Felicidade, um conto de amor

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FELICIDADE. UM CONTO DE AMOR

Sempre fui muito tímida.

Enquanto minhas amigas de escola transavam com uma naturalidade a toda prova, eu não o conseguia. Não deixava nenhum amasso passar dos beijos.

Eu era bonita, cabelos castanhos cacheados bem soltos e olhos esverdeados. Não havia problema para os garotos me paquerarem.

Tive alguns namoricos, mas nada sério. Lembro-me de Carlos, um dos mais bonitos da escola, e dos mais pacientes também. Fomos duas vezes ao drive-in, e ficamos juntos no baile de inverno, trocando beijos. Mas foi só. A timidez me impedia.

A semana passada, decidi fazer uma viagem de férias. Afinal estou com 27 anos, solteira, sem namorado e, como diz Sara, minha melhor amiga, invicta. Isso mesmo. Ainda sou virgem.

O chacoalhar do trem começa a me dar sono, mas a paisagem é tão bonita, que forço os meus olhos a permanecerem abertos.

Estou percorrendo o Canadá em uma deslumbrante viagem ferroviária. Como sempre estou só. Mas já me acostumei.

O vagão é um luxo. Gastei um pouco mais do que pretendia, porém primeira classe é tudo de bom.

Algumas pessoas circulam pelo corredor. Na penúltima parada, subiu um cara de roupas esportivas, própria para esportes de inverno. Que dó, vai ferver aqui dentro. O ar condicionado funciona muito bem.

Claro que não pude deixar de reparar seu belo rosto, mesmo com a barba a fazer.

Ele sentou três bancos atrás do meu. Quem sabe sonharei com ele.

Ao chegarmos à próxima parada, vem o informe de que ficaremos retidos, nas quatro horas seguintes. Deslizamentos de neve obstruíram a linha férrea.

O chefe do trem, um senhor baixo e com uma linda expressão de vovô, passa informando que um lanche será disponibilizado no café da estação. A maioria se dirige para lá, inclusive o belo rapaz. Fiquei olhando-o. Acho que ele notou.

Após um tempo decidi descer.

A temperatura estava baixa. Uma fina nevasca empasta a paisagem. Sinto muito frio.

Como do nada, ele aproximou-se, com um casaco aberto nas mãos.

- Can I help you? (Posso ajudá-la)?

Eu o encaro pasma.

- Como? Ah, desculpe. Oh. Sorry. I'm confused (Desculpe-me. Estou confusa).

- Que bela surpresa. Você é brasileira?

Espantada, quase gaguejando, respondi:

- Sou. Nascida em Florianópolis, Santa Catarina. E você, de onde é?

- Eu sou canadense mesmo, de Toronto.

- Canadense? Mas você fala tão bem o português.

- Aprendi com meus pais. Antes de imigrarem para o Canadá, moravam em Curitiba. Mas vamos para dentro do salão. Você está tremendo.

Ele envolveu-me com o grosso casaco. Para uma pessoa tímida eu até que estava me saindo bem.

Sentamos numa mesa no fundo, onde um bule de porcelana florida expele espirais de fumaça. Um convidativo cheiro de leite com achocolatado, fez minha boca encher d'água. Ele deve ter percebido, pois sorriu.

- Deixa que eu lhe sirva. Você quer com açúcar ou adoçante?

- Açúcar. Eu detesto o sabor residual que a sacarina deixa.

Luiz Amato e ConvidadosOnde histórias criam vida. Descubra agora