XX

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A estrada de volta para Três Lagoas não era lá aquelas coisas, e Simone não estava errada em dizer ao pai que queria evitar pegá-la ao anoitecer caso chovesse.

Pois foi tiro e queda.

No começo era apenas um chuvisqueiro repentino que não a impediu de seguir a sinalização, entretanto, os pingos foram engrossando cada vez mais e o temporal tornou impossível enxergar um palmo a frente do veículo.

"Encosta, linda. Está perigoso." Soraya pediu, acariciando a perna direita da morena que dessa vez tinha as duas mãos no volante para mantê-lo estável.

"Mas estamos quase chegando."

"Eu sei, mas é melhor não arriscar. Não está dando para ver nada."

"Tudo bem, 'cê tem razão."

Mesmo conhecendo a estrada como a palma de sua mão, a professora encostou a camionete e ligou o pisca alerta. Estando sozinha talvez continuasse até em casa, mas de forma alguma arriscaria a segurança de Soraya. De qualquer maneira, a advogada parecia assustada com a intensidade da chuva.

"Está tudo bem? Tem medo de temporais?" Perguntou assim que pararam em um local seguro.

"Não." Mentiu, mas um trovão estrondoso rompeu o céu no exato momento em que seus olhos encontraram os dela. "Quer dizer, um pouco. Só quando tem muito barulho."

"Entendo. Mas está tudo bem, estou aqui com você."

Como estavam longe da pista, a morena soltou o cinto de segurança e passou para o banco de trás, fazendo sinal para que ela a acompanhasse e se sentasse ao seu lado. No entanto, a advogada não fez questão do espaço pessoal, sentando-se em seu colo e se aconchegando ao seu corpo.

"O que eu posso fazer para te distrair?" Simone perguntou, acariciando os fios loiros.

"Essa pergunta é muito perigosa, professora Tebet..." Brincou, respirando fundo para sentir o perfume dela penetrar seu corpo e a acalmar.

A professora revirou os olhos e sorriu, sabendo que era apenas um flerte inocente e que naquelas condições o melhor era manter as coisas daquele jeito.

"Eu só quero saber por qual motivo ainda não me deu seu número?" Perguntou depois de pensar por alguns segundos em algo que realmente tirasse a atenção da loira da tempestade.

Com todos os eventos e emoções do fim de semana, o detalhe passou totalmente despercebido por ela, que mesmo tendo mantido o mesmo número de celular, não se importou nem em entrar em contato mais uma vez com sua família, adiando ter que ouvir as conversas fúteis e elitistas de sua mãe.

"Não seja por isso." Se ajeitou no colo da morena para pegar o celular dela que estava no console do veículo.

Com toda a liberdade que Simone a concedeu, virou o aparelho para sua face e o desbloqueou, digitando seu número e o entregando para ela em seguida.

"Pronto, agora podemos trocar nudes quando o trabalho estiver muito chato."

"Soraya! Eu trabalho com crianças, 'cê esqueceu?"

"É brincadeira, linda. Além do que eu já vi tudo o que tem para ver aí." Disse convencida, virando-se para sussurrar em seu ouvido. "E se depender de mim verei muitas e muitas vezes mais, a sós."

Simone sentiu os pelinhos em seu braço se arrepiarem com o hálito quente fazendo cócegas em sua orelha e sorriu vendo o novo contato salvo em seu telefone:

"Soraya 🐆"

Passaram bons minutos aconchegadas ouvindo o barulho da chuva, do rádio que tocava baixinho e de algum trovão que ocasionalmente esbraveja no céu, sentindo o calor do corpo uma da outra.

À Sua VistaOnde histórias criam vida. Descubra agora