Não Olhes Nos Olhos do Pai

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Na janela entreaberta do seu escritório, uma coruja-das-torres encontrava-se sentada no parapeito. Era uma bolinha de penas brancas, cinzentas e castanhas de onde emergiam os seus olhinhos pretos e intensos. Aesop soube de imediato do que se tratava. Há muito tempo que não recebia correspondência regular da sua família. Significava, então, que aquele dia supostamente especial tinha chegado.

Sem se preocupar em buscar um casaco para se proteger do frio, avançou até à coruja e procurou entre as penas pelas patinhas. Soltou de uma delas o pequeno embrulho e pousou-o na secretária. De imediato, ele tomou a sua forma original: uma comprida caixa verde-floresta com um laçarote em fita prateada.

— Bom trabalho — murmurou para a coruja ao coçar-lhe o pescoço com um dedo. A pequena fechou os olhos, parecia sorrir. Se fosse um gato tinha a certeza que ouviria o seu ronronar.

Deu-lhe um petisco e observou-a enfrentar o crepúsculo até desaparecer de vista entre as nuvens.

Aesop inspecionou a caixa. Era o décimo ano seguido que a recebia, pelo que já sabia o seu conteúdo: uma garrafa do seu vinho favorito. Mesmo assim, não saltou etapas. Puxou a ponta da fita e saboreou o sibilar do tecido acetinado. Levantou a tampa e observou a garrafa confortavelmente deitada numa manta de lã. No topo, descansava um bilhete.


Sentimos a tua falta, filho. Quando vens nos visitar?

Com amor,

Octavia Sharp


Aesop também sentia falta da sua família, mas não podia visitá-los. Era essa a desculpa que utilizava todos os anos como resposta. Muito trabalho com as aulas e a sua preparação, consequentemente pouco tempo de lazer. Ainda assim, o convite mantinha-se e Aesop era grato. A gratidão crescia na mesma proporção da culpa. Talvez a sua mãe pudesse ver através da sua mentira e, mesmo assim, não desistia. 

Devolveu o bilhete à caixa, desfez a cápsula da garrafa e tirou a rolha fora. O cheiro forte do vinho invadiu de imediato as suas narinas. Não sendo suficiente, aproximou-se da boca da garrafa e inalou-o profundamente. Tinha cheiro de lar, de gargalhadas, de vitórias e dias felizes. Foi inevitável sorrir.

— Que milagre.

Despertou do que seria o mergulhar em memórias de casa para seguir o som da voz feminina. Morgana estava à porta do seu escritório a girar uma taça entre os dedos.

— O que faz aqui, Malfoy?

Frente ao tom de afronta de Aesop, Morgana ergueu as mãos num ato de rendição.

— Posso?

Aesop recostou-se na cadeira, ainda a agarrar a garrafa pela garganta. Com a outra mão, gesticulou para que Morgana ocupasse a cadeira do outro lado da sua secretária, mas a sua aluna negou. Em vez disso, contornou a sala até estar ao seu lado. Encostou-se à mesa e estendeu a taça para Aesop.

— Não tem idade para isso.

— Regras, professor? Qual é a graça se não forem quebradas? — Morgana sorriu ao vê-lo irredutível. — Vá lá, professor. É o nosso segredo.

Não era o primeiro e não seria o último, Aesop sabia. Ainda assim, não cedeu. Morgana teve de buscar o que queria por conta própria. Ergueu o pulso dele e girou-o o suficiente para que enchesse metade da taça.

— É a sua vez.

Aesop usou a sua varinha para tirar uma taça para si de um dos seus armários. Estranhou ele estar aberto, mas não deu teceu qualquer comentário. Com um olhar mais atento, reconheceu a taça na mão de Morgana como sendo uma das suas. Encheu-a até metade também e sentou a garrafa na mesa.

Masquerade (Morgana Malfoy x Aesop Sharp)Onde histórias criam vida. Descubra agora