AGNES
As ruas estavam agitadas como sempre, o som dos carros e o burburinho constante da cidade me envolviam como um manto sufocante. Fábio dirigia em silêncio, enquanto Renata tentava me tranquilizar, segurando minha mão no banco de trás. Mas nada parecia suficiente para acalmar o turbilhão de emoções que estava tomando conta de mim.
Quando finalmente paramos em frente à delegacia, um prédio comum no meio de tantos outros, senti um peso extra nos ombros. As paredes cinzentas do lugar pareciam uma metáfora perfeita para o vazio que eu estava sentindo por dentro. Era estranho, porque, em outro contexto, isso poderia ser apenas uma burocracia comum. No entanto, para mim, era um pesadelo que se tornava cada vez mais real.
— Vamos, Agnes. Você consegue — disse Renata, com um sorriso suave nos lábios, mas eu sabia que ela também estava nervosa.
O toque de sua mão na minha era reconfortante, mas não suficiente para aplacar o medo que me consumia.
Descemos do carro, e o calor de Belo Horizonte me atingiu como uma onda sufocante. O sol estava começando a se pôr, mas ainda fazia calor. Entrei na delegacia, com Fábio e Renata ao meu lado, como se fossem meus guardiões, me protegendo de algo que eles não entendiam completamente. A recepção era fria, impessoal, e o ar-condicionado zumbia de forma irritante no fundo.
— Boa tarde, em que posso ajudar? — perguntou o atendente, sem tirar os olhos da tela do computador.
— Eu... preciso fazer um boletim de ocorrência — respondi, tentando manter a voz firme, mas sentindo que ela fraquejava.
Ele finalmente olhou para mim, avaliando a situação com o olhar treinado de quem já viu muitas coisas na vida. Talvez ele estivesse acostumado a ver vítimas como eu. O que ele não sabia era que, dentro de mim, a palavra "vítima" tinha um peso maior do que ele poderia imaginar.
— Certo, você vai precisar de um RG e CPF. Qual o motivo da denúncia?
Senti um aperto no peito ao ouvir a pergunta. Falar aquilo em voz alta tornaria tudo ainda mais real. Respirei fundo e soltei as palavras.
— Eu estou sendo perseguida... Recebendo mensagens e ligações estranhas. E... — parei, engolindo seco, tentando não parecer uma louca paranoica —, encontrei câmeras no meu apartamento.
Os olhos do atendente brilharam um pouco com a última frase. Ele olhou para Fábio e Renata por um instante, como se tentasse entender o que mais estava acontecendo.
— Certo. Vamos registrar tudo. Por favor, preencha esses formulários enquanto aguarda para ser atendida pelo delegado de plantão.
Peguei os papéis e fui até uma das cadeiras da recepção. O ambiente era sombrio, com paredes desbotadas e uma iluminação fria, impessoal. O cheiro de café velho misturado ao ar-condicionado fazia o estômago revirar. Sentei-me ao lado de Renata, que continuava a apertar minha mão de leve, como um lembrete de que eu não estava sozinha.
— Vai dar tudo certo, Agnes — ela disse, com a voz calma, embora eu pudesse sentir a tensão que também pairava sobre ela.
Enquanto preenchia os formulários, uma parte de mim continuava a lutar contra a realidade da situação. As letras tremiam enquanto eu escrevia meus dados, mas não era só minha mão que tremia. Minha mente estava à beira de um colapso. Eu tentava me concentrar nas perguntas simples — nome, endereço, telefone —, mas, ao mesmo tempo, a imagem de Álvaro invadia minha mente como uma sombra, lembrando-me que, se ele descobrisse o que eu estava fazendo, as consequências seriam inimagináveis.
Depois de preencher tudo, entreguei os formulários ao atendente e esperei mais um pouco. Parecia que o tempo tinha desacelerado. Cada minuto era um peso a mais nas minhas costas. E então, finalmente, chamaram meu nome.
— Agnes Ferreira?
Levantei-me, sentindo as pernas pesadas, e segui o atendente até a sala do delegado. Renata e Fábio me acompanhavam em silêncio. Quando entrei na sala, vi o delegado sentado atrás de uma mesa simples, com pilhas de papel ao seu redor. Ele me olhou com atenção, os olhos cansados, mas observadores.
— Sente-se, por favor — disse ele, apontando para uma cadeira à minha frente. — O que está acontecendo?
Respirei fundo e comecei a contar tudo, desde as mensagens até as câmeras no apartamento. A cada detalhe, sentia meu coração acelerar, e as palavras saíam como se estivessem sendo puxadas de dentro de mim com força. Quando terminei, o delegado estava em silêncio, fazendo algumas anotações.
— Entendi. Vamos investigar isso, senhorita Agnes. Você tem algum suspeito?
A pergunta me atingiu como uma martelada. Suspeito? Eu sabia exatamente quem era, mas não podia falar o nome de Álvaro. Isso seria minha sentença de morte.
— Não... não tenho certeza de quem poderia ser — menti, sentindo o peso da culpa se acumular no fundo do estômago.
O delegado assentiu, anotando algo em sua ficha, antes de me entregar uma cópia do boletim de ocorrência.
— Tudo bem. Faremos o possível para encontrar quem está por trás disso. Se algo mais acontecer, não hesite em nos contatar.
Saí da sala com a cabeça rodando, sentindo um misto de alívio e desespero. Eu tinha feito o que Renata e Fábio queriam, mas sabia que isso não resolveria o problema. Álvaro era mais do que um simples stalker. Ele era alguém com poder, e o poder de quem ele era e o que poderia fazer comigo pairava sobre mim como uma nuvem negra.
— Você foi ótima, Agnes — disse Renata, enquanto caminhávamos de volta para o carro. — Vai ficar tudo bem.
Eu queria acreditar nela, mas, no fundo, sabia que o problema estava longe de ser resolvido.
Quando entramos no carro, Renata sugeriu o que eu já esperava.
— Por que você não dorme no nosso apartamento hoje? Vai se sentir mais segura.
Olhei para Fábio, que estava ao volante, e ele assentiu, apoiando a ideia.
— É, melhor você não ficar sozinha hoje. A gente tem um quarto extra, e será bom você descansar um pouco.
Eu hesitei por um momento, mas a verdade é que a ideia de ficar sozinha no meu apartamento, sabendo que havia sido monitorada por câmeras, me aterrorizava.
— Tudo bem — concordei, sentindo o alívio temporário de estar cercada por pessoas que me apoiavam.
Enquanto voltávamos para o apartamento deles, um pensamento me dominava: como eu poderia escapar dessa teia em que estava presa? Porque, de uma coisa eu tinha certeza, Álvaro não iria me deixar tão fácil assim.