Capítulo 14

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O pai da Ju não tinha previsão de alta.
Todos os dias eu fazia uma visita ao seu quarto e ficava a conversar com ele e com Matias.

- Quando me vai dar alta doutor?

- Quando o cardiologista indicar.  Ainda  tem alguns exames a fazer. E não se esqueça que deverá ser visto pelo menos daqui a 6 meses.

- Matias! Providencie para que alguém se lembre. Talvez quando a filha do senhor regressar possa ter isso em atenção.

- Concerteza doutor. A menina Juliette é muito responsável.

As obras de restauro da minha casa estavam avançadas. Faltava apenas a àrea externa e limpar a piscina.
Os jardineiros prometeram acabar em dois dias.
Em dois dias faríamos a mudança e quando a minha Ju chegasse era lá que eu a receberia.

Mas o destino às vezes prega-nos partidas.

O pai da Ju teve alta na véspera da sua chegada.

O Matias veio buscá-lo e eu recomendei que alguém se responsabilizasse pela toma correcta da medicação.

- Pode deixar doutor.  A minha esposa agora trabalha lá em casa e  vai encarregar-se de tudo.

Hoje chegava a delegação da missão  a Angola.
Questionei sobre o facto de terem pedido uma ambulância à chegada ao aeroporto.

- Quem vem doente?

- Não sabemos, mas vem uma pessoa em estado grave. Pode nem ser da delegação.  É possível que seja um natural que precisasse de vir receber assistência médica aqui.

Tinha terminado o meu plantão mas fiquei aguardando a chegada da Ju. Estava acordado que todos os elementos vinham directamente ao hospital para realizar exames de despistagem de doenças.

Vi a ambulância chegar e a agitação por parte das equipas que estavam todos com fatos anticontágio incluindo os que vinham de Angola.

Procurei a Ju naqueles rostos todos e não a vi.
Uma maca foi tirada da ambulância e pela figura em temi o pior. A minha Ju.  Fui em direcção ao local mas não me deixavam passar.

Procurei saber e ninguém dizia nada.

- Ninguém sabe. É preciso exames.
Pode ser contagioso, era só o que diziam.

Um dos médicos da delegação,  meu amigo, falou de longe.

- É a voluntária Juliette de Bragança.  Pode ser paludismo ou malária.

Fiquei desesperado.   Entraram todos pela mesma porta que se fechou imediatamente.
Só seriam liberados após sair o resultado das análises.

As horas passavam e nada.  Nenhuma informação.  Na recepção eu andava de um lado para o outro.

- Doutor! Vá tomar um café, uma àgua.   Estas coisas demoram.  Deixe o seu telefone que quando houver notícias eu ligo.

Segui o conselho e aproveitei para ligar à minha mãe para não se preocupar que eu tinha substituído um colega e talvez ficasse no hospital.

Liguei ao Matias e expliquei a situação  mas para não dizer nada ao pai por conta da saúde frágil.

Liguei à Clara para alertar a mãe, mas, que ninguém viesse ao hospital que não a conseguiam ver. Eu daria notícias.

Por fim liga a recepcionista

- Dr. Rodolffo! Está aqui o Dr. Sérgio com novidades.

Corri para lá.  Cheguei ofegante, sinal de que preciso de academia.

- Sérgio! Conta tudo.

- Amigo! Estávamos todos bem felizmente mas na última noite a Juliette desenvolveu uma febre altíssima que não baixava por nada. Nem antipiréticos  nem banho frio. Nada faz baixar a febre.   No avião veio a soro e agora está a fazer exames.

- Qual achas que é o diagnóstico?

- Eu penso em paludismo.  Mas ainda que te pergunte.  Qual a vossa relação?

- É minha namorada.

- Lamento, amigo.  Mas tudo  vai ficar bem.  Todos os outros elementos da missão fizeram os testes e estão negativos.

- Eu quero estar com ela.

- Deixa terminar os testes.  Eu vou lá ver.

O Sérgio voltou ao fim de meia hora.

- Já está no quarto mas tens que te equipar para estares lá com ela. Vem.

O Sérgio levou-me. Vesti o fato, máscara,  botas e luvas e entrei no quarto.

Doeu-me o coração ao vê-la ali, pálida, ligada a vários aparelhos, tomando soro.  Soltei uma lágrima e fiz-lhe um carinho.

A febre tinha baixado um pouco.  Confirmava-se o diagnóstico de paludismo.

Puxei uma poltrona para a sua cabeceira e fiquei ali a velar-lhe o sono.

Uma enfermeira mais tarde trouxe uma cama extra pois o quarto era enorme e cabiam duas camas mas eu não consegui dormir.

De madrugada veio um colega verificar a situação. Estava tudo igual.  Conversámos um pouco sobre a doença da qual eu tinha pouca informação.

O resto da noite pesquisei tudo o que encontrei sobre paludismo.  Causas, efeitos, sintomas,  tratamento,  e consequências.
Foi pesquisar a taxa de mortalidade e fiquei muito aflito e preocupado.

Deus não pode querer que eu passe por isso. Nem eu nem ela merecemos.





Da àgua pró lixoOnde histórias criam vida. Descubra agora