Em busca de Hecate

Um episódio horroroso

— Quando vocês se tornaram amigos?

— O pai dela trabalhava para o meu tio e várias vezes ela aí com o pai para o trabalho. A gente ficava em uma sala com alguns brinquedos meus por horas.

— Vocês são melhores amigos desde então?

— Somos. Estudamos na mesma escola até eu mudar para a Hexside para fazer o ensino médio. Nós andávamos juntos todos os dias. Eu morava no seu bairro, sabia? Até toda aquela confusão com meu tio acontecer e ele ser preso.

Balancei a cabeça.

— Pois é, andávamos juntos todos os dias, ficava junto nos campos, montávamos bases secretas, andávamos de bicicleta ou jogávamos videogames. Só... coisas de melhores amigos. Éramos melhores amigos.

Ele não disse mais nada depois disso, mas tomou um gole de latte.

— E... então... — Eu não sabia bem como abordaria o assunto. — O que... aconteceu ? Se não se importa de me dizer...

Hunter ficou em silêncio por um momento.

Ele balançou a cabeça e tomou mais um pouco de latte.

— Mas mais ou menos há um ano, desde que Edric e Emira se foram... ela mudou. Eu também mudei. A gente passa menos tempo juntos... e sinto que, quando estamos juntos, ela está comigo apenas para escapar de seus problemas, não porque quer me ver mesmo. Você sabe como são as coisas com a mãe dela, não sabe?

— Sei.

— Bom... antes de vocês duas se aproximarem, ela costumava ir muito à minha casa para não ter que ficar perto dela. E aí você chegou e... acho que ela parou de precisar de mim...

— Isso é... vocês são amigos desde sempre. Andam juntos há anos.

— Se ela se importasse, falaria mais comigo. — Hunter respirou fundo, como se aquela fosse a primeira vez em que estivesse admitindo aquilo para si mesmo. — Acho que ela nem gosta muito de mim. Só acho que ela faz o que faz porque está acostumada, porque se sente à vontade comigo e... porque sente pena de mim.

Ele fez uma pausa e eu notei que seus olhos estavam marejados. Balançou a cabeça de novo e secou um dos olhos.

— Normalmente sou eu quem fica atrás dela.

— Então por que... — Minha voz foi quase um sussurro, apesar de sermos as únicas pessoas na rua. — Por que você não... acaba com isso? Se nenhum de vocês está à vontade com essa amizade, por que não terminar?

— Eu não disse que eu não estou à vontade. Eu gosto demais dela. — Uma lágrima escorreu pelo rosto de Hunter, e ele abafou uma risada. — Desculpe. Ficou parecendo que eu estou apaixonado por ela. Isso foi idiota.

— Não é idiota. — Levantei os braços e o puxei para um abraço. Ficamos abraçados por um momento. — Você ama muito ela, não ama?

Hunter balança a cabeça.

— Eu sempre achei que ela fosse a única pessoa que me entendesse e dês de que tudo começou a mudar, com os gêmeos, com você e a internet... ela está tão distante, que achei que eu voltaria a ficar sozinho. E eu já entendi, tá legal. — ele se afasta de mim com uma espécie de raiva mas que não parecia real — Eu já entendi que a relação de vocês é importante para ela. Já entendi que você é importante para ela. Mas, porra, ela precisava ter me deixado tão de lado assim?

— É. Acho que foi meio egoísta da parte dela.

— Tentei conversar com ela sobre isso no aniversário dela — ele continuou. — Mas ela não estava a fim. Ficou tentando me garantir que gosta de ser minha amiga. E isso me deixou bravo, porque percebi que ela estava mentindo. Eu sei. Sei quando ela mente para mim! Por que ela me evitaria tanto se ela gostasse de me ter por perto, porra?