Mais burra do que pensei.

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Os dois entrevistadores eram homens brancos velhos. Tenho certeza de que nem todos os entrevistadores da Universidade Wild são brancos velhos, e uma mulher fez minha segunda entrevista do dia, mas, na primeira, os entrevistadores eram brancos velhos, e não fiquei surpresa.

Eles não estenderam a mão para me cumprimentar, então também não estendi a mão para eles.

Minha entrevista foi meio assim:

HOMEM BRANCO VELHO (H.B.V.) NÚMERO 1: Bem, Luz, vejo que você escolheu se especializar em arte, juntamente com inglês, história e geografia. Fez também matemática no colégio. Por que um grupo tão diverso de matérias?

LUZ: Ah... sabe, sempre me interessei por muitas matérias. Só imaginei que, na especialização, sabe, seria bom, meio que... continuar assim, sabe, usando os dois lados do cérebro, tendo uma experiência de aprendizado mais ampla... mais abrangente. Gosto de muitas matérias diferentes, então, é isso.

H.B.V. número 1: [pisca e assente]

H.B.V. número 2: Você diz em sua apresentação que o livro que inspirou seu interesse em estudar literatura inglesa foi [olha o papel] O apanhador no campo de centeio, de J. D. Salinger?

LUZ: Isso!

H.B.V. número 2: O que, exatamente, te inspirou no livro?

LUZ: [totalmente despreparada para uma pergunta como essa] Ah... sim. Bom, acho que foram os temas, de verdade, eu realmente me identifiquei com os temas de, sabe, desilusão e alienação. [ri] Sabe como é, coisa normal de adolescente! Bom, sim, havia muitas coisas no livro que me deixaram interessada, como, em um ponto de vista acadêmico, como, hum... Uma das coisas de que gostei foi que Salinger meio que pegou o jeito de falar dos adolescentes dos anos 1940 e 1950. Foi a primeira vez que li um livro antigo — bem, tipo, um livro clássico, pelo menos... que, bem, pareceu uma voz real. Eu me senti muito ligada ao personagem principal, acho... e isso me fez querer entender por quê.

H.B.V. número 2: [assente e sorri, mas parece não ter ouvido nada do que eu disse]

H.B.V. número 1: Bem, Luz, acho que a maior pergunta é: Por que você quer estudar literatura inglesa?

LUZ: [pausa aterrorizada] Bem... [outra pausa aterrorizada — por que eu não conseguia pensar em nada para dizer?] Bem, eu... eu sempre adorei literatura inglesa. [Uma terceira pausa aterrorizada. Vamos. Há mais motivos do que isso. Tudo bem. Vá com calma.] Literatura sempre foi minha matéria preferida. [Não é verdade, né?] Desde pequena quero fazer esse curso universitário. [Que mentira enorme. Você vai precisar falar menos como um robô se quiser que eles acreditem em você.] Eu amo analisar textos e aprender sobre eles... sobre seus contextos. [Não estou entendendo, por que você está agindo assim? Por que está mentindo?] Acho que estudar literatura inglesa me motivaria a ler muito mais do que leio. [Espera aí, então você está dizendo que não lê muito? Por que então está se candidatando para estudar literatura inglesa, pra começo de conversa?] Eu acho... [Por que está se candidatando para estudar literatura inglesa na faculdade?] Acho que sempre... [Sempre o quê? Sempre mentiu para si mesma a esse respeito? Sempre pensou que adorava algo que não adorava?]

H.B.V. número 2: Certo, bem, vamos continuar.

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Logo depois disso, tive que fazer uma prova na qual precisava comparar dois trechos de prosa. Não consigo me lembrar sobre o que eram, nem consigo me lembrar do que escrevi. Eu estava em uma sala com cerca de mais vinte pessoas e tínhamos que nos sentar ao redor da mesma mesa ampla. Eu estava bem inquieta e, no fim, todo mundo parecia ter escrito muito mais do que eu.

Depois veio a segunda entrevista, que basicamente foi como a primeira.

Quando voltei para a Starbucks, Willow estava jogando Candy Crush. Ela olhou para mim quando me sentei e desligou o celular.

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