O telefone tocou novamente

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"O telefone tocou novamente
Fui atender e não era o meu amor
Será que ela ainda está muito zangada comigo?"


O bipe baixinho faz a consciência da mulher deitada voltar aos poucos. Seus olhos piscam com dificuldade, ardendo ao notar a claridade dos primeiros raios da manhã. Ela sabe ser cedo pois o sol não brilha fortemente, mas clareia o suficiente para iluminar o quarto. Olhando ao redor, ela nota as paredes brancas e os fios grudados ao seu corpo. Uma dor aguda se instala em suas costas e sua garganta parece seca como areia no deserto.

Seu olhar encontra uma mulher repousando em um sofá no lado esquerdo do lugar. O sono parece perturbado, as feições estão tensas mesmo em estado de repouso. Ela tenta balançar o braço para chamar atenção da mulher dormindo, mas não obtém resultado.

Sua boca seca se abre mas nada além de um grunhido doloroso sai da garganta de Verônica.

A sensação de não conseguir se comunicar ou se mexer sem sentir dor começa a acelerar seu coração, agonia subindo por seu peito em uma sensação claustrofóbica que ela conhece. Ansiedade, pânico... ou pós-traumático?

Verônica não sabe bem, mas o ar começa a faltar em seus pulmões com o desespero que lhe atinge. O bipe fraco da máquina se torna alto, assim como o latejar de seu coração. Ela tenta fazer um exercício de respiração, mas não ajuda a melhorar a sensação.

Anita pisca ao escutar o barulho estranho romper o véu de seu sono. Abrindo os olhos, ela vê uma morena de olhos arregalados e respiração cortada. Seu impulso é pular do sofá, cambaleando no processo quando sua pressão cai por alguns segundos pela rapidez do ato.

- Verônica? – Ela pergunta e a morena lhe encara. – O que foi, meu bem? – Seu tom soa quase desesperado, seu olhar indo do monitor para a mulher estática a sua frente. – Porra, eu vou chamar uma enfermeira.

Mas antes que ela se vire, uma mão se fecha em seu braço, impedindo que ela se mova. Verônica faz um gesto em direção a boca com a outra mão e Anita se lembra de quando elas visitaram Silvano e sua necessidade por água. O toque em seu braço se vai a contragosto e ela caminha rapidamente até o pequeno frigobar no canto do lugar, pegando uma garrafa de água e a despejando no primeiro copo que acha em uma bandeja próxima. Ela o leva até Verônica, ajudando as mãos frágeis a segurarem o objeto, enquanto em goles ágeis a morena parece se recuperar os poucos.

O monitor finalmente começa se acalmar, e Verônica exala aos poucos, sua respiração se estabilizando. Ela pigarra, um fantasma de dor ainda atinge sua garganta.

- O que-e aconteceu-u? – A mulher gagueja, sofrendo para proferir a primeira frase.

- Você foi baleada, meu amor. – Anita diz pesarosa, se aproximando da cama da mulher e pegando uma de suas mãos nas suas. – Teve que fazer uma cirurgia, mas está bem. – Os olhos verdes encaram o rosto abatido com preocupação. – Eu estou aqui com você, ok? Você vai ficar bem.

Verônica morde um sorriso com as palavras, seu coração até então desesperado, é preenchido com uma segurança que ela acha nunca ter sentido na vida. Mas então, seu cenho se franze em confusão.

- Q-quem é você? – Ela gagueja novamente, mas as palavras soam mais firmes dessa vez.

Anita torce as sobrancelhas, como se não entendesse o que ela havia dito.

- Onde está minha mãe? – Verônica continua.

Os olhos verdes se arregalam.

A mãe de Verônica morreu a mais de 10 anos.

- Ugh, eu vou perder o prazo de entrega do Professor Gilberto! – Ela grunhe. – Como diabos eu levei um tiro indo para a faculdade? – Ela pergunta irritada para Anita.

Teto de VidroOnde histórias criam vida. Descubra agora