II

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Soraya Thronicke estava furiosa... aliás, furiosa era pouco. A loira estava possessa, rasgando de ódio! Que fim do mundo era esse em que ela foi se meter? E aquela louca com um vira lata sarnento no meio da rua? Belas leis de trânsito são essas aqui onde só os condutores são responsabilizados pela imprudência dos pedestres.

Soraya havia entrado na cidade em busca de um lugar minimamente decente para comer, visto que o único posto de gasolina que ela encontrou por aquelas bandas parecia mais um cenário abandonado de algum filme de velho oeste estadunidense.

Ela havia saído de Campo Grande na noite anterior, levando praticamente seu closet inteiro no porta-malas e uma angústia pungente em seu peito. Havia decidido voltar para São Paulo, mas como era dona de todo o orgulho existente na América do Sul não avisou ninguém de sua família, e pensando bem se tivesse contado as circunstâncias que lhe fizeram voltar, provavelmente iria ouvir poucas e boas de sua mãe.

O que ela não imaginava que poderia acontecer, aconteceu. Algumas semanas atrás, voltando de um dia cansativo na empresa onde trabalhava ela encontrou um apartamento silencioso. Num primeiro momento não achou estranho, afinal havia avisado Henrique que passaria a noite revisando o contrato milionário de algum cliente superpoderoso amigo de seu chefe e ele não precisava esperar por ela acordado. O que ela não esperava era dar de cara com seu marido com o rosto entre as pernas de uma de suas amigas de infância, a que ele dizia ser "como uma irmã" para ele e que ela não deveria se preocupar.

Henrique correu até ela, implorando perdão, dizendo que aquilo não havia significado nada, que foi um deslize, um momento de fraqueza e que ele a amava. Mas de quantos deslizes um casamento é feito? Quantos "momentos de fraqueza" são necessários para invalidar os votos que ele dedicou no altar perante Deus e a família de ambos?

Soraya se perguntava em um devaneio amargo que lhe impediu de se atentar a velocidade permitida naquela via e quando percebeu estava um tanto quanto acima do limite, mas quando ia desacelerar seu celular caiu do suporte e para não se perder e piorar sua situação ela se abaixou para pegá-lo, foi quando tudo aconteceu.

Ela tinha acabado de pegar o celular e verificar se ainda estava na rota estipulada quando viu a louca abaixada no meio da rua com o cachorro e gesticulando para o outro lado da rua como se estivesse falando com uma assombração. Ela tentou buzinar e desviou bruscamente para não a atropelar, atingindo em cheio uma placa. Ao levantar seu olhar ela notou a frente do seu bebê totalmente irremediável, fumaça saindo do capô e de repente um homem estava praticamente arrancando a porta do carro fora.

A loira não acreditava no que estava acontecendo ali. Tudo que parecia importar para eles era aquela maldita placa?

"MEU BEBÊ!" Ela berrou e a mulher louca com o vira lata ainda teve a audácia de tirar sarro dela por chamar o carro de bebê! A doida preocupada com uma placa!

"Quem você pensa que é? Eu sou advogada! Meus pais são advogados e quando eles chegarem aqui você vai se arrepender de colocar as suas mãos em mim, tá me ouvindo? Isso é abuso de autoridade!" Soraya tinha que admitir...foi um pouco arrogante. Não tinha a intenção de falar daquela maneira, queria ser racional, mas o fato de terem se preocupado mais com a droga de uma placa sinceramente a fez perder o juízo.

E foi então que aquilo aconteceu...ele a algemou. Como se ela fosse uma marginal qualquer. Ele não tinha ideia de quem estava lidando! Nenhuma! Assim que colocasse as mãos no seu celular iria ligar para seu pai vir buscá-la e resolver aquilo tudo.

"Onde está o meu celular?" Soraya continuava berrando, mas o policial parecia não se importar com suas perguntas enquanto apontava para o corredor. Aquilo era um orelhão? Achava que estavam extintos, sem mencionar que não fazia a menor ideia de como usar um daqueles, afinal nunca precisou.

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