Capítulo 20

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SEXTA-FEIRA — 14:08

Meu horário de almoço chega, e a primeira coisa que eu faço é ir até o vestiário. Dessa vez, havia trazido marmita de casa; não queria comer fora. Na vasilha que se dividia em quatro partes, havia arroz branco, batata frita, salada e macarrão. Dona Heloisa me acostumou tanto a comer feijão quando era mais nova que enjoei quando me tornei adulta.

Depois do almoço, decidi descansar mais um pouco. Estava sentada em uma das mesas no bar, mais precisamente na que ficava bem no canto, longe de tudo. Enquanto descanso meu almoço, pego o celular e rolo o feed do Instagram, mas logo enjoo e saio do mesmo, desligando o celular em seguida.

A porta do bar se abre, e quem passa por ela é Thomas. Tento ficar quieta, com o objetivo de não chamar atenção. Jamais arriscaria que ele me enxergasse, mas percebo que era tarde demais para isso quando ouço passos vindo em minha direção.

Ele arrasta uma das cadeiras a deixando perto da minha e se senta na mesma. Meu coração acelera; sabia que o que viria a seguir não seria bom...

— Podemos conversar? — pergunta com firmeza.

— Não tenho nada pra falar com você — digo seco.

— Ah, não? Sério? Acho que você está certa, mas eu queria ter sido avisado antes de você me usar — debocha.

— Te usar? Te usar? — pergunto em descontentamento — foi você quem agiu como se eu não significasse nada pra você quando resolveu sair com outra pessoa — solto um riso de raiva.

— Não, diz a verdade. Eu quero ouvir você dizer pra mim que aquela noite não significou nada.

Respiro fundo e decido sair dali. Não queria ter aquela conversa em um local de trabalho. Depois de me levantar, peço a ele que me siga, e ele obedece. Do lado de fora da rua, em um lugar mais vazio, volto a conversar com ele.

— Como você pode ser tão hipócrita? Foi você quem fez questão de deixar isso claro quando estava com aquela mulher, Thom.

— Quê? — faz uma expressão confusa no rosto — Que merda você está falando?

— Eu vi, THOMAS. Não adianta mentir. Sabe qual é a verdade? Eu nunca deveria ter confiado em você. Aquela noite não deveria existir — tento voltar para o bar indo em direção ao mesmo, mas, ele me puxa.

— Mas, que porra você está falando, caralho?

— Idiota, me solta, me deixa sair daqui, Miller — peço aflita, e ele me encosta na parede.

— Não, fala pra mim, que caralho você viu que te deixou assim? Eu não fiz nada com ninguém. Qual o sentido de tudo isso?

— Era de tarde, fiz planos de chamar você pra almoçar comigo no restaurante que nos conhecemos, e foi quando te vi lá... abraçando uma mulher, vestido preto e cabelos loiros. Satisfeito?

— Naomi Clark, por favor, não me diga que tudo isso foi por causa disso? Não, não pode ser verdade... Você só pode ser doida, aquela é minha irmã!

— Sua irmã? Aham, conta outra, Thomas, só me deixa... me deixa ir — imploro.

— Não, quer que eu prove? — pega o celular e abre uma foto da mulher.

— Não, não quero ver essa porcaria — desvio o olhar da tela me sentindo enojada.

— Essa foi a mulher que você viu — mostra a tela do celular novamente, mas, viro o rosto. Ele então pega cuidadosamente em meu queixo e vira o meu rosto para olhar.

— É, se quer saber... foi ela — confirmo.

Sabia que algo estava por vir, mas o que eu não sabia era que dessa vez não seria ninguém que estaria me magoando, e sim eu que estaria magoando alguém. Nas fotos, toda a família dele estava reunida, enquanto a mãe se parecia perfeitamente com a irmã, o pai tinha a semelhança pura dele.

Minha ficha estava caindo dolorosamente pelo meu erro.

Thomas guarda seu celular, e eu tento dizer algo, mas estava tão impactada pensando em toda a ignorância e drama que havia feito que mal conseguia pensar em uma só palavra.

— Sabe o que me deixa puto? De verdade? É que você não se importou com o outro lado, não se importou comigo.

— Eu estava machucada — digo baixinho.

— Você tinha que ter a porra da maturidade, deveria ter me chamado pra conversar, mesmo se fosse realmente algum lance, o que estaria fora de cogitação — diz com raiva, e eu engulo seco.

— Se fosse algum lance, jamais iria querer ver sua cara de novo, Thom — solto um riso cruzando os braços.

— Você podia querer me queimar vivo, mas o certo ainda seria a comunicação, Clark — solta um suspiro.

— Olha só, só... me desculpa, tá..., mas, você tem que entender que eu também me machuquei, eu desabei...

— E eu não? Acha que não me machuquei tentando entender o que tinha feito pra você? Acha que não me machuquei sendo tratado como um lixo por causa de um drama que você criou em sua cabeça? Acha que não dói em mim? Ou você é egoísta o suficiente pra achar que só dói em você?!

E ele estava certo, o que contribuía para minha dor.

— Eu sei que eu errei, errei muito, não precisa jogar na minha cara — digo alto, e ele balança a cabeça em negação.

— Sabe o que mais me machucou? Fiquei igual um idiota atrás de você... me torturei revendo todos os nossos momentos tentando achar um erro meu, e eu preferia... preferia que tivesse sido eu quem tivesse feito merda..., mas, esse foi o pior... eu não fiz nada... absolutamente nada, e você só... me desprezou.

— Thom — digo baixinho, sentindo sua dor.

— Nunca derramei uma lágrima sequer por ninguém... até ouvir você dizer na ligação que não queria mais me ver.

Eu estava errada até a última tala de fósforo, e mesmo... com a caixa junto, mas ouvi ele se expressar sobre o quanto sofreu me doeu mais ainda. Percebi que não só havia agido imaturamente como também havia partido o coração de alguém, de alguém que me apaixonei e que também se apaixonou por mim.

Queria consolá-lo, mas como faria isso? Como faria isso sendo eu a quem partira seu coração?

Me aproximo e seguro sua mão delicadamente. Ele não reage, nem sequer diz nada...

— Vamos consertar isso... juntos — peço.

Ele mais uma vez balança a cabeça em negação e retira sua mão da minha, o que acabou de quebrar meu coração. Mas que razão eu também tinha para reclamar? Eu o machuquei, e como machuquei... nossas diferenças são nítidas. Enquanto me feri com meus próprios achismos, ele se feriu pela minha espada.

— Eu preciso de um tempo!

— Um tempo?

— Preciso ficar sozinho.

— Tudo bem, eu entendo — digo com a voz embargada pelo nó na garganta que começa a surgir.

Uma lágrima escapa de um dos meus olhos quando vejo ele sair indo embora. Deixo as outras que torciam para sair rolarem pelo meu rosto. Tudo o que eu mais queria era me isolar e pensar em tudo, mas também tudo o que eu mais queria era abraçá-lo, beijá-lo... o olhar nos olhos.

Limpo meu rosto e volto para o bar. Quando chego ao vestiário, pego o celular do bolso e desbloqueio seu número, torcia para que ele pudesse me ligar e aparecer nos próximos dias, porque a ideia de ter estragado algo que se tornou bom doía mais do que tudo.

Não queria nem sequer imaginar que o tempo que ele pediu podia significar que tudo o que tínhamos, que nem sequer era um relacionamento, havia chegado ao fim. Querendo ou não, já havia criado um vínculo com ele, e não suportava mais sentir a falta dele com suas esquisitices e seu jeito apaixonado e amoroso. 

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