Tigresa

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"Uma tigresa de unhas negras e íris cor de mel
Uma mulher, uma beleza que me aconteceu
Esfregando a pele de ouro marrom do seu corpo contra o meu
Me falou que o mal é bom, e o bem, cruel"


Verônica aperta os olhos em negação, sua vontade é morar eternamente naquele momento. A dor da chegada da manhã faz seu corpo estremecer e Anita, inconscientemente, aperta os braços ao redor da morena com firmeza.

Verônica se deixa relaxa, raios de sol vazando pelas cortinas finas do quarto da loira. Seu cérebro repassa os eventos da noite passada, ela se lembra vividamente de Anita ofegante, da pele corada e da têmpora suada. Dos beijos religiosos por toda extensão de pele e das mãos firmes que apertaram todos os lugares onde conseguiam alcançar.

Ela se lembra do macarrão meio grudento que comeram de madrugada, terminado às pressas pela loira descabelada e cheirando a sexo. Da vitrola ligada mesmo após o disco terminar de tocar. De Anita relaxada pelo vinho e pelos incontáveis orgasmos, flutuando ao andar pela casa e se agarrando ao pescoço de Verônica quando elas finalmente deitaram para dormir.

Por isso a manhã dói tanto, o coração de Verônica não quer que o sonho de novela acabe. Ela não quer que a Anita que teve o vislumbre na noite anterior suma novamente. Ela a quer próxima, quer a conhecer, desvendar suas facetas, tocar todos os discos, descobrir todas receitas que ela sabe cozinhar e descobrir o gosto de seus lábios molhados de todas as bebidas daquele bar.

Mas era Anita. A Anita que lhe aplaudia em forma de humilhação na frente da equipe da delegacia. A delegada que falava aos quatro ventos que Verônica só estava ali por causa de Carvana. A mulher que olhava as cicatrizes em seu pulso com repulsa e debochava do ato de desespero que Verônica cometeu.

A lembrança doce dos lábios da loira sendo substituída pelo gosto amargo de suas ações.

Verônica sente o ressoar calmo do peito nu de Anita sob si, naquela posição, com a cabeça sobre o tórax da loira, ela conseguia ouvir as batidas lentas do coração da mulher, bem como sentir de perto o cheiro gostoso que exala da pele macia.

- Consigo sentir o cheiro de fumaça desses teus pensamentos daqui. – Anita resmunga baixinho, sua voz rouca pelo sono.

A loira não abre os olhos, puxando Verônica em seus braços até que ela esteja por cima de seu corpo. Elas se encaixam como peças de um quebra cabeça, Anita desliza uma das mãos sobre os fios castanhos, em um carinho gostoso.

- Eu disse que ia te deixar dormir agarrada comigo. – Anita solta um risinho.

- Que eu me lembre, você que dormiu agarrada em mim. – Verônica responde com bom humor, as lembranças ruins dissipando-se rapidamente de seus pensamentos.

- Mesma coisa. – Anita bufa.

Verônica levanta a cabeça que estava deitada sobre o peito da loira e encara o rosto sonolento, Anita abre os olhos e verdes calmos encontram íris castanhas límpidas.

Ela nunca confessaria, mas Verônica acha que provavelmente se apaixonou naquela troca de olhares. Ela não entende naquele momento, mas seu coração que acelera prova que todo o resto já tem conhecimento de suas emoções.

Anita sente a profundidade do olhar que recebe, parece um crime uma mulher parecer tão bonita pela manhã. Nos braços do tempo, ela se envolveu com muitas almas femininas, porém, nenhuma irradiava a quietude da pele imaculada, entrelaçada aos olhos cálidos, mesmo sob a luz matutina. O cabelo curto e bagunçado é charmoso, o ar selvagem da mulher que passou as últimas horas enfiada em meio a suas pernas lhe arrancando a sanidade.

Elas entram em um silencio confortável, ambas as cabeças lotadas de pensamentos demais para aquele horário da manhã, impedindo qualquer conversa fiada.

Teto de VidroOnde histórias criam vida. Descubra agora