notar a minha presença, sorri. Em seu olhar, percebo que já sabe sobre mim e Dom.
Eu me sento à mesa, em uma cadeira à sua frente. Minha velha amiga dá uma tragada em seu cigarro, formando uma ponta cilíndrica de cinzas por onde passa o círculo de brasa. Sua boca segura a fumaça um instante e, em seguida, sopra em um jato fino no ar.
— Estão todas se arrumando? — pergunto com relação às garotas que trabalham no seu bar.
— Estão. Acredito que hoje terá um bom movimento. — Fecha o caderno quando termina uma anotação, prendendo o cigarro entre os lábios. — Agora me conta, qual é a diferença entre os dois? — pergunta se referindo a Dom e Otávio. O canto da minha boca se arqueia num risinho empolgado, amo conversar essas coisas com Lourdes, ela sempre sabe tanto.
— Otávio quer me possuir e Dom quer me sentir... ele trilha caminhos do meu corpo que eu desconhecia. Claro que é um vilão quando assume sua posição no tráfico, precisa ser, mas um príncipe encantado quando não tem ninguém olhando. — Lourdes abre um sorriso satisfeito. — Já o senador, é uma fogueira que estou tentando pular sem me queimar mais do que já me queimei.
— Thundercat me surpreendeu positivamente, espero que continue assim. — Dá outra tragada no cigarro sustentando um sorrisinho nos lábios. — Os caras da facção que aparecem por aqui, dificilmente surpreendem.
— Eu imagino... — digo com insatisfação. — Fiquei sabendo que Dom te procurou por minha causa há um tempo, mas você não me disse nada na época.
— Não quis colocar uma garota estudiosa e que não se envolvia em problemas nas mãos de um traficante, mesmo morando aqui. A maioria das pessoas no morro são analfabetas ou mal sabem ler, você é uma raridade... até me ajudou a soletrar.
— Por que agora não é contra nós dois juntos?
— Sua vida seria muito sem graça sem viver um amor e dá pra ver que vocês têm uma história. — Apaga o cigarro no cinzeiro de vidro em formato de flor, ao lado da xícara. — Onde se conheceram?
— Aqui no morro. — Faço um dar de ombros.
— Você nunca me contou que se conheciam.
— Desconfiei que não ia gostar se soubesse e apesar de fazer segredo, eu sempre respeitei o meu acordo com o senador. Nunca tivemos nada, até agora.
— Só uma paixão mal resolvida. — Ela sorri, maliciosa.
— É — concordo, sorridente. — Nunca teve medo que eu me apaixonasse por Otávio?
— Claro. Ele é o pior tipo de homem, porque não conquista, ilude. E o problema de muitas mulheres é que não sabem diferenciar paixão de deslumbramento — diz de uma forma professoral.
— Olha, acho que passei por isso — reconheço em tom de brincadeira.
— Ah. Sempre foi um risco você se deslumbrar, mesmo quando o senador não escondia quem era.
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A VIDA NO MORRO COMEÇA CEDO
RomancePrêmio: 🥈Concurso Cerejeiras em Flor Traumas podem virar sonhos? Dalena e Dominic se conhecem na adolescência, depois que ela foge de casa para dar um fim aos abusos crescentes do seu padrasto, enquanto ele já trabalha para o tráfico. No entanto, a...