Parte 42

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Andamos o dia todo, com pequenas pausas somente para descansar e comer algo. Ainda tínhamos um grande caminho pela frente, mas o sol baixava mais que a metade no horizonte. Logo, logo pararíamos para acampar e sinceramente, odiava a ideia de dormir ao redor de uma fogueira e não ter um banheiro decente por perto.

Meu corpo já pensava o contrário, meus pés estavam inchados e doloridos e não se importariam nem um pouco em sentar-se no chão duro para descansar. Estava me sentindo exausta, por mais que passasse o dia todo de pé no hospital, nunca tinha feito uma caminhada tão longa.

Minha primeira missão foi repassar os cem princípios shinobis com a sabichona da Sakura, ali mesmo, durante o percurso da viajem. Descobri que a menina possuía uma capacidade mental incrível e, mesmo sem querer, me identifiquei um pouco com ela. Fazia tempo que não lembrava dessa babaquice toda de regras para ser um ninja mas, se me perguntassem sobre qualquer planta ou substância, não havia uma única sequer que não pudesse ser descrita por mim, como se estivesse lendo um livro sobre ela na minha frente. E não só isso, poderia indicar com facilidade as interações com outras substâncias que dariam certo ou ... poderiam até matar alguém.

Já o sensei, passou a viajem toda com a cara enfiada naquele livro. No começo estranhei um pouco, mas depois deduzi que era uma forma de se concentrar e ficar atento ao que acontecia ao redor, em alerta por todos nós. Aquela postura irritantemente despreocupada e distraída era só um disfarce para os olhares desatentos. O sensei estava em estado de alerta o tempo todo, pronto para revidar ao primeiro sinal de perigo.

Decidi não atrapalhá-lo ... até esse momento:

- Pretende continuar noite adentro? - meu tom cansado chamou a atenção do sensei para mim, desprendendo-o da leitura.

- Já está cansada? - assenti em silêncio e o vi direcionar o olhar tedioso diretamente para o horizonte, parecia se situar do horário só agora.

- Eu não estou nem um pouco cansado, sensei! Poderia andar a noite inteira se precisasse. - aquele garoto entrou na conversa sem ser chamado. - E acho que é o que deveríamos fazer! Estamos bem atrasados pelo ritmo lento dessa ai! Tô certo! - cerrei os olhos enraivecidos, perdendo o último vestígio de paciência que vinha tendo com as provocações infantis desse garoto.

- Fique quieto, Naruto! Não estamos nem um pouco atrasados, pelo contrário, estamos onde deveríamos estar! - antes que pudesse abrir a boca, o Sr. Hatake deu-lhe uma bronca à altura. - E se eu fosse você, tomaria mais cuidado ao provocar a S/N. Você não sabe do que ela é capaz. - deixou aquilo no ar, voltando sua atenção ao livro, fazendo com que o garoto me analisasse da cabeça aos pés e virasse o rosto em sinal de desprezo.

Quis socá-lo! Na verdade, eu o socaria, na primeira oportunidade. Eu juro!

Senti minha mão ser envolvida pela pequena mão da garota de cabelos rosados, me convidando a apressar o passo. Me disse que estávamos há apenas alguns metros do alojamento e que logo descansaríamos.

- Alojamento? - repeti, confusa.

- Sim! - a cordialidade da menina me confortou. - Toda Konoha possui estruturas para descanso dos viajantes. Bom, pelo menos nas estradas principais. - soltou-me a mão e acelerou o passo na minha frente, sumindo numa curva de mata fechada. - Vem! - gritou de lá. - Chegamos!

- É, mas se tivéssemos pego o atalho direto pro nosso destino, adiantaríamos meio dia de viajem! - reclamou alterado, apontando o dedo acusador para o homem ao meu lado. - Kakashi sensei, você pegou o caminho principal só porque é mais tranquilo, não é? - ele só ergueu ambas as sobrancelhas em resposta. - Por que está pegando leve com ela? Posso saber? - cruzou os braços, emburrado.

Vi o homem levar a mão à nuca e coçá-la, num riso meio nervoso. Corou e demorou para responder. Não aguentei e devolvi, raivosa:

- Não pedi pra que pegasse leve comigo, Sr. Hatake! Sou muito bem capaz de acompanhá-los, no ritmo de vocês! - menti descaradamente, cruzei os braços, como o emburrado do Naruto e apertei o passo, seguindo a garota, deixando-os para trás.

É claro que isso seria quase impossível! Imagina eu, uma pessoa que mal conseguiu escalar a janela do próprio quarto, acompanhando ninjas em seus atalhos sem estrutura, subindo e descendo árvores e morros ... mas não poderia dar esse gostinho para o pivete!

Escutei conversarem logo atrás:

- Tá vendo, seu idiota! - era a primeira vez que escutava a voz do menino que ficou a viajem toda calado. - Agora ela está brava com o sensei. E por sua culpa!

- E daí? - resmungou. - Duvido que ela seja mais forte que o Kakashi sens- ...

- Você não entende nada mesmo, não é? - o cortou, irritado. - É um imbecil!

Esse garoto tinha uma perspicácia apurada fora do comum. Será que percebeu que o Sr. Hatake e eu não somos apenas sensei e aluna?

- Meninos ... - a voz cansada do homem apaziguou a questão de vez. - Vamos, quero que se concentrem em reunir lenha suficiente pra acender uma fogueira decente pro nosso jantar. Vamos dormir e acordar cedo!

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E realmente foi o que fizemos! Todos estavam cansados e pegamos no sono rapidamente.

A estrutura do alojamento me surpreendeu. Num canto, coberto por uma espécie de telhado de madeira, vários quiosques com mesas e bancos deram o conforto necessário para a nossa última refeição do dia. Os banheiros, ao fundo, permitiram uma higiene pessoal decente. O banho era frio, mas no calor que estava fazendo, isso foi mais uma bênção que uma maldição.

No outro canto, haviam pequenos chalés, distribuídos por toda uma clareira. Era apenas um pequeno cômodo vazio, mas para quem temia dormir sob as estrelas, aquilo estava mais para uma suíte de luxo.

As meninas ocuparam um dos chalés e os meninos um outro, imediatamente ao lado. Combinamos de nos reunir às quatro e meia da manhã, tomar um café e partir em missão em seguida.

Minha nova habilidade permitia ouvir o homem nitidamente, mesmo que ocupasse o cômodo ao lado e não conseguisse ouvir os outros integrantes. Achei certa graça, lembrando dos meus pais. Mas não tirei muito proveito, além de falar pouco, quando falava era para passar alguma instrução ou rebater alguma idiotice daquele pivete. Tudo cessou quando disse um boa noite cansado.

Distribuímos os sacos de dormir e nos ajeitamos confortavelmente no cômodo sem iluminação.

Odiava pensar que não era ninja o suficiente para acompanhá-los em empreitadas mais desfavoráveis. Mas não posso dizer que o coração não aqueceu quando percebi que o Sr. Hatake tinha pensado até nisso. Fez questão de pegar o caminho mais longo, mas que proporcionasse mais conforto ... para mim!

Sorri boba, igual a Sakura, enfiando a cabeça embaixo da coberta, como se alguém fosse ver.

O sono chegou rápido, mas não durou muito tempo.

Não sei bem que horas eram, mas despertei sentindo a presença de alguém no quarto. Não senti medo porque identifiquei de cara que era o Sr. Hatake. De algum modo, nossa conexão permitia isso, pois de que outra forma seria possível explicar essa habilidade? Mirei a janela e o encontrei agachado, feito ninja sorrateiro, me observando da escuridão.

- Você tem sérios problemas com invasões de quarto, não é? - brinquei baixinho para não acordar a garota ao meu lado.

- Venha comigo. - sussurrou seco quando percebeu que o tinha visto e desapareceu na mata densa sem fazer um ruído sequer.

Treinamento Nível S - Kakashi HatakeOnde histórias criam vida. Descubra agora