Asaloom ergueu-se e caminhou até a janela. Parecia procurar por algo do lado de fora. Então um corvo pousou no batente e ficou bicando o vidro, como se quisesse entrar.
— Você sabe que não pode. — Disse Asaloom ao pássaro que parou de insistir — Corvos... — Suspirou — ... alguns pensam que são cães ou gatos! E veja: são capazes de entender que não podem entrar. Que não podem ficar em um determinado lugar. Deveria aprender com eles.
— Vai me comparar a uma praga*?
— Eu não disse isso. Nem você e nem os corvos são pragas*.
— Certo, agora me dê motivos para deixar Sundale.
Eu o encarava, esperando uma resposta. Por que ele me queria longe da cidade? Andamos em círculos até ali. Às vezes sentia que estava lidando com o mestre dos magos da Caverna do Dragão.
— Se eu disser os meus motivos, teria de matá-la. Não estou com ânimo para algo assim.
Deveria haver uma risada ou outra coisa que insinuasse que aquilo era uma piada. Porém, não houve nada. A frase ficou ali, suspensa no ar. Asaloom não parecia brincar ou fazer graça.
Assim que ele ergueu o braço para levar a bebida aos lábios, a manga da camisa social subiu pelo antebraço e o punho direito ficou à mostra. Havia uma tatuagem bonita ali, era um olho que tudo vê.
Maçons, pensei.
Em seguida me lembrava do policial Harry dizendo para me manter afastada deles. E como sou boa em seguir conselhos, ali estava eu: na sala de um maçon. Que dizia ser necessário me matar* caso me contasse os seus motivos para eu deixar Sundale.
Mahana, querida, você é ótima. Só que não.
— Você pareceu irritado com o fato de eu ter conversado com o policial Harry quando cheguei à cidade.
— Não, não me irritei. Polcial Harry é um idiota*. Ele acredita que maçons e satanistas dão no mesmo. Você também tem medo de maçons?
— Não, isso nunca me preocupou.
O que me preocupava era a fala dele suspensa no ar. Sobre me matar*.
Uma luz pareceu surgir nos olhos de Asaloom, como se eu tivesse dito algo certo pela primeira vez.
— Acredito que falaram muito disso quando chegou. Sobre termos pacto com o diabo* ou coisas do tipo.
Eu nem havia me dado conta de que o corvo não estava mais na janela nos espreitando.
— Sobre você ou sobre ser maçom? — Perguntei.
— Os dois.
— Algumas pessoas — Parei para refletir — Várias pessoas, na verdade.
O assunto ia se desviando. E apesar de querer respostas, Asaloom conseguia soar agradável e me envolver na conversa.
— Patético. Se ao menos conseguissem pensar fora da caixa, talvez chegassem à conclusão certa. — dizia praticamente a si mesmo olhando pela janela para o lado de fora — Mas quanto a você, Mahana, seja diferente dos moradores de Sundale. Pense fora da caixa e saia da cidade.
— Vai me ameaçar novamente?
— As interpretações são subjetivas. Mas se entender dessa forma a fará aceitar o meu conselho, sim, talvez seja uma ameaça. E cá entre nós, essa conversa está ficando chata e repetitiva.
— Bem, eu não vou sair até ouvir uma justificativa plausível. Do contrário, serei obrigada a abrir queixa contra você.
— Hum, vai a polícia?
— Sim, algo como assédio* moral, coação. Estão bons para você?
Ele se mantinha reflexivo.
— Eu coagindo uma professora de biologia. A cidade toda acreditaria em você. Hum — Ele projetou o lábio inferior para frente ao concluir — Inteligente. Inteligente sim.
— Não quero prejudicá-lo. Mas também não posso permitir que decida onde devo ou não ficar. Você não é dono de Sundale.
— Tem razão. Já terminou?
Asaloom caminhou vagarosamente até mim, passos lentos e calmos. De perto ele parecia muito maior, como uma muralha tapando a minha visão. Se ele dissesse mais alguma coisa, acho que eu teria saído correndo.
— Já terminei sim. Mais nada a dizer.
Os Olhos dele eram famintos.
— Certo. Então creio que deva voltar para casa. Está tarde para moças como você andarem por aí sozinhas. Eu não quero ter que salvá-la novamente.
Asaloom me lembrava do incidente em que Carlo tentou me agarrar na saída do Pub.
— Caso insista nessas ideias, Asaloom, eu vou à polícia. Fique bem claro.
— Sim, você disse.
— Ok, boa noite.
— Boa noite, Mahana. E cuidado. Mantenha a porta trancada...
Ele tragou o último gole do uísque esvaziando o seu copo.
Depois que disse isso eu posso jurar que Asaloom falou baixinho: ... como se deixar a porta trancada fosse me impedir de entrar.
— Disse mais alguma coisa?
Asaloom sorriu, agora com um semblante enigmático.
— Não — respondeu mentindo descaradamente.
Peguei a minha bolsa e saí dali com mais dúvidas do que quando cheguei.
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Asaloom
RomanceMahana, após uma dura separação de seu marido, é selecionadas para ser professora de Biologia já em um colégio na misteriosa cidade de Sundale, ao Sul do país. Logo que chega a cidade, ela escuta falar do poderoso Ásaloom Youssef, um descendente de...
