| Capítulo 20 |

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— Eu quero saber o que está acontecendo. – Quentin se virou para Sara assim que Dinah deixou a sala. – Sem mentiras.

Sara queria dizer que o pai estava louco, ou imaginando coisas, mas ela sabia que estaria mentindo e não gostava de mentir para os pais. Ela não sabia mentir para eles, muito menos para Quentin, A conexão que eles tinham era muito além de um simples afeto, era como se realmente pudessem ler os pensamentos um do outro.

Essa força que os unia, foi sentida no momento em que seus olhares se cruzaram. Quentin viu em Sara, algo que ninguém mais viu, ele sentiu a dor dela e quis dividi-la com a menina, pois achou que seria mais fácil para ambos.

Já Sara via em Quentin uma luz, uma válvula de escape, como se ele fosse sua tábua de salvação, que a salvaria de toda aquela maldade dentro dela.

Olhando ali, nos olhos castanhos e abatidos do pai, Sara sentiu vontade de se encolher e voltar a ser uma criança. Sentiu vontade de ser inocente, de não ter maldade, de ser uma boa pessoa, porque Quentin não merecia menos que isso. Mas não fez diferença, ela pediu, implorou, e o ódio continuou em seu peito, destruindo aos poucos seu coração.

— Por que você veio ao Brasil?

Ele sabia. Ela podia sentir isso. Sara não fazia ideia de como ele descobriu, mas ele sabia.

— Pai... – Ela suplicou.

Sara não queria que o pai fizesse uma pergunta que ela teria que responder, não quando essa resposta o fizesse se decepcionar com ela.

Mas Quentin estava empenhado em descobrir os verdadeiros motivos da filha.

— Não minta pra mim. – Ele pediu. – Eu encontrei os recortes no seu quarto, venho te observando, filha. Sei que tem algo de errado, vou perguntar pela última vez. O que você...

— Vingança! – Sara gritou, deixando suas lágrimas caírem.

Ela guardou aquilo por muito tempo, foram vinte anos tendo que sofrer sozinha, corroendo aquela noite, guardando tudo dentro de si e lutando para não se sufocar. Ela simplesmente não aguentava mais.

— Sara, minha filha...

— Deixa eu falar. – Sara indicou a cadeira para o pai, e ficou de pé. – Eu passei muito tempo calada, morrendo sozinha. Deixa eu dividir isso com você, por favor. Eu sinto que posso explodir a qualquer momento.

Quentin acenou com a cabeça, dando a Sara a confirmação que ela tanto queria e precisava:

— Eu quero matá-lo. – Ela admitiu, limpando as lágrimas do rosto. – Eu quero que ele sofra, que me implore pela vida. Só pra que eu tenha o prazer de negar. Pai, eu juro que não quero me sentir assim, eu não quero ser uma pessoa ruim.

Quentin permaneceu imóvel, observando a filha, vendo ela se mostrar a ele pela primeira vez na vida.

— Eu só queria poder aproveitar a vida, desfrutar da família que ganhei, e ser uma mulher normal. – Ela se sentou, e segurou a cabeça com as mãos. – Mas não consigo tirar isso de mim. Eu não consigo, não odiá-lo. Me ajuda...

Quentin se levantou de sua cadeira e ajoelhou ao lado da filha, tomando seu rosto entre as mãos, a fazendo encarar seus olhos.

Castanhos nos verdes.

Calmaria e aflição.

A paz e a guerra.

A luz e a escuridão.

A alegria e a tristeza.

A bondade e a maldade.

A calmaria e o caos.

Yin e Yang.

Opostos, que não só se completavam, mas que dependiam um do outro. Quentin precisava da escuridão de Sara para que pudesse ver sentido em sua luz.

E Sara precisava da luz de Quentin, para salvá-la de sua escuridão particular.

—'Me conte o que aconteceu, o que a deixou com tanta raiva. – Pediu com delicadeza. – Me deixa te ajudar, filha.

Ela tentou sorrir, mas falhou miseravelmente.

Ela continuou olhando nos olhos do pai, e abriu o coração.

Ela contou tudo. Desde a morte do pai, ao assassinato da mãe. A aflição de passar três dias ao lado de um cadáver. A sensação de sentir a alma morrer aos poucos, de não poder ver mais beleza nas coisas. As palavras de Damien, a maldade no olhar dele, a prepotência nas palavras. O sofrimento, a angústia, o medo que sentiu antes de encontrá-lo.

Contou o que sentiu ao ver Quentin, e a vontade de chorar quando foi adotada, mas já não havia lágrimas. Ela contou dos sonhos, e de suas conversas com Teddy. Contou o que se lembrava da mãe, das histórias e brincadeiras, e da fantasia de fada, que inocentemente, Sara achou ser mágica.

Contou tudo...

E a cada palavra que saía de sua boca, Sara se sentia mais leve, mais livre. Era como se tivesse tirando um peso das costas, ou só o dividindo com seu pai.

Ela se sentiu aliviada quando Ava descobriu, mas não era nada comparado ao que sentiu ao dividir sua história com Quentin.

Foi algo libertador.

Ela chorou ao se lembrar, e ao ouvir aquela história em sua própria voz.

Doía. Como se estivesse cutucando uma ferida exposta, que estava longe da cura.

Sara sentia o peito apertado, a garganta fechada, os olhos ardendo e a cabeça latejando. E quando achou que já não podia mais chorar, que não tinha mais água em seu corpo, descobriu que não tinha chorado a metade de sua capacidade.

Assim que terminou sua história, Sara olhou para Quentin e foi tomada por um choro ainda mais forte e compulsivo.

Seu corpo balançava com a força dos soluços e as lágrimas pingavam no chão:

— Chora, minha princesa. – Quentin abraçou a filha. – Chora, porque isso não é nenhuma fraqueza.

As lágrimas também estavam presentes no rosto de Quentin, mas ele queria ser forte por ela.

Ele não conseguia imaginar o tamanho do tormento da filha, toda aquela história... Quentin não via como um ser humano, poderia ser capaz de agir com tamanha frieza.

O assassino não tinha destruído somente a infância de Sara, ele destruiu tudo... Absolutamente tudo.

A família, a inocência, a alegria... Ele destruiu a vida dela:

— Quem? – Ele perguntou com a voz embargada. – Quem foi o monstro que te feriu assim?

— Damien. – Sara respondeu, sem conseguir esconder o ódio em sua voz. – Damien Darhk!

Revenge | Avalance VersionOnde histórias criam vida. Descubra agora