Com um giro suave, encaixo a chave na fechadura da casa de Dom, trancando-a com cuidado, como se selasse um santuário. Em seguida, guardo a chave em minha bolsa. Sempre que passo por uma dessas portas enormes, imagino São Pedro por trás dela, pelas minhas referências, suspeito que são inspiradas na entrada do céu ou algo do tipo. É, isso é uma bobagem da minha parte, que deve ter raiz no meu preconceito com exageros.
A casa não está totalmente escura. A luz de um poste na rua se soma a de uma luminária de três pernas palitos, com sua cúpula lembrando um abajur comum, clareando a sala. Não sei onde ficam os interruptores, então me arrisco no escuro. Com meu humor atual, eu fico confortável em me espreitar na escuridão.
Após alguns passos, alcanço a escada, ficando mais exausta só de encarar os degraus à minha frente. Apesar dos momentos com Dom, o dia foi longo, cansativo e no fim perturbador. É como se eu tivesse vivido tudo em vinte quatro horas — paixão, raiva, sorrisos, lágrimas, coragem, medo —, um turbilhão de certezas e incertezas.
Comemoro internamente por ser véspera de um feriado municipal prolongado, não é do meu feitio ficar feliz com essas folgas exageradas, é que preciso realmente de um tempo. Esses dias, longe de tudo, serão perfeitos para acalmar os ânimos, principalmente com Otávio, quer dizer, não tanto porque ainda será publicada a entrevista no Diário de Belo Rio.
Eu me arrasto com esforço até o primeiro andar. Mesmo cansada, não tiro os saltos, evitando ser pega por Dom com os sapatos na mão. Tudo o que eu quero é que ele me ache bonita. Pode parecer bobagem, mas quando seus olhos azuis me admiram, os meus problemas simplesmente somem.
O resultado da noite deveria ter me deixado bem, afinal, Otávio não conseguiu me dobrar como queria, enquanto ganhei respaldo público com a ideia de usar um colunista de fofocas. Há pouco, encontrei algum resquício de força dentro de mim, mas essa energia sumiu, como se eu estivesse em uma gangorra de sentimentos e agora fosse a vez de ficar no chão.
Com cuidado, abro a porta devagar para não assustar Branca. O ar condicionado parece ser ajustado para um frigorífico, pois um ar extremamente congelante me envolve assim que adentro o quarto. Procuro a leoa, mas não a encontro em lugar algum. Dom surge na entrada do closet, enxugando os cabelos ruivos, vestindo apenas uma calça de pijama, presa quase no final do caminho da felicidade. Ao me ver, ele para e apoia a toalha envolta do seu pescoço, segurando nas duas pontas. Coloco minha bolsa em um móvel ao meu lado, atenta à atmosfera que se cria entre nós.
Uma memória do nosso tempo no almoxarifado ressurge. Lembro especificamente de quando me falou: "Se eu quisesse, você já estava nua sem eu encostar um dedo num fio de cabelo seu". Naquela época, eu não compreendia o significado por trás disso, mas agora tudo se encaixa. Seu olhar fascinado, percorrendo cada curva do meu corpo, incendeia minha pele com um ardor intenso. Quase ouço os seus pensamentos: " Tira a roupa...".
Minhas mãos ficam inquietas envolta do meu quadril. Essa é a veneração que quero para tornar a noite melhor! Quando estou na presença dele, parece que sou afetada por um desejo constante, incapaz de se esgotar, incapaz de se satisfazer. É tudo tão irracional ou simplesmente puro instinto, mas totalmente real e com tanta força que chega a me deixar tonta.
Dom está imóvel, embora eu o sinta por todo o meu ser. Meus dedos agarram a barra do meu vestido e vejo uma sutil expectativa tomar conta do seu rosto. Dançando lentamente ao som de uma música imaginária, revelo um pouco das minhas pernas ao puxar o tecido para cima, e meu coração fica palpitante. Levo uma mão para a minha coxa e acaricio a parte interna, gostando do meu toque, gostando de como ele se sente provocado.
![](https://img.wattpad.com/cover/329903862-288-k639498.jpg)
VOCÊ ESTÁ LENDO
A VIDA NO MORRO COMEÇA CEDO
RomancePrêmio: 🥈Concurso Cerejeiras em Flor Traumas podem virar sonhos? Dalena e Dominic se conhecem na adolescência, depois que ela foge de casa para dar um fim aos abusos crescentes do seu padrasto, enquanto ele já trabalha para o tráfico. No entanto, a...