Rhoars - Os Magiciens

14 - FERAS FERIDAS

Estavam no meio da programação de Mandraquice e Seth não conseguia se concentrar. O primeiro feitiço ensinado pelo wisowl já era conhecido. O mesmo feitiço lançado pelo pai de Ethan para solidificar a corredeira. Mas o conhecimento prévio não facilitou em nada sua conjuração. A ausência de Ethan somada à dificuldade para a execução do feitiço triplicou sua insegurança. Tinha ali em sua frente uma minúscula xícara d'água e por mais que se esforçasse, nada acontecia. Não que a situação ao seu redor fosse muito melhor, mas a maioria ao menos conseguia transformar a água em algo gelatinoso por algum tempo. Nicole, Gwen e Agnella foram as únicas a alcançarem o resultado esperado pelo Sr. Bartholomew Butler. E para completar sua bela manhã, ao ser anunciado o feitiço Solidifier, se complicara com Gwen. Em sua euforia evidenciou se tratar de um feitiço já conhecido por ele. Foi necessário muito esforço para persuadi-la que apenas supôs o que o feitiço faria devido a tradução da palavra francesa. E que o rompante de alegria fora apenas pela programação do dia. Como ela mesma disse, não era impossível, mas era improvável. E agora o encarava sem parar, quase forçando-o a contar tudo com o poder de seu olhar inquisitivo e cheio de desconfiança.

Apesar do desconforto usou toda sua concentração e foco na atividade, mas seu feitiço não surtia efeito. Mesmo com sua pronúncia impecável, a água sequer ondulava. Para piorar, o wisowl Bartholomew emudeceu após explicar uma única vez a tarefa e caminhava por entre os phoenix de braços cruzados e distribuindo olhares perturbadores. Vestia um sobretudo preto e uma camisa branca com gravata por baixo, mas o que o deixava com o ar misterioso era sua cartola inclinada para frente na altura de seus olhos nublados, que eram ao mesmo tempo magnéticos e repulsivos. Seus cabelos muito negros iam até o queixo e tinha um cavanhaque bem delineado. Sua pele era de um branco pálido, daquelas descritas em livros de vampiros. Apesar disso, era muito bonito. Uma espécie de ilusionista arrepiante.

— Aposto que se fosse leite você conseguiria transformar em pó, leite ninho!

Seth não precisou se virar. Reconheceu o apelido detestável e a voz cadenciada e irônica que só podiam ter vindo de uma pessoa. Agnella Coleman.

— Qual é o seu problema com ele, garota? — perguntou Gwen, preparada para iniciar uma briga.

— Com ele? Nenhum. Por que teria problema com alguém tão insignificante?

— Já que ele é tão insignificante, deveria cuidar menos da vida dele, não acha?

Seth não soube dizer se deveria ter se ofendido com a defesa de Gwen, mas entendeu sua boa intenção.

— Acha que estou cuidando da vida dele? Este perdedor não deveria nem estar aqui, não percebe? Como pôde ser resgatado e entrar em Lumière?! Olhe bem para ele! — disse Agnella, enquanto o mirava da cabeça aos pés com repugnância. — Só atrasará nossa turma!

Gwen ficou perplexa. Em seguida sentiu a raiva dominar todo seu corpo. Seu rosto se avermelhou e um leve tremor se iniciou em suas pálpebras. Parecia que a tampa de sua cabeça se abriria e fogos de artifício irromperiam. Estava prestes a gritar sobre a entrada triunfal de Seth em Lumière, mas foi interrompida.

Seth, percebendo a agitação de Gwen, se virou para intervir.

— Thomas Edison[24] era um estudante problemático, Albert Einstein[25] era fraco em história e geografia, Benjamin Franklin[26] sequer fez o ensino médio e Bill Gates[27] renunciou Harvard.

Agnella riu. Ou melhor, gargalhou.

— Você está mesmo se comparando a estes mitos, leite ninho? — perguntou Agnella, que mal conseguia falar de tanto rir.