Capítulo 39 - Jae

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Sou um desperdício.

Penso no quanto meus pais se esforçaram para me dar tudo, quando na verdade, sei que lá no fundo, eu nunca quis nada. Eu nunca mereci todo esse esforço que eles fazem por mim.

Quando penso nesses dezessete anos da minha vida, grande parte estive envolvido em confusões que eles tiveram que resolver. Não sei quantas vezes minha mãe sentou comigo na cozinha e encarou meus machucados no rosto, sem ter mais nada pra dizer.

Lutar contra o sistema nunca foi uma opção, então aceitar de onde eu vinha e onde pensavam que eu estava, era mais fácil do que tentar desfazer esses preconceitos. Os garotos da minha vizinhança brigavam comigo por estudar com os riquinhos e os riquinhos me olhavam como se eu fosse a escória da escola. Então eu usava a violência em ambos os lugares, porque cansei de levar desaforo calado. E só parei quando eles pararam.

Só parei quando Daesun virou meu amigo na escola e me disse que eu podia sim ser mais do que esperavam. Ele era mais do que todo mundo esperava. E eu o admirava mais do que qualquer um.

Ele era meu melhor amigo, e eu não entendia porque ele perdia tempo comigo quando tinha tantas outras opções. Sei que todos também pensavam isso.

Daesun me aceitou como eu sou e esteve sempre comigo. Ele era o único. Mas eu o traí quando comecei a gostar de seu irmão. Eu queria poder explicar porque fiz isso de outra forma, porque eu era como um garoto numa caverna escura por todos aqueles anos e Doyoung era o pequeno flash de luz escapando entre duas rochas. Eu estava fascinado e curioso. E quando toquei seu calor, tão diferente do lugar frio onde eu estava, não quis me afastar.

Ele era minha luz.

Porém, como tudo o que eu toco, estraguei isso também. Eu deveria ter sido honesto sobre o que eu sentia, mas escolhi esconder e perturbá-lo, porque achei que esse fosse o único jeito de fazê-lo olhar para mim. Porque achei que se ele não me amasse, pelo menos eu poderia ocupar cada espaço na sua mente. Eu o assombrei como ele me assombrava nos últimos anos.

Nunca pensei que ele fosse gostar de mim.

Então estraguei tudo de novo quando insisti que Daesun desse aquela festa. Lembro-me de chegar em casa, jogar a chave sobre a mesa de centro e sentar no sofá atordoado. Lembro da escuridão ao meu redor e da luz do corredor sendo acesa pela minha mãe. Acho que ela ficou perturbada com o fato de eu estar chorando, porque eu nunca chorava na frente dela. Lembro da sensação dos seus braços ao meu redor e de como o calor dela não parecia o suficiente para afastar aquela escuridão fria de dentro de mim.

Pensei que Daesun me culparia pela morte de seu irmão caçula, mas ele nunca o fez. Ele continuou me tratando como sempre. Então nunca tive coragem de tocar no assunto. E quando Doyoung olhava para mim, as chamas nos seus olhos me queimavam do jeito que eu queria. Do jeito que eu pensei que merecia. Ele me odiava tanto que me fazia ter certeza de que ele sempre estava pensando em mim.

Eu não queria desejá-lo tanto quando tudo isso tinha acontecido.

Limpo o rosto com as costas da mão, encarando as flores brancas pequeninas na clareira.

Sua mãe está certa. Eu arrastei Daesun comigo ano passado, então quem garante que eu não estou fazendo o mesmo com Doyoung?

Aperto a terra embaixo de mim com os dedos e deito a cabeça sobre os joelhos. O vento empurra meu cabelo, mas alguns fios estão grudados na minha bochecha molhada.

— Jaehyun!

Levanto a cabeça e o procuro, mas não o vejo até que ele chegue na metade do caminho. Doyoung corre na minha direção enquanto eu limpo a terra das mãos, e quase me derruba quando atira seu corpo sobre o meu, me abraçando.

Blame » dojaeOnde histórias criam vida. Descubra agora