XXV

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Simone Tebet

A professa amada por todos na cidade. Aquela que colecionava elogios em forma de palavras e gestos, que guardava os presentes de seus alunos em vasos sobre a mesa da cozinha ou colados na porta da geladeira, que anotava suas reações nas páginas favoritas de seus livros e não tinha medo de que lessem seus devaneios quando os emprestava, que havia aberto seu coração para o amor mais uma vez, segurando o pequeno pássaro ferido em suas mãos até que estivesse forte o suficiente para voar, que guardou as flores dadas por este mesmo pássaro entre as páginas daqueles mesmos livros, assim como o primeiro bilhete que ela lhe escrevera. 

Para nunca esquecer.

Para sempre lembrar.

Ainda que voasse para longe dali. 

Era essa mesma Simone que contemplava a bagunça em seu escritório pela segunda vez naquele dia, enquanto Soraya procurava em vão através dos arquivos do computador. 

Talvez agora estivesse claro como água o comportamento de Henrique e Marta desde que chegaram ali. 

E a pergunta que sua irmã lhe fizera horas antes voltava às margens de sua consciência:

"Qual delas é a verdadeira Soraya?"

A certeza de antes se confundia diante de seus olhos, vacilava em sua língua a fazendo engolir seco e apertava seu coração. 

Não queria acreditar.

E por não querer acreditar foi que insistiu mais uma vez:

"Tem certeza de que procurou direito?"

"Eu preciso beber alguma coisa, estou enlouquecendo." Disse ela, levando as mãos até a cabeça para massagear as têmporas.

"Soraya, se você imprimiu tem que estar em algum lugar."

"Como assim se? Está feito. O que quer dizer com se?" A loira voltou a atenção para ela com um olhar acusatório.

"Eu não quero dizer nada. Eu disse que se você tem as cópias impressas elas devem estar em algum lugar, não podem ter saído andando por aí."

"Eu tenho, Simone. Estavam na gaveta, estou certa disso. Mas o que me choca é tão ter o registro de nada no meu e-mail e nem no computador."

"Quanto a isso não tenho explicações plausíveis. Eu sempre me enrolo quando é internet."

"Eu juro que estão tentando destruir a sanidade mental que eu mal conquistei de volta, não é possível!" Disse, andando pela sala revirando o que já estava mais do que revirado.

"'Cê precisa ficar calma, nós podemos resolver isso."

"Nós? Nós quem Simone? Você viu a minha mãe? Falou com ela? É capaz de ela fazer um escândalo alegando que sou completamente instável e sair em defesa do Henrique. Não duvido nada que ela testemunhe em favor dele e os dois me internem em um hospital psiquiátrico!" 

"Soraya, estamos em outra época. Você não está sozinha, a minha família pode te ajudar."

"Você não entende!" Ela vociferou.

Era como estar diante da Doutora Soraya Thronicke pela primeira vez. Toda aquela provação novamente. Avançar dois passos e recuar dez.

"O que? O que eu não entendo? O fato de você não aceitar a nossa ajuda é realmente bem difícil de compreender." A morena soltou, cansada de andar em círculos com ela. 

"Não é que eu não queira aceitar! Mas preciso andar com as minhas próprias pernas, poxa! Essa foi a única decisão acertada que tomei em toda a minha vida e agora ele quer me colocar como louca? Forjar uma situação absurda dessas?" 

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