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CHONG SEO-YUN

    Demoro uns vinte minutos para conseguir cobrir os machucados do meu rosto com base e pó. Resmungando palavrões, prendo os cabelos em um rabo de cavalo. Foi a primeira e única vez que Eun-Woo encostou a mão em mim.

    Aquele canalha desgraçado vai comer o pão que o diabo amassou se resolver me tocar de novo.

    Pego os livros em cima da estante e coloco dentro da mochila. Caminho até o hall de entrada do miniapartamento e calço os tênis. Antes que possa me levantar, a companhia toca. Abro a porta sem olhar no olho mágico e me arrependo no segundo em que encontro o diabo do outro lado.

    Ele sorri e ergue o cachorro pequeno que está segurando. É um Lulu da Pomerânia de cor caramelo. Acho que é uma menina, pois tem um lacinho rosa na orelha e coleira vermelha.

    Trouxe pra você — ele fala como se não fosse um grande absurdo aparecer na minha porta com um filhote de cachorro depois de ter me batido na noite passada. — Meu pedido de desculpa. — Eun-Woo tenta me entregar o cachorro, mas eu não aceito.

    Quando comecei a namorá-lo, ele era um cara legal. Atencioso, sempre disposto a me fazer sorrir ou cuidar de mim. Um sonho, que logo se tornou pesadelo. A máscara de menino bom durou apenas oito meses, depois disso, Eun-Woo começou a ficar com ciúmes e desconfiado até da minha sombra.

    O sentimento logo se estendeu aos meus amigos da faculdade e aos poucos, foi se tornando agressivo com as palavras. Me xingava e levantava a mão para mim, mas nunca ousou me bater de verdade.

    Mas ontem, Eun-Woo me agrediu quando eu disse que não aguentava mais manter um relacionamento com ele e por isso, estava dando um fim a nós. O cara ficou enfurecido com a minha audácia de querer romper o nosso namoro e me acertou vários tapas no rosto, e apertou meu braço tão forte, que estou com as marcas dos dedos imundos dele na pele.

    Enfia essa desculpa no rabo — retruco, me sentindo mal. O cachorrinho é fofo e não merece ser tratado assim, mas não vou voltar com esse cara nem por um milhão de dólares canadenses.

    Seo, me escuta — fala quando nota que estou prestes a fechar a porta na cara dele. Que droga, vou me atrasar para minha aula por causa desse imbecil. — Ontem, eu extrapolei. Não vai acontecer de novo.

    Sorrio e fecho os olhos com força por uma fração de segundos. Vai acontecer sim e se aceitá-lo de novo na minha vida, vai ser mil vezes pior. E eu não vim estudar em Seul para ter uma vida como a da minha mãe.

    Isso não vai acontecer comigo.

    Vai embora, não quero olhar pra sua cara — digo, encarando aqueles olhos azuis, frios e sem vida. Ele está a um triz de explodir comigo e embora esteja com um pouco de medo, me mantenho firme. Não vou baixar a guarda.

    Porra — Eun-Woo xinga e contrai o maxilar. — Eu tô arrependido. Você não consegue ver isso? — pergunta, quase gritando.

    Uma bela forma de se mostrar arrependimento... gritando comigo — murmuro, mais para mim do que para ele. — Tenho aula e não quero me atrasar. E nós não temos mais nada o que conversar.

    Eu te amo — retruca ao colocar a mão na porta, me impedindo de fechá-la. — Te amo tanto, acho que não consigo viver sem você.

    Vai ter que aprender — resmungo.

    Noto as narinas de Eun-Woo inflarem e a mandíbula contrair mais uma vez. E eu me pergunto como gostei de alguém como ele. A pessoa com quem eu comecei a namorar e o homem à minha frente são completamente diferentes.

    Você não sente mais nada por mim? — quer saber.

    Engulo o nó na garganta.

    Claro que no começo eu amei Eun-Woo. Não fazia nem dez meses que tinha saído de Busan para vir para cá por causa da bolsa de estudos. Eu ainda morava no dormitório dentro do campus, não tinha muitos amigos e um cara de olhos azuis com sorriso fácil me fez sentir bem, segura. Meu coração abriu as portas para ele e eu me apaixonei.

    E infelizmente, mesmo depois de perceber a verdadeira face de Eun-Woo, eu ainda fiquei com ele, aguentando, indo contra todos os meus instintos que diziam para deixá-lo. E foi assim que o amor que eu sentia foi mudando e se tornando outra coisa, raiva e medo. No entanto, ele ter me batido ontem, estalou algo dentro de mim.

    A relação dos meus pais está bem longe de ser perfeita. Pelo que sei, meu pai bateu pelo menos três vezes na minha mãe, e só de pensar nisso, eu fico furiosa. Mas a mamãe nunca fez nada. Ela o ama e não tem coragem de deixá-lo. Então, aceita as migalhas do amor sujo que ele dá.

    O relacionamento deles foi o pivô por eu ter saído de casa quando fiquei maior de idade. Nenhum dos dois concordou com a minha decisão e meu pai, bem, ele prometeu me deserdar e acho que talvez faça isso mesmo. Mas eu estou aqui, tão longe de casa, tentando me estabelecer, ser bem-sucedida financeiramente para poder tirar minha mãe das garras do meu pai.

    Vou fazer isso nem que seja preciso sequestrá-la.

    Por isso, não posso aceitar o que Eun-Woo tem a me oferecer. Eu não mereço viver num relacionamento tão tóxico. Eu não preciso suportar o ciúme dele e perdoá-lo todas as vezes que se exaltar comigo.

    Não é assim que um relacionamento funciona.

    Tchau, Eun-Woo — é o que digo ao fechar a porta na cara dele. Tranco e encosto a cabeça no material de madeira frio. O coração dá um salto no peito quando ele começa a dar chutes e gritar para que eu abra e o deixe entrar.

    Até ele desistir e ir embora, fico nessa tortura por mais de dez minutos. Destranco e abro a porta, apenas um pouco e tomo um susto quando a cadela começa a latir para mim. Rápido, fecho de novo, mas nada acontece. Decido abrir tudo e encaro a bola de pelo do lado de fora do meu apartamento. Com passinhos pequenos, ela vem até a soleira e late para mim.

    Sorrio. Ela é fofa.

    Agacho-me e assobio, chamado por ela. Sem resistência, vem até mim e eu faço carinho em cima da cabeça cheia de pelos sedosos. Quando estou confiante para pegar a cachorra nos braços, confiro se é mesmo menina.

    O que vou fazer com você, garota? — pergunto e ela late, em resposta.

    Coloco-a dentro do apartamento e tranco a porta de novo. Sem saber muito bem o que fazer, pego um prato de dentro do armário e o frango cozido da geladeira. Coloco o prato no chão e ela come tudo. Acho que estava morrendo de fome.

    Não vou voltar com Eun-Woo, mas não posso deixar a cachorrinha desamparada.

    O que aquele idiota tinha na cabeça para aparecer na minha porta com uma cachorra de raça?

    Preciso ir — falo, e ela só olha para mim depois de comer. — Você quer água? — Sem esperar por respostas, procuro um pote e encho de água da torneira. A bola de pelo parece estar morrendo de sede também. — Garota, preciso ir. Já estou atrasada pra minha primeira aula e hoje eu trabalho. Só vou voltar no começo da noite, tudo bem? Não faça xixi no sofá, por favor.

    Inclino-me um pouco para alisar a cabeça da minha nova companheira, e antes de sair, acabo colocando mais frango no prato. Não faço a mínima ideia de como vou viver com uma cachorra, mas talvez não seja ruim ter companhia.

O homem da máfia - Jeon Jungkook e Chong Seo-YunOnde histórias criam vida. Descubra agora