IV

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Soraya andava para lá e para cá na pequena cela pensando na melhor estratégia para sua defesa. Era impossível negar que ela havia ultrapassado o limite de velocidade permitido, mesmo que alegasse não conhecer a cidade, as placas de trânsito existiam justamente para isso. A advogada decidiu então focar no seu poder de persuasão, usaria seu melhor olhar de filhinha de papai que nunca precisou se virar sozinha na vida e, quem sabe assim, seria capaz de amolecer o coração do juiz para que ele excluísse as qualificações e ela pudesse sair dali apenas com alguns pontos na carteira e uns trocados a menos.

Ao ouvir o policial se aproximando ela arrumou a postura e entrou na personagem de burguesa safada.

"A moça tá pronta?" Seu Vicente pergunta ao abrir a cela e tirar as algemas do bolso. Soraya para e respira fundo quase saindo do papel que acabara de inventar. Sério mesmo? Eles se encaravam esperando qual dos dois iria ceder primeiro. Aparentemente era a advogada, pois com um suspiro cansado ela estendeu os braços para que ele pudesse colocar as algemas em seus punhos.

Soraya até segurou a língua, mas sua expressão denunciava o absoluto ódio que ela sentia enquanto era guiada para fora da delegacia. 

Assim que pisaram na calçada ela cogitou se não era melhor ter ficado na cela mesmo. O sol torrava seu juízo e a roupa que usava colava em sua pele a irritando profundamente, sensação que só piorou quando ela levantou os olhos e notou várias pessoas agrupadas na frente dos postos de comércio existentes ali e todas olhavam para ela. Se sentia em um zoológico, ou pior, num circo! Aquela gente não tinha nada para fazer? Cadê os empregos daquele lugar? Pensou em mandar todo mundo ir trabalhar, mas conteve-se. Uma revolta popular era o que ela menos precisava naquele momento.

No intitulado "fórum", que na verdade parecia mais um pequeno conjunto de salas próximas à delegacia, Seu Vicente pediu para que o guarda do local encaminhasse a loira até o juiz, visto que ele também precisava de uns minutos para se preparar antes de testemunhar.

Soraya, ao chegar na sala onde ocorreria a sessão, tomou uns minutos para observar ao redor. Era uma pequena sala, uma mesa no centro com cadeiras de cada lado separando as partes e na ponta o juiz. A advogada notou a presença daqueles que acordaram com o único objetivo de transformar o seu dia num terrível inferno: o policial, o delegado, a prefeita e a louca do vira-lata. "Bem, pelo menos ela não trouxe o cachorro para a audiência" a loira pensou revirando os olhos ao receber um olhar mortal junto com o levantar da sobrancelha esquerda perfeitamente desenhada da professora.

"Bom, quebrando o protocolo, assim como foi feito com as minhas estimadas férias..." O juiz Garcia proferiu lançando um olhar ameaçador para todos ali presentes. "Vamos dar início a esta audiência."

"Senhorita Thronicke, estou ciente de que a senhorita chegou na cidade trazendo consigo uma onda de caos. Entre as acusações estão: excesso de velocidade, desacato, dano ao patrimônio privado, além de resistência à prisão e tentativa de fuga. Quero ouvir o que a senhorita tem a dizer."

"Doutora." Soraya murmurou, ainda presa no olhar da professora.

"Perdão?"

"Meritíssimo, com todo o respeito, é Dra Soraya Thronicke. Eu sou advogada e sinto muito ter interrompido suas férias certamente merecidas." A loira tentou, puxar o saco sempre funcionava se tratando de velhotes poderosos. "Nunca foi minha intenção causar nenhum tipo de transtorno à cidade."

O juiz, já percebendo as artimanhas da advogada, foi assertivo "Então, doutora, como a senhorita se declara?"

"Sou inocente." Soraya disse levantando o queixo ao perceber que sua declaração foi motivo de cochicho entre as irmãs Tebet.

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