Como Um Animal Amedrontado

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Morgana não sabia o que era – e, no fundo, temia descobrir. A única certeza que tinha era: a imagem do corpo ensanguentado de Aesop estava gravada na sua mente, dolorosa como uma marca de ferro incandescente. Insuportável e desesperante, como uma queimadura fresca. Esperava que não fosse uma espécie de visão, mas depois de descobrir que a de Alma se concretizara – e que o sonho anterior deixara uma cicatriz no seu braço –, Morgana não conseguia descartar essa hipótese. Esta tomava todas as suas forças para mostrar uma fachada de serenidade. Até então, os seus esforços tinham dado bons resultados. Tinha conseguido evitar qualquer pergunta de Nerida. Surpreendentemente, o perspicaz Ominis, que parecia ver através dela, também nada disse. Quanto a Anne, depois de ter sido expulsa do banheiro na madrugada de sábado, não lhe dirigira mais a palavra. Inclusive, deixara de se sentar com ela, Ominis e Sebastian. Por sua vez, Nerida aproveitara a oportunidade para se juntar ao trio.

No entanto, mais uma prova de fogo foi colocada no seu caminho, um teste à sua sanidade quem sabe, ou uma piada de mau gosto do destino. Afinal, Hogwarts era para ser o seu porto-seguro, mas parecia que a escuridão do mundo aos poucos infiltrava-se nas paredes de pedra do castelo.

Posto isto, o início de semana não se revelou fácil para Morgana. No primeiro dia da semana, quase se arrependeu de ter subido para o Salão Principal e desjejuar – ou pelo menos tentar.

A meio do pequeno-almoço, o correio chegou. A coruja de Ominis foi a única a sobrevoar o quarteto e, como de praxe, Sebastian esticou-se para receber o Profeta Diário. Ominis limitou-se a uma censura silenciosa, já que estava de boca cheia. Morgana, que brincava com um pedaço de panqueca, acompanhou tudo com desinteresse pela sua visão periférica, até Sebastian abrir o jornal. Na primeira página, capturou um vislumbre da fotografia de George Osric. Numa das colunas em destaque, estava a notícia oficial da sua morte. Um mês depois era tornada pública. O seu estômago revoltou-se. A pouca fome que tinha desapareceu, pelo que largou o garfo sobre o prato.

– Parece que os Aurores andam atarefados com aquele grupo de caçadores lá do Rookwood.

– Para os deixarem sair em liberdade outra vez? – Ominis encolheu os ombros. – Se bem me lembro, fizeram isso com o Harlow há uns meses.

– Pois... Aqui diz que prenderam dez. Estavam acampados no norte. – Sebastian virou a página. – Mais de vinte Puffskeins foram libertados.

Morgana obrigou-se a ouvi-los na esperança de se distrair. Não surtiu efeito. As memórias insistiam em passar diante dos seus olhos como se estivessem a acontecer naquele exato momento. O horror no olhar de Osric, o cheiro férreo do quarto, a dor de cabeça intensa que sentira, a revolta do seu estômago, o sabor azedo na língua. Podia ouvir o rosnar de Ezekiel no seu ouvido, a ordem para matar o inocente George Osric.

O ar faltou-lhe. Era como se milhares de mãos apertassem os seus pulmões e a sua garganta. Antes que os seus amigos notassem, levantou-se do banco às pressas e saiu. Se a chamaram, Morgana não prestou atenção. Pelo caminho, esbarrou no ombro de uns quantos alunos e nem sequer se dignou a pedir desculpas, muito menos viu quem eram de tão cega que estava pela dor, pelas memórias, pelo nojo que sentia de si mesma. Tudo o que o seu corpo clamava era pelo ar do exterior. Se continuasse dentro do castelo sufocaria.

Deixou que os seus pés a guiassem. Eles levaram-na para porta do Viaduto, próxima à escadaria para a Casa de Barcos. Era uma longa descida e durante o dia poucos ou nenhuns alunos iam até lá – o lugar perfeito para se esconder. Saltou de dois em dois degraus, a respiração ruidosa sendo a única coisa que ouvia além dos seus sapatos. Dava tudo para ter um pouco de vento a correr pela face, uma carícia para apaziguar a aflição que corria nas veias.

Estaria no jornal escrito a verdade? Só de pensar que sim, sentia o sangue gelar. Mas, independentemente de estar ou não, residia em si a verdade. Como iria encarar Eleazar Fig depois desta notícia? Como iria encarar, sobretudo, Aesop Sharp? Era nas suas mãos que estava a vida de George Osric, aquele que estava disposto a ajudá-los com a magia ancestral e a fornecer qualquer informação relacionada a Ranrok e as suas intenções. Talvez Osric tivesse sido o único aliado de confiança. Morgana esmagara essa esperança como se fosse uma frágil flor.

Masquerade (Morgana Malfoy x Aesop Sharp)Onde histórias criam vida. Descubra agora