Capítulo 30

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Tiana

Apoio minha mão no ombro da Ayres, ouvindo apenas as pessoas chorando, no velório do tio do Clayson. É a minha primeira vez em um velório e eu só fico pensando no que eu fiz pra ter um castigo desses, porque só pode ser castigo, não penso em outra coisa. Na verdade, eu sei sim, mas gosto de contestar pra amenizar a minha lamentação, porque eu não posso descontar minha raiva na doutora que me denunciou, aquela maldita.

Ayres: Tiana, ninguém conhece a gente - ela fala baixo e eu me inclino pro lado, deixando o corpo mais próximo do dela - Finge que tá chorando, eu tô tentando faz tempo, mas não consigo chorar.

Eu: É só pensar no motivo da gente estar aqui - ela me olha de lado e vira o rosto - Pois é, gata, a gente colocou o som, agora vamo rebolar, porque isso é karma, o que a gente fez ontem voltou rapidinho.

Jandira: Tiana, tem gente te olhando - eu mexo no meu cabelo, vendo a viúva sorrindo de leve pra mim e eu finge que não vi - A viúva deve tá pensando que você é amante do falecido, porque ela tá só captando seus movimentos.

Eu: Se ela vier me bater, eu apanho calada, porque não quero outro processo - passo a mão no queixo, vendo o Clayson falando com a família dele e volto a falar - Depois daqui vai ter show da Ivete e eu vou, porque quero curtir antes de ser presa.

Jandira: Eu já tenho o acesso, daqui pra lá é dois pulo - eu evito sorrir e fico quieta no meu canto, sentindo a Ayres mexer na minha pulseirinha da Pandora - Vai ter Nadson O Ferinha.

Tem pouco tempo que a gente chegou, eu vim na esperança de fugir, mas depois descobri que se a polícia quiser me pegar, ela me pega em qualquer lugar, eu tô ciente disso, mas eu já tô aqui e não vou voltar por causa disso. Quando a gente chegou teve que correr pro local do velório, porque o corpo já vai sair, tá sendo de caixão fechado, devido ao estado do falecido. Assim que eu cheguei, eu saí perguntando o motivo da morte, o horário, tudo, porque eu sempre quero saber, mesmo que eu não conheça a pessoa.

O falecido trabalhava na Petrobrás, era rico, jovem ainda, mas foi tomar banho no mar de Recife e não voltou mais, porque um tubarão atacou ele e tirou uma parte do corpo. Meu medo é terminar dessa forma, batalhei tanto pra chegar onde eu tô agora e morrer desse jeito? Eu não aceito, se fosse comigo, minha alma nunca aceitaria e eu ficaria vagando atrás de um Tigrinho falecido.

Clayson: Vamo? - ele fala baixo e a gente confirma, vendo ele olhar pra porta de entrada - Vamo logo que a amante dele tá vindo, minha tia tá ali só esperando ela chegar.

Ayres: Então ela pensa que é a Tiana mesmo - eu franzo o rosto, olhando pra viúva e ela sorri fraco de novo - Vamo embora, a gente até tenta fugir da confusão, mas a confusão não larga a gente.

Jandira: O show já vai começar, vai ser aberto - ela ajeita a camisa preta de botão e eu seguro na mão dela, tomando cuidado na hora de andar - Meus pêsames pra senhora.

Xx: Obrigada, ainda tô assimilando tudo isso - ela fala baixo, parecendo dopada e me olha - Me desculpe a pergunta, mas é você que se chama Mamoça? - eu franzo o rosto e nego, ouvindo ela resmungar - Parece muito, por isso eu tava te olhando e eu sou oficial de justiça, aí tô acostumada a ver muita gente - eu olho pra Ayres e disfarço.

Eu: Eu sou do Rio, só vim fazer uma visita, porque recebi uma proposta de emprego - ela suaviza o olhar, limpando os olhos vermelhos - Trabalho numa funerária, por isso que eu vim aqui.

Clayson: E já tá de saída, meus pêsames, tia Ziralda - ele abraça a mulher e segura minha mão, me levando pra fora - Meu Deus não aguentava mais fingir tristeza, isso era um cão, chorei na hora porque achava que era meu outro tio, mas foi logo essa praga - eu olho a rua de paralelepípedo e franzo o rosto - Me chamava de viadinho, eu só tinha 5 anos, sempre dei sinais, todo mundo sabia, mas não justifica.

Por uma BucetaOnde histórias criam vida. Descubra agora