A rua

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"Filhos da noite, vida sem rumo
A lua abraça a minha indecisão
O cheiro no ar e esse sorriso
Indicam: Fugimos da prisão"


O carro cruza as ruas, a loira dirigindo habilidosamente e a morena ao seu lado perdida em pensamentos que não se instalam na órbita da terra. Berlinger parece bonita demais assim, os dedos batucando no volante, os ombros relaxados e a expressão focada no trânsito caótico. A música gostosa embala os minutos que elas passam sem conversar, Anita fazendo um caminho silencioso e Verônica se deixando ser guiada pela loira.

A delegada estaciona em uma avenida movimentada que a escrivã reconhece, mas não lembra o nome. Ela lê o letreiro de um hotel e franze o cenho quando Anita pega sua mão e passa por seu braço. Suas palavras são suaves quando ela cumprimenta o concierge, que a conhece pelo nome e a guia para o elevador.

- Você vai gostar daqui, é muito bom. – Ela comenta animada e Verônica mal consegue reconhecer a mulher de braços dados com ela.

Verônica reconhece o lugar como um rooftop, os prédios de São Paulo se erguendo a frente de seus olhos, as luzes como pequenos pontos espalhados por toda a vista.

O lugar é amplo, pequenas varandas de vidro cercam a extensão do topo do prédio, o balcão largo a direita é iluminado por uma cor azul bonita que reflete no resto do local, as mesas espalhadas dão um tom íntimo, distantes umas das outras, pequenos sofás dando lugares as cadeiras, fazendo as pessoas do local se aconchegarem umas nas outras. Mesmo assim, elas se dão espaço, sentando-se uma na frente da outra.

- Senhora Berlinger, sempre um prazer recebê-la, fique à vontade. – O homem bem-vestido a cumprimenta e Anita acena com a cabeça.

- Uau, você sabe como fazer uma garota se sentir especial. – Verônica comenta risonha. É brincadeira, mas a escrivã ainda está impressionada.

- Eu sei como tratar uma mulher bonita. – Anita pisca para ela, mas desvia seu olhar para o cardápio.

- Todos os elogios que você nunca me deu esses anos, deu hoje. Estou impressionada. – Verônica provoca, seu olhar focado nas opções o menu, os preços sendo exorbitantes para seu salário como escrivã em São Paulo. – Bem que Dante disse que você estava de bom humor.

- Jesus, como vocês especulam sobre minha vida. – A loira rola os olhos, um sorriso teimoso em seus lábios.

Quando o garçom volta e recolhe seus pedidos, Verônica encara os olhos profundos da loira. Elas nunca estiveram naquela situação, sempre que estavam juntas fora do trabalho, a única coisa que saia dos lábios de ambas eram xingamentos, ou gemidos.

"Depende bastante do dia", o pensamento intrusivo de Verônica complementa.

Anita observa as luzes da cidade contrastarem com o rosto bonito a sua frente. Verônica parece leve, o batom emoldura seu rosto e ela parece a mulher mais interessante que Berlinger poderia ter a companhia naquele momento.

- O que estamos fazendo, Anita? – Verônica questiona, em sua expressão um semblante perdido.

- Jantando? – Anita tenta cortar a conversa, mas a morena não desiste.

- Também... – Verônica suspira – Digo sobre as noites que passamos juntas, esse jantar, essas interações. O que isso significa?

- Você sempre quer colocar os pingos nos i's. – Anita desvia o olhar da morena, focando em observar a vista.

- Tenho esse defeito. – A escrivã dá de ombros – Não quero rotular nada, só estou tentando entender que terreno pisar. – Ela se defende antes que Anita zombe que ela seja emocionada.

Teto de VidroOnde histórias criam vida. Descubra agora