XXV. O SENHOR DOS CORVOS

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O GPS apontava mais de vinte minutos até o meu destino. Conforme prosseguia pela estrada, notava que mais árvores surgiam. Até que no horizonte vislumbrei uma colina. Era a mesma colina que enxerguei no primeiro sonho lúcido que eu tive quando cheguei a Sundale.

Detalhes que não fariam diferença naquele momento, apesar da impressão de eu já devia ter visto aquela colina antes e o meu subconsciente fazendo uso dos sonhos lúcidos idiotas* que eu tinha parecerem reais. Eu não acredito em visões ou coisas sobrenaturais, sou agnóstica. Mas negar que causava arrepios saber que a tal colina me era familiar, ah, isso eu não poderia negar mesmo!

Finalmente eu cheguei ao endereço enquanto checava a tela do celular. Eu sentia que perdi o ar ao vislumbrar a entrada da casa, como se meu estômago murmurasse e se retorcesse dentro do abdome.

Há tempo de desistir, Mahana.

Era uma casa enorme, gigante, fazendo qualquer ser humano comum sentir-se uma verdadeira formiga diante de sua imponência. E eu estranhava, pois logo atrás da mansão, havia a tal colina coberta por mata, como no mesmo sonho lúcido que eu tive assim que chegara a Sundale.

Certo, talvez algumas sessões de terapia me ajudem a entender o que o meu subconsciente quer dizer com aqueles sucessivos dejavus.

Eu travei em frente ao portão, pensando sobre o que eu estava pensando quando tomei a decisão de confrontar Asaloom Youssef. Ele era o homem mais poderoso da cidade. Talvez não fosse o mais amado, mas ainda assim, o mais influente.

Porém, eu estava prestes a perder o meu emprego se não fizesse nada. Não seria algo justo. Se Asaloom fosse um adulto maduro e razoável, certamente poderíamos manter uma conversa amistosa. Ou ele não me receberia, o que eu achava muito mais provável de acontecer.

Fui passando pelo jardim repleto de folhas caídas e amareladas, o meu objetivo era chegar até a porta sem desmaiar. Milhões de possibilidades passavam pela minha cabeça, sobre o que aconteceria. E nenhum dos desfechos pareciam favoráveis a mim. Era como uma situação em que enchemos o peito de coragem, todavia, no meio do caminho vamos reconsiderando até finalmente sentir as pernas bambearem e querer recuar.

Você já pensou com essa sua cabecinha de vento que pode ter cães aqui? Asaloom tem cara de quem teria cães? Sim, e dos que devem decepar* uma perna em uma única mordida, Mahana!

Eu estava parada no meio do jardim da mansão de Asaloom Youssef, reconsiderando e tremendo.

Há tempo de recuar. É só correr daí. Vai, corre. Você é uma bundona* e frouxa. Nada de novo.

Estava tão imersa nessas conversas mentais comigo mesma, que não tive tempo de me desviar de um pássaro preto que sobrevoou a minha cabeça e fez um rasante, o que me deixou apavorada. Me joguei no chão e comecei a gritar, cobrindo a cabeça. Temia ser uma águia ou um abutre.

As luzes da varanda se acenderam e logo uma silhueta alta e forte surgiu. Eu abri os olhos e Asaloom Youssef estava parado a alguns centímetros de mim.

— Que bela visita. — Disse de maneira seca.

Poderia ser desdém, mas não acho que desdém seja algo que combinasse com gente do tipo dele. Parecia polido até demais.

Então reparei que o pássaro preto pousou sobre o ombro de Asaloom. Era um corvo. Um maldito* fuck*ing corvo.

— Desculpe, eu me assustei com esse pássaro.

Eu não sabia o que dizer além de um pedido de desculpas. Eu olhava para o corvo no ombro de Asaloom e começava a achar a situação ainda mais inusitada. Se Sundale não gostava de Asaloom, certamente também o culpariam pela praga de corvos que rodeava a cidade.

AsaloomOnde histórias criam vida. Descubra agora