▓ CAPÍTULO VINTE E CINCO ▓

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Dom entende a minha necessidade de ficar somente em sua companhia enquanto choro em silêncio. Faltou ânimo para subir as escadas, só afundei no sofá e ele me deu o seu colo para a minha cabeça fazer de travesseiro, enquanto afaga os meus cabelos caindo por suas pernas.

Não me lembro de ter chorado na presença de outra pessoa depois que fugi de casa. Eu me preocupava demais em fingir que sou autosuficiente, madura e coisas do tipo, mesmo não sendo nada disso. Acredito que, no fundo, estava evitando mostrar que na realidade eu não passava de uma garotinha abandonada.

Muitas vezes me forcei a segurar o choro, mesmo sendo uma dor constante o jeito como a minha mãe me tratou quando contei sobre Sandoval. No entanto, saber que depois de todos esses anos ela ainda me vê da pior forma, me destrói por completo. Somado ao infeliz reencontro com dona Marilena, descobrir que Otávio durante todo esse tempo compactua com ela faz com que eu me sinta um pedaço de lixo.

Tiquinho e Branca ainda estão na chácara. Desconfio que Dom os deixou lá para ficarmos mais à vontade durante esses dias e aproveitar que estamos finalmente juntos. Acontece que é como se estivéssemos bem no meio de um vendaval, sendo impossível vivenciar algo completamente tranquilo. De certa forma, eu me sinto culpada, porque sei que sou o epicentro de toda essa loucura, embora ele não demonstre se incomodar.

— Que tal subir agora para tomar um banho? — pergunta quando deixo de chorar mais um pouco.

Olho para Dom e concordo. Ele me acompanha até o quarto. Entro no banheiro, deixando as minhas roupas pelo chão. Na ducha, choro ainda mais, durante uma hora, praticamente. O buraco que existe no meu peito agora é infinitamente maior. O pior de tudo é que preciso ficar convencendo a mim mesma de que nada disso é minha culpa, pois no fundo sinto que é.

Dom dá leves batidas na porta.

— Posso entrar? — O som abafado da sua voz ressoa pelas pequenas aberturas da soleira.

— Pode... — autorizo, após alguns segundos.

A porta é aberta devagar, ele vem até mim em passos cautelosos. O seu olhar traz um azul cheio de tristeza enquanto avança pelo banheiro até alcançar o box. Por trás do vidro, vela a minha desolação, lamentando por assistir a morte de mais um pedaço da minha alma. A dor da decepção com quem deveria ser o meu maior exemplo, seu porto seguro, a luz dos seus olhos, profana um amor sagrado e puro.

— Eu sei que sugeri um banho, mas desse jeito vai pegar um resfriado — diz ao entrar na área de banho e desligar a ducha.

Para escorrer mais rápido a água acumulada no meu cabelo, torço os fios antes de ser envolvida por Dom em uma toalha. Suas mãos se movimentam rapidamente por meus braços, aquecendo o meu corpo ao sentir a minha pele gélida. Em seguida, me aperta num abraço forte por um breve instante.

— Deveria pelo menos ter deixado a água morna — ele me repreende afetuosamente. — Veste uma roupa enquanto vou preparar um dos chás do estoque de Tiquinho, deve ter algum com efeito calmante. Te espero na cozinha — avisa ao sair.

Ao buscar algo para vestir, me deparo com minhas roupas arrumadas onde deveria estar a mala, que agora foi colocada junto a dele na parte mais alta do closet. Visto um pijama flanelado num rosa suave, penteio os cabelos e sigo para a cozinha com a cabeça pesada. Será que um chá seria capaz de desanuviar a minha mente?

Encontro Dom despejando água quente de um bule de inox numa xícara de vidro. Depois, ele coloca um sachê de chá para soltar as propriedades da erva. Ao dar uma pausa, olha para mim carinhosamente e, com cuidado, empurra a xícara fumegante pela superfície de madeira da mesa até a minha frente.

A VIDA NO MORRO COMEÇA CEDOOnde histórias criam vida. Descubra agora