Capítulo 10

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FEYRE


Com o capuz na cabeça, dedos dentro dos bolsos revestidos de pele do manto, fiquei de pé diante das portas duplas da casa, ouvindo o som nítido da campainha que puxará um segundo antes.

Atrás de mim, escondidos pelos encantamentos de Rhys, meus três companheiros esperavam, invisíveis.

Eu disse a eles que seria melhor se eu falasse com minha família primeiro. Sozinha.

Estremeci, desejando o inverno moderado de Velaris, imaginando como podia ser tão temperado no extremo norte, mas... tudo em Prythian era estranho. Talvez quando a muralha não existia, quando a magia fluía livremente entre os reinos, as diferenças entre as estações não fossem tão grandes.

A porta se abriu, e uma governanta de rosto alegre e rechonchudo — Sra. Laurent, lembrei — semicerrou os olhos para mim.

— Posso ajudar... — As palavras se dissiparam quando ela reparou em meu rosto.

Com o capuz, minhas orelhas e a coroa estavam escondidas, mas aquele brilho, aquela quietude sobrenatural... A Sra. Laurent não abriu a porta mais um pouco.

— Estou aqui para ver minha família — disparei.

— Seu... seu pai está fora a negócios, mas suas irmãs... — Ela não se moveu.

Ela sabia. Podia ver que havia algo diferente, algo distorcido…

Os olhos da Sra. Laurent olharam ao meu redor. Nada de carruagem, nenhum cavalo.

Nenhuma pegada na neve.

O rosto da governanta ficou lívido, e me xinguei por não ter pensado nisso…

— Sra. Laurent?

Algo em meu peito se partiu ao ouvir a voz de Elain no corredor atrás da mulher.

Ao ouvir a meiguice e a juventude e a bondade, intocada por Prythian, alheia ao que eu tinha feito, o que me tornara…

Recuei um passo. Não podia fazer aquilo. Não podia jogar aquilo sobre elas.

Então, o rosto de Elain surgiu por cima do ombro redondo da Sra. Laurent.

Linda... ela sempre foi a mais linda de nós. Suave e encantadora, como um crepúsculo de verão.

Elain estava exatamente como eu me lembrava, do modo como eu me obrigava a lembrar naqueles calabouços, quando disse a mim mesma que, se fracassasse, se Amarantha atravessasse a muralha, ela seria a próxima. Assim como seria a próxima se o rei de Hybern destruísse a muralha, se eu não conseguisse o Livro dos Sopros.

Os cabelos louro-dourados de Elain estavam presos pela metade, a pele pálida parecia lisa e levemente corada, e os olhos, como chocolate derretido, se arregalaram quando me viram.

Eles se encheram de lágrimas que silenciosamente transbordaram, escorrendo por aquelas lindas bochechas.

A Sra. Laurent não se moveu um centímetro. Ela fecharia a porta na minha cara assim que eu sequer respirasse errado.

Elain levou a mão fina à boca quando o corpo estremeceu com um soluço.

— Elain — falei, a voz rouca.

Passos nas escadas espiraladas atrás delas, então…

— Sra. Laurent, prepare um chá e leve-o ao escritório.

A governanta olhou para as escadas, depois, para Elain, e, então, para mim.

Um fantasma na neve.

A mulher simplesmente me lançou um olhar que prometia a morte caso eu ferisse minhas irmãs, e depois se virou para a casa e me deixou diante de Elain, que ainda chorava baixinho.

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