INSEGURANÇAS

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Fernanda Bande

Acordo com os primeiros raios de sol invadindo o quarto pela porta da varanda deixada aberta, o vento frio que vem de fora me faz puxar o cobertor na tentativa de esquentar o meu corpo.
Tateio o lado vazio da cama buscando em vão a presença de Alane.
Sento na cama despertando aos poucos, no relógio, as horas marcam cinco da manhã, em pouquíssimas oportunidades acordo tão cedo aos domingos, mas até então não tenho nenhum sinal que meu sono voltaria.

Envolvo meu corpo com um roupão após levantar da cama, ando até a sala ainda esperança de encontrá-la em algum lugar da casa mas ela logo se dissipa ao notar a sala também vazia. Ao observar ao redor noto um pequeno bilhete deixado em cima da mesa de centro.

"Obrigada pelo dia incrível, por favor não me odeie por ir embora assim" A. Encaro o pequeno papel por alguns segundos, algumas dúvidas teimam em surgir na minha cabeça, se ela achou tão incrível então porquê havia ido embora? E sem ao menos se despedir? Cogito mandar uma mensagem, mas o horário me desanima, também não quero parecer desesperada e muito menos carente. Decido por fim passar um café. A fumaça se dissipa lentamente no ar, o cheiro logo se espalha pela cozinha acalmando meus pensamentos, alguns ligeiros flashes do dia anterior invadem sorrateiros minha cabeça, tornando completamente inevitável não pensar nela.

Será que falhei em algo? Será que ela nunca cogitaria a possibilidade de se envolver oficialmente comigo? Porque eu simplesmente não ignoro essas questões já que se tratam de alguém que praticamente acabei de conhecer? Espanto meus pensamentos confusos assim que o café fica pronto. Encaro a vista da porta da cozinha novamente lembrando de horas atrás, solto um sorriso desanimado após constatar que não seria tão fácil tirá-la dos meus pensamentos.

É Fernanda, você está ferrada - falo comigo mesma.

.

Alane Dias

Desde que voltei da casa de Fernanda não consegui mais dormir, parece que o sono me abandonou completamente, já sem esperança de dormir novamente vagueio pelo meu apartamento na tentativa de organizar meus pensamentos. O único barulho é da cidade lá fora que acorda aos poucos. Brinco distraidamente com meu celular enquanto meus pensamentos se misturam entre procurar saber o que é certo e errado, tenho tantas questões, cogito mesmo que por poucos segundos pegar um táxi agora mesmo e voltar pra casa de Fernanda mesmo sabendo que seria uma loucura. Minha mente aos poucos me prega peças, como se mais uma vez tivesse me sabotando ao invés de só viver algo que aconteceu naturalmente e que deveria aproveitar. Encaro a tela do aparelho cogitando mandar uma mensagem e pedir desculpas por ter ido embora sem me despedir, já imaginando com que cara olharia pra ela no trabalho depois de tudo, chego a escrever vários pequenos textos mas apago logo depois. Não deveria me importar tanto, mas não consigo evitar. O que será que ela pensa de mim?

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Ouço algumas batidas na porta do meu apartamento, logo me levanto para olhar de quem se trata, me repreendendo mentalmente por ter esquecido completamente de Beatriz ao vê-la pelo olho mágico da porta, abrindo com um sorriso amarelo logo depois.

- Eita que tomou chá de sumiço, hein? - seu tom é levemente bravo, mas não tiro sua razão, eu sumi por um dia inteiro quebrando nosso acordo silencioso de nunca fazer isso.

- Desculpa, amiga, mas eu posso explicar - faço minha cara mais convincente.

- A senhorita pode me dizer onde passou o sábado inteiro? - ela ignora totalmente minha tentativa de persuasão - sua cara não parece nada amigável - Eu só espero que você não tenha feito nenhuma besteira, se não vou ser a primeira a te dar esporro. Onde é que você tava?

Respiro derrotada percebendo que não vou conseguir adiar mais essa conversa.

-EutavanacasadaFernanda - falo baixinho rapidamente.

- Quê? Entendi nada, fala direito - indaga Beatriz confusa.

- Eu tava na casa da Fernanda - digo normalmente agora em um tom desanimado.

- COMO É QUE É? - Beatriz aumenta o tom de voz em plena surpresa.

- Eu tava na casa dela tá bom? A gente.... ficou - troco a última palavra deixando o verdadeiro significado subentendido.

- Você e a megera? Assim do nada? - seu tom é completamente incrédulo.

- Não foi bem do nada, a gente se beijou na sala dela no trabalho outro dia, aconteceu. E ela não é uma megera ok? Pelo menos não mais - falo a última parte mais como um pensamento alto.

- Ah, e a bonita nem pensou em me contar né?! Que bonito, fui demitida da função de sua melhor amiga e não tô sabendo?- seu tom continua levemente bravo.

- Ai amiga, por favor não me odeia, eu ia te contar, tá? só que eu tava esperando pra ver no que ia dar, sabe? - E pelo visto não vai dar em nada - penso.

- Foi tão ruim assim é? Pela sua cara de desânimo não parece que foi bom não - segura levemente minha mão e senta junto comigo.

- Não amiga, e o problema é exatamente ter sido o contrário, foi muito bom, só que eu acho que não vai passar disso - digo em um tom um pouco mais desanimado do que esperava.

- Por quê? Ela disse isso pra você? - seu tom agora é ameno, preocupado.

- Não precisa dizer né? Eu cheguei a essa conclusão sozinha. O que você acha que uma mulher como ela ia querer com alguém como eu? Por isso que eu saí quase fugindo de lá - baixo a cabeça lembrando da minha atitude ridícula.

- Ah não, espanta esse papo deprê. Como assim uma mulher como você?  Amiga, você é maravilhosa, linda, trabalhadora, talentosa, cheia de qualidade, Alane. Vai ficar chorando no canto por uma coisa que você nem sabe? Para. Vai viver o momento, aproveita. A mulher te colocou em um pedestal, te levou pra um teatro, te deu presente, te levou pra casa dela, e você sai de lá no meio da noite sem dar nenhuma satisfação? - diz quase como uma bronca.

- Você vai pegar esse celular agora e vai mandar uma mensagem chamando ela pra sair - me estende o celular com o olhar sério, naquele momento entendi que aquilo era uma ordem.

- Bia, eu não sei se é uma boa ideia - tento em vão contrariar o que ela pede.

- Alane, acorda. Só falta essa mulher mandar um carro de mensagem pra sua porta se declarando, aproveita essa chance. - Ou você manda, ou eu mando - olhamos juntas para o objeto sobre o sofá, trocamos olhares, o meu assustado, o dela decidido.

Infelizmente ela é mais rápida e pega o celular primeiro, nesse momento me arrependo amargamente por ter cadastrado a digital dela. Entramos em uma pequena luta na tentativa de impedir o que sabia que ela faria, infelizmente ela é mais rápida e se desvencilha rapidamente da minha tentativa de pegar o aparelho de suas mãos. Logo ela cruza a sala se distanciando e já digitando alguma mensagem.

- Bia, não faz isso - estendo a mão na tentativa patética de impedi-la.

- Tarde demais, já mandei - seu sorriso é convencido e satisfeito.

- Eu vou te matar - digo entre dentes. Ao ouvir o som de uma nova notificação.

- Você tem um encontro - seu sorriso é convencido e satisfeito enquanto me devolve o celular - de nada - me dá uma piscadela.

Solto um suspiro pesado, não acredito que ela fez isso.





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O Diabo veste Preto (Ferlane)Onde histórias criam vida. Descubra agora