Vendetta di Lucrézia (Vingança de Lucrézia) - 01 [Danatto Sangue]

54- DESTINO SEGNATO (Destino selado)

A adrenalina permaneceu frenética, percorrendo minhas veias desde o dia em que briguei feio com Pierro, parecia estar mais viva, mais capaz, como se não houvesse barreiras para impedir o meu avanço. Sentir o mundo aos meus pés era algo maravilhoso e nem mesmo as ameaças de Giovanni iriam me fazer recuar justo agora, o momento no qual provei o real sabor da vitória e da conquista.

Uma semana havia se passado, Pierro não falava comigo nem três palavras por dia, bebeu do nascer do sol até dormir todas as noites, ele se afundava na própria amargura dia após dia. Matteo, enfim, contou sobre Giovanni já que não sai do seu encalço, o desfile na semana de moda de Milão estava próximo e caiu bem na data do falecimento de Lucca, ou seja, meu marido não bebia só por minha causa, o aniversário de morte do irmão lhe roubava as forças e dignidade.

E Giovanni fazia as vezes de personagem fundamental nessa dolorosa lembrança, pois o seu relacionamento com Lucca (segundo Matteo) ultrapassava as barreiras da morte. Ele não deixou a carreira militar no exército afegão a toa para virar estilista chefe da Confecção Martinelli, meu primo contou que os dois se apaixonaram ainda jovens, Giovanni viu e ajudou a criar Piero e Luigi e prometeu, no leito de morte do primogênito dos Martinelli, cuidar da família. Isso o tornou automaticamente minha maior ameaça dentro dessa maldita família, Giovanni não era fácil de manipular como Piero, muito menos fraco, um oponente a altura que preferi manter por perto a fim de evitar quaisquer danos posteriores.

— Viu Piero? — Giovanni perguntou ao adentrar a coxia com caderno velho em mãos.

— Já procurou no bar? — Apesar de tentar reproduzir apenas escárnio, uma pontada residual de incômodo atingiu meu peito.

— Foi o primeiro lugar em que procurei. — Seus ombros sempre eretos caíram, desapontado.

— Então não sei onde ele poderia estar. — Virei o rosto para ele na tentativa de decifrar o conteúdo da capa do caderno. — Mas, se o vir, diga que vou arrancar os olhos dele e dar para os pombos comerem caso não esteja ao meu lado na hora da apresentação da parceria.

— Vou encontrá-lo. — Reafirmou com os olhos

Conforme as modelos zanzavam atrás da passarela, os maquiadores, cabeleireiros, designers e auxiliares de desfile se redobraram para dar conta de finalizar os últimos detalhes pré-desfile, minha atenção passeou de modelo a modelo, joia por joia pendurada em seus pescoços até se perder na multidão a espera do início do show. Vi os rostos conhecidos das famílias do Conselho, não que fosse de se estranhar pois este era o mundo de fachada a qual todos nós compartilhavámos. Os Caccini fabricavam e vendiam joias, os Martinelli roupas de grife, os Barones sapatos de alto nível, os Giordano possuíam inúmeras casas de festas e boates das mais variadas estirpes e os De Lucca produziam cosméticos com especiarias do oriente médio, sua terra natal. Isto é, sob o magnífico universo da moda de Milão havia quadrilhas de crime organizado se aproveitando das camadas obscuras do tapete da fama.

Assim que desviei o olhar pro outro lado, enxerguei Piero aos cacos seguido por Giovanni o bendito caderno e corri para me aproximar a tempo de captar o fim da conversa acalorada em que os dois estavam.

No entanto, antes de chegar, Piero agarrou a caderneta e guardou no bolso interno do paletó, os olhos azuis ainda fixos no chão, meio perdido. Não sei se pela bebida ou pelo teor das palavras daqueles papeis.

— Atrapalho, senhores? — Me pus diante de Piero e ajeitei a gola do terno revirada.

Giovanni manteve-se neutro, enquanto meu marido afastou meu toque quase de supetão.

— Pode me ligar a qualquer hora, Piero. — O ex-militar alertou, saiu na sequência, sem esperar a resposta de Piero que nunca assentiu.

— Você está um trapo. Posso sentir o cheiro de whisky de longe. — Seu pomo de adão moveu-se lentamente. — Como vai aparecer na frente das câmeras nesse estado?