VI

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Soraya olhou para baixo e deu de cara com uma galinha atacando sua perna. E doía pra caramba! Ela começou a gritar e correr em círculos para tentar espantar a ave, mas o animal estava irredutível. A loira cogitou chutá-la para longe, mas o bicho era tão rápido e perverso que ela não teve chance de deferir o golpe.

Simone assistia tudo da janela. A justiça realmente tarda, mas não falha, pensou. Ela se escondeu atrás da cortina para rir da situação da loira que corria e gritava desesperadamente para fugir dos ataques do bicho. De certo modo, estavam até parecidos naquele momento: duas criaturas completamente surtadas. A professora então, vendo que aquilo não terminaria tão cedo, engoliu a risada e desceu as escadas para dar um basta na encrenca.

"Bate nela!! Tira essa coisa daqui!!" Ela gritava e corria de um lado para o outro com os saltos afundando na grama.

Simone andava na maior calma do mundo até o portão de madeira ao lado da casa que levava ao jardim dos fundos. Ela vagarosamente começou a esfarelar o pedaço de pão que estava em suas mãos, jogando as migalhas para dentro e chamando a ave.

"Jair! Pro cercadinho, agora! E nós já conversamos sobre esse seu jeito de receber as pessoas!" A professora advertiu o galo que depois de longos segundos analisando se escolhia as migalhas de pão ou as pernas da visita, se recolheu portão adentro. Certamente cansou-se dos gritos histéricos da mulher.

"Que diabos era aquilo? Desde quando a lei permite a criação de galinhas assassinas?" Soraya reclamou vendo Simone fechar o portão com o trinco para que a ave não saísse novamente.

"Aquele é o Jair, um galo. E ele não gosta muito de gente." Ela explica caminhando para a frente da casa onde as malas estão todas espalhadas pelo gramado. "Isso é tudo seu?" A professora pergunta fazendo a advogada entrar em modo defensivo outra vez.

"Sim, é TUDO meu! Por que todo mundo parece ter um problema com a minha bagagem? Estou de mudança para outro estado, por isso estou levando tudo comigo. Não que isso seja da sua conta." Ela esbraveja com as mãos na cintura.

"Certo. Tanto faz. Seu quarto é no segundo andar. Se vira." Simone perde a paciência voltando para dentro sem fazer nenhum esforço para ajudar a loira com as malas. Não era sua empregada.

"Que ódio." Soraya resmunga consigo mesma inconformada por ter que carregar tudo sozinha. Após quatro viagens ela finalmente respira quando todas as suas coisas se encontram no que parece ser a sala de estar. "Então é isso?" A pergunta sai num tom mais esnobe do que ela planejou.

"Sim, é ISSO! Vou até lhe dar um tour bem rápido." Simone anuncia soltando o ar pelo nariz, já estava exausta da loira. "Aqui embaixo ficam as salas de aulas, mas também uso os jardins para atividades ao ar livre. Tem um banheiro aqui embaixo, mas você pode usar o do segundo andar, se preferir." Ela explica abrindo as portas dos ambientes ao citá-los. "Aqui é o escritório onde vai trabalhar. Os livros que uso com as crianças também ficam guardados aqui junto com os itens de papelaria que você pode precisar, o notebook e o telefone. Se precisar de mais alguma coisa me avisa que eu peço para a Duda trazer. Alguma pergunta?" A morena finaliza, já esperando uma retórica metida a besta da advogada.

"Sim, quantas secretárias você tem?" E ali estava. Arrogante, esnobe, presunçosa! Simone pensava enquanto Soraya olhava ao redor procurando uma mesa de recepção, onde pelo menos uma secretária deveria estar.

"Eu não tenho secretárias, nem no plural e muito menos no singular, doutora. Estamos em uma escola infantil quase que comunitária, temos uma voluntária que me ajuda com as crianças e me substitui quando necessário, e os familiares dos alunos que gostam de participar dos projetos dos filhos."

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