▓ CAPÍTULO VINTE E NOVE ▓

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Quando termino de vestir uma roupa depois do banho, ouço batidas na porta. Imagino que Dom tenha me visto chegar em casa pela câmera, quem sabe até tenha outras pela casa. Infelizmente, não dá mais para confiar nele agora que sei o quanto é paranoico com essa coisa de me rastrear.

Desço as escadas e abro a porta. A expressão no seu rosto é mortalmente silenciosa. Dom está entre aqueles momentos em que esconde de mim o que está pensando e controlando absurdamente as suas emoções. Seria raiva por eu ter despistado Antônio Carlos, preocupação por eu ter passado o dia sumida ou os dois?

Não posso deixar de sentir o meu coração emocionado por estar frente a frente com ele. O conflito de saber que em um minuto podemos estar nus nos braços um do outro, mas eu me proíbo disso acontecer, corrói o meu âmago. É praticamente um autoflagelo fingir que estou diante de alguém que não representa nada para mim, quando, na verdade, estou diante do amor da minha vida.

— Não vai me convidar para entrar? — A pergunta deixa escapar uma indignação ressentida em sua voz.

Desbloqueio a entrada da casa, indo para o lado. Os meus olhos famintos passeiam pelo corpo de Dom, enquanto ele se preocupa em entrar. Foco tempo demais em sua bunda fazendo uma bela curva dentro da calça jeans e acabo sendo surpreendida. Mantenho o olhar vidrado no mesmo ponto, fingindo ter sido coincidência a bunda dele e o meu olhar pensativo se encontrarem.

Como consigo estar tão irritada e tão fissurada nele ao mesmo tempo?

— Congelou na porta? — pergunta e finjo quebrar o meu estado hipnótico. Foi uma bela atuação, devo confessar. — Como passou o dia?

— Bem, como pode ver — respondo ao trancar a porta. Sua pergunta me deixa um pouco confusa. Ele não sabe que escapei de Antônio Carlos ou está fingindo?

— Fiquei muito preocupado com você, já que estamos sem contato — diz ao sentar no sofá.

Ele não sabe. Isso é perfeito. Acabo dando um risinho interno.

— Acho melhor ficar assim por um tempo — digo para a sua decepção.

— Hmm.

— Olha, eu me preocupo...— engasgo um pouco na última palavra — eu me preocupava com você — corrijo —, mas nem por isso te rastreava. Não acha um exagero? Melhor dizendo, não acha que seja patológica essa questão de me seguir? Você mesmo disse que faz isso desde sempre. — Acabo conectando os pontos. Dom se encosta no sofá e franze o cenho.

— Não. Não acho — responde, contrariado.

— Ás vezes temos um problema e não conseguimos achar que seja — falo enquanto penso sobre isso. Dom fica sério, parecendo ofendido com o que estou dizendo.

— Onde quer chegar, Dalena?

— Só quero dizer que isso não é saudável para nós dois — afirmo com seriedade. Ele reflete sobre o que eu disse. — Eu imagino que esteja acostumado a ter um controle arbitrário sobre tudo. Na sua posição, pode achar até normal.

— Primeiro, eu não controlo a sua vida. Segundo, eu ficava de longe te vendo, porque sim, eu não te tirava da minha cabeça, por isso precisava te ver ao menos um pouco. E sim, também precisava ver que estava bem. Terceiro, eu tenho muitos inimigos que no momento querem me prejudicar mais do que nunca. A forma mais fácil de me atingir é te machucando. Queira ou não. — Olho o "D" em seu pescoço com certa culpa.

— Uh... — pigarreio

— Quarto, Otávio... — Fico atenta, esperando que me fale o que sabe. — Eu não confio nele e você também não deveria.

A VIDA NO MORRO COMEÇA CEDOOnde histórias criam vida. Descubra agora