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Enid abriu os olhos e piscou rapidamente, adaptando-se à iluminação. Tudo era tão branco que ardia nos olhos. Arfou, sentindo as costelas doerem.

Tão frio.

Virou o rosto para outra direção; seus longos fios escuros escorriam pela cama, como uma cascata de obsidianas. Ela tocou o rosto; a pele ardia, assim como todo o corpo.

Olhou para cima; o teto era espelhado, as paredes brancas, mas uma delas também era de vidro. Podia ver seu reflexo deitado, usava uma camisa e moletom brancos, estava limpa. Mas não se lembrava ter ter tomado banho ou trocado de roupas...

Levantou-se devagar; seus pés descalços tocaram o chão frio, tão limpo que se tornava escorregadio. Aproximou-se da parede espelhada; tinha profundas olheiras e seus olhos já não eram verdes folha; suas lentes haviam sido retiradas. O azul profundo com um pequeno detalhe esmeralda reinava novamente. Tocou o vidro; só poderia ser um sonho... um pesadelo. Os cantos das paredes possuíam pequenas bolinhas brancas, câmeras. Só havia a cama e um bebedouro.

Ela deu pequenas batidas no vidro e encarou as câmeras. Nada. Esperou que alguém aparecesse, que pelo menos as câmeras emitissem algum som. Tentou resgatar em sua mente o que se lembrava depois de ser acertada pela arma de choque. Ela viu Zulma; depois foi arrastada para uma sala na delegacia; ouviu conversas sobre ser transportada. Depois sentiu uma dor aguda no pescoço e... nada, não se lembrava de mais nada até aquele momento. Deveria estar morta; não era essa a lei? Mestiços eram mortos imediatamente. Tocou as palmas das mãos no pescoço. Há anos não via notícias de mestiços mortos; geralmente eram ''capturados'', mas todos sabiam o final que os aguardava... Não sabiam? Imaginou que sim. Será que fariam alguns testes antes de matá-la?

- Ok - falou em um tom baixo, até suas cordas vocais doíam - Eu já estou acordada, ok? Seja o que for fazerem apenas façam logo!

Silêncio. Enid aproximou-se do vidro; como se a função espelho tivesse sido desligada, ela pôde ver do outro lado, em um corredor, homens se aproximando. Ela se afastou, e uma porta foi aberta; os guardas imobilizaram seu corpo com facilidade. Um homem de jaleco branco se aproximou; pelos olhos claríssimos, eram serpentarianos.

- Experimento 32, traço E. Enid Thomazini, vinte anos. Mestiça tipo 1: Virgem e Capricórnio. Sem filhos.

Não tirou os olhos das suas anotações.

- Podem levar.

Ela não resistiu; estava tão resignada que não sabia como reagir. Foi guiada por longos corredores luminosos até uma sala com diversas telas claras. O homem indicou a mesa em que ela deveria deitar. Seus lábios estavam secos; ela falou, e sua voz saiu tão assustada quanto realmente estava:

- Isso é uma execução?

Ele finalmente a olhou; não havia o mínimo resquício de sentimento em seus olhos. Por um segundo, imaginou que talvez pudesse haver compaixão por ela, que fizessem aquilo de forma rápida. Mas o serpentariano era pior que uma máquina; não a via como um ser humano. Não tinha misericórdia.

- Não - respondeu voltando aos hologramas - Deite-se.

Os dois guardas estavam nos cantos da sala. Havia mais um próximo à mesa em que ela deveria deitar.

- Então, o que é isso?

O guarda a segurou pelos ombros, jogando-a com força sobre a mesa; ela emitiu um gemido de dor, imediatamente algemas seguraram seu corpo na mesa. Por instinto, tentou se soltar, mas as algemas feitas de luz apenas brilhavam mais forte, como um ímã puxando-a para baixo. O homem de jaleco se aproximou, a olhava com tédio. Ele ajeitou os cabelos da moça com dificuldade, jogando tudo para o lado e amarrando.

- Doutora, são longos demais, talvez seja melhor cortar.

Enid se balançou, tentou falar algo, mas não conseguiu, era como se tivesse uma fita em seus lábios, mas não sentia nada. Ela olhou feio para o homem.

- Dr. Sorbus - disse uma voz feminina se aproximando do campo de visão dela.

Era uma mulher; usava curtas tranças raiz na cor branca, pele escura e unhas bem feitas. Pela sua postura, deveria ser quem mandava na sala. No uniforme, seu nome estava bordado em prata: Dra. A. Viola Odorata.

- Aqui não é um salão de beleza; se um mero cabelo está te atrapalhando, apenas mantenha bem amarrado.

Dr. Sorbus concordou e se afastou da mestiça; ele não a tocava nem se aproximava sem necessidade. Todos naquela sala a olhavam com desprezo, era visível em cada movimento, cada expressão. O olhar da mulher era um pouco diferente; não parecia desprezá-la, mas era talvez... pena? Misturada com superioridade.

Doutora Viola aproximou-se de Enid e inclinou uma lanterna, abrindo os olhos da mestiça com grande interesse:

- Observações: Predominância capricorniana de 85% nos olhos.

As mãos do outro serpentariano tocaram nas têmporas da garota; algo semelhante a adesivos era colado pelos braços e cabeça.

- Enid? - chamou Dra. Viola - Está me ouvindo bem?

Fez que sim com a cabeça.

- Meu nome é Viola Odorata, sou chefe do Projeto Nodo Lunar - seu tom era suave, mas longe da gentileza - Eu sinto muito que tenham trazido você para cá de forma tão violenta; não compartilho dessa abordagem, mas são ordens de cima.

Ela se aproximou de um holograma; parecia um cérebro, linhas corriam como meteoros em diversas cores. Viola voltou a olhar para Enid:

- Eu acredito que posso te curar, Enid; você não deve ser punida pelos erros dos seus genitores nem pela sua má formação genética. Vamos separar o signo que parasita seus genes e te tornar pura de novo. Começamos as experiências há cinco anos, e os avanços têm sido difíceis, mas estamos evoluindo. Você é nossa trigésima segunda ''amostra''.

A jovem tentou falar, e a pressão cedeu; seu tom era ácido, cético, desafiando Viola:

- E o que aconteceu com as outras trinta e uma?

A mulher cerrou os olhos; a pressão voltou a prender os lábios de Enid. Viola voltou a riscar o holograma do cérebro da mestiça com anotações incompreensíveis. Irritava-se com a ignorância de suas cobaias; os mestiços nunca entendiam a importância do seu benevolente trabalho.

- Eu gosto de ter essa conversa com todas as amostras; quero que saibam que, apesar de terem vivido toda a vida sendo um perigo ao seu povo, agora podem ter sua redenção.

Foi sábio silenciar a mestiça, pois a sequência de xingamentos que passavam por sua mente era realmente inadequada; até ela se surpreendeu com o vocabulário farto que aprendeu com Dess...

Dess.

Sentiu seus olhos arderem. Nunca mais veria a leonina, nem Zulma, nem mesmo o irritante do Nicolas. Elas deveriam estar inconsoláveis. Nunca mais veria sua família...

E a sua mãe? O que teria acontecido com ela? Teriam descoberto quem era o pai de Enid?

- Doutora - chamou Dr. Sorbus - houve um pico de dopamina.

Viola voltou a olhar para Enid, levemente surpresa.

Enid tentou não pensar em sua família; será que era possível que vagassem por sua mente? O que iriam extrair dela? Já sabiam quem a protegia? Um dos aparelhos na parede começou a apitar; estava com a pulsação acima do normal.

- Shhh - pediu silêncio acariciando as madeixas da morena - Precisa relaxar sua mente, querida, senão doerá ainda mais.

Ela encarou a mulher, seus olhos marinhos brilhavam em meio às lágrimas de fúria.

- Dia onze de abril de 2092. Oito e cinco da manhã. Experimento número um. Amostra 32, traço E. Enid Thomazini. Vinte anos. Sem filhos. Mestiça tipo 1: Capricórnio e Virgem. Signo parasita: Virgem.

Enid sentiu uma agulha furar seu braço esquerdo, se debateu desesperadamente, ofegante, assustada.

Sua visão foi embaçando.

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