AGNES
Eu estava ali, sentada na poltrona estreita do avião, sentindo o leve tremor da decolagem que vibrava sob mim, como se cada fibra do meu corpo estivesse se preparando para o que estava por vir.
Olhei pela janela, observando a paisagem mineira se afastando gradualmente, os contornos familiares das montanhas e vales diminuindo, até se transformarem em meras sombras no horizonte. Minas Gerais era o meu refúgio, o lugar onde eu me sentia segura, rodeada pelo conhecido e pelo previsível. Mas agora, o Rio de Janeiro me aguardava, e com ele, um trabalho que eu preferia nunca ter aceitado.
Presença VIP no Baile das Piranhas. Mesmo o nome soava errado, como um prenúncio de algo que eu não queria encarar.
Enquanto o avião subia, o peso da minha decisão se intensificava, tornando-se quase sufocante. Eu sabia que esse não era o trabalho dos meus sonhos. Longe disso. A ideia de me expor em um ambiente tão perigoso como um baile funk em uma favela me repelia, mas pagar o aluguel esse mês era uma prioridade esmagadora. Era isso ou aceitar divulgar joguinhos baratos que prometiam mundos e fundos aos meus seguidores, enganando as pessoas que confiavam em mim. Era uma linha que eu não estava disposta a cruzar.
Quando o avião finalmente pousou, o baque das rodas no solo me trouxe de volta à realidade com uma sacudida. Despertei da minha espiral de pensamentos como se tivesse acordado de um sonho ruim. As luzes do aeroporto do Rio de Janeiro piscavam lá fora, e eu me preparei para enfrentar o que viria a seguir.
Na saída do aeroporto, um homem me esperava com uma placa onde meu nome estava escrito com letras grandes e mal traçadas.
— Agnes? — ele perguntou, sem muito esforço para soar amigável, os olhos quase sem vida.
Assenti, tentando forçar um sorriso, mesmo sentindo o desconforto crescente. Ele não parecia interessado, apenas um funcionário cumprindo uma obrigação. Mas havia algo estranho no olhar dele, uma frieza que contrastava com a simpatia profissional a que eu estava acostumada nos eventos de presença VIP. Aquela indiferença me deixou inquieta, como se algo estivesse fora do lugar.
— Prazer... — comecei a falar, tentando quebrar o gelo, mas ele apenas balançou a cabeça, cortando minha tentativa de interação.
— O carro tá logo ali fora… Bora logo! — disse com impaciência, fazendo um gesto brusco na direção do estacionamento.
Seu tom seco, quase rude, me pegou desprevenida. Eu estava acostumada a ser tratada com um mínimo de cortesia nesses eventos, mas a indiferença dele era quase hostil.
— Claro, moço! — respondi, tentando manter o tom leve, embora o desconforto estivesse crescendo.
Ele não respondeu. Apenas girou nos calcanhares e começou a andar rápido, me obrigando a segui-lo enquanto arrastava minha bagagem, que parecia mais pesada a cada passo. O silêncio que se instalou entre nós era sufocante, e cada vez que ele olhava para trás para ver se eu o acompanhava, meu estômago se apertava um pouco mais.Seus passos eram largos, impacientes, e eu lutava para acompanhá-lo sem perder o ritmo.
Quando finalmente chegamos ao carro, ele abriu a porta de trás para mim sem dizer nada. Entrei e ele jogou minha mala no porta-malas sem qualquer cuidado, fazendo um barulho seco que me fez estremecer. O nó no meu estômago ficou mais apertado quando subi no carro. O interior cheirava a cigarro e couro velho.
Ele ligou o carro sem sequer olhar para mim, e o motor roncou alto antes de se mover pelas ruas movimentadas. Enquanto ele dirigia em silêncio, meu olhar se perdeu na janela. As paisagens do Rio de Janeiro passavam como um borrão, mas tudo o que eu conseguia sentir era o crescente desconforto dentro de mim, como se a cada quilômetro percorrido, a sensação de perigo se intensificasse.