QUARENTA E SEIS

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        Xiao Zhan


Não faço a mínima ideia de onde estamos.
Só sei que Ava dirigiu até a região portuária, pois vi algumas placas e containers.
Do nada, entramos num galpão desativado, a dizer pela sujeira e vidros quebrados, então tudo ficou louco.
Fomos recebidos por quatro caras, que parecem tão desequilibrados quanto Paula.
São assustadores e nos olham como se fôssemos a próxima refeição.
Deus nos ajude.

Minhas mãos estão amarradas nas costas e uma fita adesiva me impede de gritar.
Paula e seus amigos estão conversando um pouco afastados, mas não consigo ouvir nada que não seja as batidas do meu próprio coração.
Parece que vai sair do peito.
Respire, Xiao Zhan.
Uma coisa é certa, ela está agitada. Algo está para acontecer e ao mesmo tempo que quero saber, tenho medo das respostas que encontrarei.

Yibo disse que ela e Pain estão juntos com La Muerte neste esquema,  o que significa o seu envolvimento direto com os assassinatos.
O que não sai da minha cabeça é o que os levou a agir de forma tão precipitada.
Por que nos sequestrar? Não faz sentido.
Há várias peças faltando neste quebra-cabeça.
Tento prestar atenção em tudo ao redor, onde há saídas, se há algo que possa fazer para escapar, mas a realidade é só uma: estou ferrado.
Só me resta ganhar tempo para que ele venha atrás de mim. Tenho certeza de que ele virá...
Nada de pânico.
Ava, ao meu lado, chora inconsolável, o corpo tremendo de nervoso, o que só chama a atenção dos putos e da Paula.
Fico tenso quando vejo que seus olhares estão em nós.
Merda.
Aproxima-se, nos medindo com um sorriso doentio.
Ainda não posso acreditar que ela é parte disso.
Chata, Ok. Psicopata e criminosa, nunca imaginei.
— Não fui com sua cara, novato... desde que te vi chegando com mestre W — diz, me medindo. — Parece que eu estava certa no final do dia, já que você estava ali para foder com o esquema, e grudar no mestre, como um carrapato. Com você a tiracolo, ele ignorou os outros estagiários.

— Quer dizer, você — grito, mas a fita abafa o som.
— O quê? Não consigo te ouvir, querido — debocha, colocando a mão no ouvido. — Devia deixar os quatro ali se divertirem com você, mas ele falou que você é dele. Está tão fodido — diz, rindo como uma louca.
Acena para os caras que partem para cima de Ava e começam a arrancar sua roupa. Ela grita, desesperada, tentando se esquivar, em vão.
Grito alto, a garganta queima, mas não sou ouvido. Não consigo ajudar, fecho os olhos e choro ouvindo as súplicas dela, enquanto eles riem e se revezam batendo e a estuprando.
Senhor, mande ajuda...
Quando terminam, cospem no seu corpo. Bile sobe na minha boca e tremo de raiva.
Somos arrastados e jogados num banheiro sujo, o local fede à urina.
Divertem-se nos chutando e então saem rindo.
Dor irradia pelo meu peito. É difícil respirar.
Eles já foram...
Inspire... Expire...
Ava chora ao meu lado toda encolhida, o rosto inchado e sangrando.
Deus, como puderam?
Como podem existir pessoas tão monstruosas?
Com dificuldade, me arrasto para próximo dela e quando estou quase perto, dor atravessa a minha coxa.
— Ahhh — grito e lágrimas escorrem pelo meu rosto.
Puta merda!
Olho para o local da pontada e um pedaço de vidro de uns quatro centímetros está cravado na minha coxa.
Respire, Zhan.
Não tenho muitas opções aqui.
Tento manter a perna um pouco erguida, para que o caco não entre ainda mais.
Queima como o diabo, mas respiro fundo, e continuo me arrastando em sua direção.
Estou quase lá.

Vejo outro fragmento e, com muita dificuldade, consigo agarrá-lo com a mão direita.
É pequeno e não consigo raspá-lo na corda em volta dos meus pulsos.
Nos filmes, parece algo fácil, mas não quando você tem apenas um pedaço de pouco mais de 2 cm que mal consegue segurar.
Gemo de dor e frustração, mas finalmente consigo chegar perto de Ava.
Não posso tirar seu sofrimento, mas posso estar aqui ao seu lado e tentar... sobreviver.
Fecho os olhos e rezo.

Minha vida passa diante dos meus olhos e peço perdão...
Por algum tempo, eu pensei que não havia nada mais para mim neste mundo, já que Deus tinha levado tudo que importava embora.
Eu só queria que a dor parasse.
Mas tive amigos que me ajudaram...
Que me suportaram...

Eu não desisti antes e não vou desistir agora!
Não quando há uma investigação para terminar, criminosos a serem presos, e principalmente quando eu encontrei algo que não achava ser mais possível: um motivo para sorrir.

Não sei há quanto tempo estamos aqui.
Ainda está claro lá fora, o que é bom.
A porta do banheiro abre com um estrondo e Paula entra com um sorriso macabro.
— Ele chegou, putinho.

Um dos caras sai de trás dela e me arrasta para fora pelos cabelos.
Grito de dor, mas sou ignorado.
Tentar resistir é perda de tempo
Sou jogado no centro do galpão e a alguns metros de distância, vejo um homem de terno.
Ele olha para mim com curiosidade, enquanto se aproxima.

— Perdoe os modos dos meus associados, Xiao Zhan — diz num português perfeito.
Oh Deus, não pode ser...

— Prazer, meu nome é Fernando Ferraz Rocha, mais conhecido como Morte.

Puta que pariu!

Ele se aproxima e tento me arrastar para longe dele, o que é inútil.
O cretino parece se divertir com a situação.
— Devo dizer que fiquei admirado quando conseguiu fugir dos meus homens — diz, andando em minha volta.
— Sim, fui eu que os mandei lá.
Você e seu amigo se tornaram um risco.
Fecho os olhos ao ouvir isso.
— Se você não tivesse sido tão intrometido, seu amigo ainda estaria vivo — diz, acariciando meu cabelo. — Quando eu soube que ele andou perguntando sobre o caso no distrito, bloqueei o acesso, mandei o inquérito para o arquivo e fiquei observando, era para ter encerrado ali, mas então, você apareceu no Sanctuary…

A lembrança de YuBin caído no chão me atinge com tudo e lágrimas nublam minha visão.
Não é verdade... a culpa é deles, não minha.
— Sabe, eu não gosto de matar colegas de profissão, chama muita atenção, mas você não nos deixou outra opção.
É isso, vou morrer aqui.

— O plano original era te matar também, admito, mas agora, ele mudou...Você tem que entender que não é nada pessoal. São apenas negócios
— diz, puxando o vidro da minha coxa com tudo.
— Ahhhhhh.
— Cuidem disso! — ordena para os outros caras.
— Não quero que sangre até a morte. Preciso dele vivo, temos um cliente esperando e muito trabalho pela frente.

Cego de dor, sou carregado para uma outra sala, sangue escorre pela minha perna.
Sem muito cuidado, um dos filhos da puta pressiona um pano sujo sobre o corte e passa a fita em volta.
Quando acho que acabou, sou amarrada numa cadeira e um outro homem surge.
Olha para mim, com um olhar vazio e começa a tirar uma série de
equipamentos da sua bolsa.
Agulhas, álcool, luvas....
Oh Deus...

Meu coração acelera enquanto vejo-o colocando sua luva.

— Não, por favor! O que quer que seja — imploro.

Lágrimas escorrem pelo meu rosto.
Despeja um líquido de cheiro forte num pano e estica a mão na minha direção.
Tento me afastar, mas não há escapatória.
— Bons sonhos, garoto!

Então tudo fica escuro.

(.....)

DestemidoOnde histórias criam vida. Descubra agora