Parte 23

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Como era minha folga do hospital, o Sr. Hatake não hesitou em me obrigar a fazer o intensivão de ninjutsu. Apesar de alguns ferimentos ainda demandarem atenção e ele claramente precisar descansar, praticamente engoliu o café da manhã, ansioso com a possibilidade de me massacrar em campo. Parecia se divertir e isso me assustava um pouco.

Reconheci aquela clareira na mata assim que a vi. Estava exatamente igual, como no dia fatídico em que fui reprovada por esse imbecil. Muitas memórias vieram à tona e, de certo modo, fiquei grata à elas, por me lembrarem do porquê o odiava tanto.

- Não sei porque não estou surpresa ... - resmunguei sobre a escolha do lugar.

- Ambientação é tudo! - piscou para mim e juro que havia um sorriso lindo por debaixo daquela máscara.

Quis me socar. Ahhhhhh ...

Estava sentindo o peso de ter passado a noite em claro, mas decidi seguir em frente. Precisava daquele treinamento, precisava melhorar minhas habilidades ninjas. Tinha que saber me proteger sozinha, senão não duraria um dia fora de Konoha, como ele mesmo disse!

Foi por isso que escutei todas as instruções com atenção e fiz exatamente tudo que aquele rato me pediu. Repassamos algumas técnicas de camuflagem, de ataque e defesa corporal e manuseio de armas.

Às vezes, a proximidade de nossos corpos me desconcentrava, mas a presunção daquele homem, além de me irritar, me trazia de volta à realidade, dando-me mais combustível e força para revidar.

Bom, pelo menos tentar revidar.

Em momento algum acertei um único golpe nele, nem cheguei perto. O Sr. Hatake era admirável, fazia jus a sua fama de ser duro na queda. Eu sabia disso, eu vi isso com meus próprios olhos. A sua resistência ao veneno foi excepcional e agora, mesmo ferido, não consegui fazer-lhe nenhum arranhão.

Após uma rasteira seca, cai de costas no chão e não me levantei mais. Respirava ofegante, encarando o céu do meio dia, azul claro com algumas nuvens absurdamente brancas que teimavam em ofuscar-me a visão.

O Sr. Hatake jogou seu corpo por cima do meu, trazendo uma sombra reconfortante para aquela iluminação forte e, prendendo meu braço sobre meu estômago com seu joelho, apontou uma kunai extremamente afiada para meu olho esquerdo.

- Morta, de novo! - sentenciou convencido e eu congelei.

A kunai estava a milímetros da minha íris.

Toda vez que me golpeava fatalmente, escutava essa sentença. Chegou uma hora que perdi a conta de quantas vezes havia morrido durante o treinamento.

Fingi rendição, fazendo uma expressão de frustração e, quando senti seu corpo começar a relaxar, imediatamente revidei um golpe de kunai, escondida no pulso do braço livre. Se não tivesse desviado, utilizando seu braço, teria entrado crânio adentro pelo ouvido direito dele.

- Eeeeiiiiii!!!! - se queixou, indignado. - Mortos não revidam! - jogou minha kunai longe e prendeu meu pulso com força sobre a minha cabeça.

O rosto dele ficou muito próximo ao meu e foi inevitável nos encararmos. Ao mesmo tempo em que seu cenho descontraiu, meus músculos relaxaram, cedendo à força descomunal daquele homem. Seus olhos caíram sobre meus lábios e desejei, como nunca, um beijo daquele rato convencido.

Mas não foi isso que aconteceu.

- Muito bom! - desviou o olhar e me soltou, saindo de cima de mim. - Está pegando o jeito! - levantou-se e me deu a mão para o seguir. - Está pronta para uma prova final.

- Sensei, estou muito cansada ... - tentei resmungar, mas fui interrompida.

- Exatamente por isso! Quero saber do que é capaz quando suas forças já se exauriram. - apontou para a densidade da mata atrás dele. - A prova é a seguinte: se esconda de mim.

Fitei-o, esperando mais instruções.

- Só isso? - desconfiada.

- Só. - enfiou as mãos nos bolsos.

- Tipo pique-esconde?

- Posso contar até dez, se quiser. - teceu-me um olhar tedioso e isso me enraiveceu.

Convencido de merda!

- Conte até cinco! - cruzei os braços e esperei que fechasse os olhos para me mover.

Fez o que pedi e, quando abriu os olhos, o homem não ficou nem meio milésimo de segundo parado. Virou-se tão rapidamente, me desarmando, que nem pude reagir.

Estava tão cansada que, só de sacanagem, me escondi em suas costas. Duvidei que ali fosse o primeiro lugar que olharia. Mas para minha decepção, não demorou nadinha para sentir minha presença e me desarmar, antes mesmo de conseguir encostar a kunai que estava apontada para sua nuca.

- Você tá me zoando, só pode! - ficou irritado, pegando meu braço com força.

- Eu tô mesmo muito cansada, sensei! - resmunguei, meio emburrada. - Posso, por favor, morrer agora? - não senti um pingo de vergonha em pedir arrego.

- Morrer nunca vai ser uma opção pra você. - soltou-me e virou-se de costas. - Quando vai entender isso? - recomeçou a contagem.

Fiquei paralisada. O Sr. Hatake estava se esforçando ao máximo para me preparar e, o mínimo que eu poderia fazer era dar o melhor de mim. Talvez morrer cedo fosse meu destino, seja nas mãos do inimigo ou para salvar a vida do espião. Mas, pelo menos precisava ter certeza que tinha feito tudo que estava ao meu alcance para tentar preservar minha vida. Não poderia ser fraca como naquela noite no beco.

A contagem terminou e, novamente, vi seu semblante irritado, constatando que estava parada no mesmo lugar.

- Tá, vamos tornar isso mais interessante. - cruzou os braços, se virando para mim. - Que tal assim: se eu não te achar em quinze segundos pedirei à Tsunade que eleja outro professor pra você.

Arregalei os olhos, incrédula.

- Pro treinamento nível S?

- Sim! - estava confiante demais.

- Impossível! Ela não vai aceitar!

- Te dou minha palavra! Eu saio da jogada, ela não terá outra escolha.

Fitei-o profundamente, tentando encontrar o erro. Aquilo tinha cara de armadilha, mas meu coração saltou com a hipótese, mesmo que vaga, de me livrar desse rato de uma vez por todas.

- Parece muito bom pra ser verdade. - cogitei. - Quinze segundos?

- Isso!

- Não sei ... - ainda cogitava, receosa.

- Mas tem um porém.

- Claro que tem! - aí estava a armadilha, senhoras e senhores!

- Se eu te achar em menos de quinze segundos, você vai aceitar sair comigo hoje, mais tarde. - seu tom de voz estava nitidamente perverso.

- Como em um encontro? - meu rosto foi uma mistura de espanto com nojo.

- NÃO! Ecaaaaaaa! - debochou. - Vamos sair para beber e comer algo, como colegas. O que acha?

Cai na armadilha.

Em minha defesa, eram somente quinze segundos, mas era do grande ninja de Konoha que estávamos falando. Aquele rato miserável me achou em dez segundos. DEZ!!!

E sabe como ele fez isso? Naquele momento, quando tentei acertá-lo com a kunai no ouvido, seu braço sofreu um pequeno corte ao defendê-lo. O Sr. Hatake usou seu próprio sangue e depositou no meu uniforme quando pegou em minha mão, para me erguer do chão.

Ao terminar a contagem, o homem invocou seus cachorros fedorentos e esses me farejaram num piscar de olhos. A figura sombria e dissimulada daquele rato apareceu bem diante dos meus olhos e enfiou a ponta da kunai no meu pescoço.

- Morta! - riu-se satisfeito.

...

Agora, a caminho de casa, minha única preocupação deveria ser tomar um banho, comer algo e descansar. Mas minha mente fervilhava, tentando entender como pude ser tão burra para cair, de novo, na armadilha daquele rato?

Sair com ele ... só podia ser brincadeira!

Treinamento Nível S - Kakashi HatakeOnde histórias criam vida. Descubra agora